1993
“Confissões a meia luz” é a inversão, de sonhos que um dia explodirão em formas coloridas –
Vila Embratel, 10/04/93
Sexta-feira Santa
16:05 – uma tarde cinzenta, sentado ao lado de Van, vendo a entrevista de um ator das novelas das oito.
Sábado de Pascoa de 93
Um novo amanhã descortinava-se lá fora, num esplendoroso dia, onde os pássaros anunciam o encantamento, as folhas dos coqueiros farfalham e os galos emitem seus gorjeios em louvor a mais uma esperança que brota em todos os seres que coabitam nesse universo sem fim.
O reggae rega o inicio da tarde. Van saiu para umas cobranças, encontro-me sozinho e a garganta coça por uma dose de licor que uma amiga dela presenteou-nos há alguns dias. A chila guardada, o money restante entreguei a ela para as divinas providencias – Há duas semanas venho meio leve desenvolvendo um novo trabalho que dará muito o que falar. Ainda encontro-me na fase inicial, na apresentação dos fatos, num estilo onde busco o máximo da minha criação. Jeruz chegou em forma latente e tento reproduzir um homicídio passional onde o que deveria assassinar acabou morrendo vítima de sua própria ignorância, tendo como pivô a bela e resplandecente professora Angelica, dona de uma pequena venda. Nesse trabalho busco a renovação, penso até em afirmar que é bom.
A Sexta-Feira Santa passamos em casa, em comunhão conosco e renovando as forças para o embate. Visitei meus pais no Cohatrac pela manhã, mas na quinta cortei e raspei a barba e o cabelo para não contrariar o Velho Bamba que indignado estava devido a minha barba.
Sirvo-me de uma boa dose de licor de jenipapo, desligo o ventilador e o Walkman – um peso na cuca, o medo de não controlar a vontade insaciável da bebida e embebedar-me brutalmente contrariando sumariamente Dona Vani, sua companheira como num sábado deste quando sem necessidade encheu a cara de vodka na casa de uns colegas e acabou vacilando e aprontando besteira. A segunda dose e o pensamento fixo nas merdas que já aprontei com bebida, nunca levei sorte somente azar tem acompanhado-me, cheguei a dormir estirado docilmente numa imunda sarjeta da Rua da Palma, se não fosse Dodoca teria passado o dia todo dormindo debaixo do caminhão defronte ao “Churrasquinho” – Vieram duas clientes, uma para trocar um sapato por uma sapatilha, como não encontrou o numero condizente a troca para segunda feira. Fecho os olhos e revejo toda a beleza do Cariri, na subida do Caldas. A segunda Dona Eunam que queria comprar uns presentes para uma aniversariante, acabou levando dois: uma caixa de lenço e uma meia engraçada – A espera de Van, quatro doses foram servidas, o senhor da sala em frente conversa em voz alta com duas meninas, uma delas suponho ser sua namorada. Pela manhã passei por trás da Casa 503, o medico das balanças estava fechado, dois funcionários da Confrio queimavam uns fios na parede no fundo da Cibrazem, Na rua o cheiro de borracha queimada exalava em todos os sentidos. Os Bacutas viajaram para a fazenda, retornaram na segunda e encontraram a filha e o mante mortos nus na cama do casal. Os moveis quebrados, a cozinha dilapidada, as paredes com dizeres sem sentidos. Como Papai Bacuta reagiria a tamanha destruição? O interior de sua casa parecia ter sido arrasada por um tsunami. E mamãe? Você terá a resposta no próximo capitulo que escreverei.
- E a maconha? E dá boa? – perguntou o viciado nervoso diante do cidadão de óculos escuros e uma bermuda vermelha na porta de Cabo Xã. Este deu-lhe o pequeno e volumoso maço: - Traga mais uma – pediu-lhe encostado no taipá da banca do Cabo que tudo presenciava silenciosamente e talvez nervosamente. Um PM negro descangotava-se num orelhão vermelho.
- Tá sujo – disse-me passando rapidamente por minhas costas postando-se na frente a uma barraca de limões. O negro PM continuava no telefone. Cabo Xã nervoso enrolando e olhando insistentemente, o encabuloso com o volume debaixo do sovaco, até manhosamente deu um jeito de entregar-me o ‘dolar’, coloquei no bolso juntamente com o outro de Junior Boró e sem olhar para trás e nem agradecer pelos dois patuás, tratei de distanciar-me o máximo possível do cenário do crime. No ateliê no beco das Picas, Professan sentado na porta. Parazinho saia loucamente com os olhos vidrados.
A noite em casa assistindo o Jornal Nacional, ao lado de Van que confere uns trocados. O CB 450 coloca em ordem o som com.....
Nesse final de semana prolongado, não tive o mínimo senso de escrever, desfrutei a preguiça em todos os sentidos. Encerramos o expediente na quinta-feira ao meio dia. Passamos no mercado grande para pequenas e necessárias compras. Em casa, as louças lavadas e a alegria de estarmos juntos. Na sexta preparamos um delicioso almoço, a base de sardinha em lata, baião de dois e uma salada de agrião, tudo regado a vinho e amor.
Antes das cinco da tarde, aboletei-me numa cadeira no quintal para Van tosquiar-me a barba e o grande cabelo. Findando a sessão, apertei uns bons ‘basys’, relaxei diante o Diplomat e fomos nos amar.
Van deitada confortavelmente nua na rede estendida no meio da sala, eu sentado chiladamente-bem-com-a- vida, na cadeira de descanso com o controle na mão, enrolando um ‘basy’ e ora e outra acariciando seu púbis. A noite jantamos canjica de milho com nescau e leite e amor.
11:25 – na loja - Entornei um cálice de licor de jenipapo para suavizar as preocupações que corroem o meu dia-a-dia. O atelier nunca mais foi o mesmo, faz um bom tempo que não pegamos uma encomenda de grande envergadura, onde eu possa respirar com tranquilidade. A Mesbla jogou um pouco de esperança numa empreitada fabulosa que envolve milhões e milhões, o que deixou-me nas nuvens, mas como de praxe a sorte passou ao largo. O magico reformou-se umas três vezes, sempre adiando a entrega quase certa da quantia estipulada para o inicio da obra das grades para o colégio Wizards. – entorno três doses, uma atrás da outra e começo a sentir que o objetivo foi alcançado e uma vontade louca, força-me a uma quarta, antes que a minha amada Van apareça – sonho em tornar-me um empresário bem sucedido no espelho, o estomago esquenta. O ventilador ventila, alguém datilografa alguma coisa e peido enquanto observo um falsificado relógio Citizen manufaturado em alguma fabriqueta clandestina no sub continente asiático. O licor embaça a mente, deixando sonolento. Os alugueis da oficina atrasados.
15:30 – De volta a loja Dona Van atende pacientemente uma cliente da casa, uma senhora balzaquiana e sua dileta filha, escolhe...
Terça-feira, 13 de abril de 1993
Manhã entre onze e onze e meia na lojita de Van, lendo uma Veja e refletindo sobre a vantagem e a desvantagem de não conseguir a grana do aluguel da oficina ou adquiri uns apetrechos domésticos etc. O livro parado, tentarei recomeçar na sexta-feira quando a minha amada Van viajar. Ainda pouco maravilhei-me com a explicação de Pan sobre o funcionamento e a manutenção de uma caldeira. – Leio devagar Dom Casmurro e espero pacientemente as horas passarem para realizar o grande sonho. Anos atrás se não fosse Dodoca teria passado o dia todo dormindo debaixo do caminhão na rua da Palma defronte ao antigo “Churrasquinho”.
Vieram duas clientes, uma para trocar um sapato por uma sapatilha, como não encontrou o número condizente, mandei vim na segunda. Fecho os olhos e revejo toda a beleza do Cariri, na subida do Caldas em Barbalha. A segunda: Dona Eunice que queria comprar uns presentes para uma universitária e acabou levando dois: uma caixa de lenço e uma meia engraçada – a espera de Van, quatro doses foram servidas, o senhor da frente conversa em voz alta com duas meninas, uma delas suponho ser sua namorada -pela manhã passei por trás da casa 503, o medico das balanças estava fechado, dois funcionários da Confrio queimavam uns fios na parede do fundo da Cibrazem. Na rua o cheiro de borracha queimada exalava em todos os sentidos. Os Bacutes viajaram para a fazenda.
- E a maconha? É da boa? Perguntei a Cabo Xã, meio nervoso com a presença do PM negão que vem marcando na banca dele no mercado central. Deu-me ‘o dolar’ – Traga mais um.
O PM Negão de olhar duro disfarçava no orelhão.
- Tá sujo – disse-me passando rapidamente por minhas costas postando-se na frente da barraca de limão. O Pm Negão continuava no telefone. Cabo Xã nervoso enrolando e olhando insistentemente, até que manhosamente deu um jeito de entregar-me, o coloquei no bolso. Sem olhar para trás e nem agradecer tratei de distanciar-me o máximo possível do cenário do crime. No atelier, no Beco das Picas, Professan sentado na porta e o mestre Param saia tristemente.
A noite na tranquilidade do lar assisto o Jornal Nacional e ao lado da minha amada Van que confere uns trocados. O Clube CB-450 coloca em ordem o som....