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Diario de oficina & pensão - V

 
Segunda-feira, 03 de dezembro

O portão e os chumbadores pintados. A barriga querendo degringolar - um beijú que Janos deu-me e um enrolado de presunto com queijo que devorei simultaneamente com café. Uma dorzinha chata.
Aleluia! O primeiro dez reais - uma solda no gadanho de Seu Alcides, o proprietário da Madeireira Bastos, ruim de jogo.

Vim pelas tabelas da Aço Maranhão na Avenida dos Portugueses, onde fui comprar os ferros para a grelha, quase os cinquentas reais que peguei de adiantamento de Seu Biné le presidente do Mercado local quase não dava, sobrou apenas sete reais de troco. Uma dorzinha fina de cabeça e de barriga recrudesceu que fiquei com medo de peidar e sujar a bermuda. Agora vou para a pensão

Terça-feira, 4 de dezembro

Os pombos famintos bicavam raivosamente os sacos de lixos amontoados próximo a calçada da Praça das Sete palmeiras. A dorzinha de barriga depois do café, fora a enjoada da bursite no ombro direito que nem posso movimentar. Seu Obina deu vinte reais a uma mocinha branquinha e bem simpática acompanhada com seu filhote. Como diz o benemérito prof Eusabio "um courinho novo". Cortei e soldei os pedaços da forma de bloquete do mestre Janos, amanhã farei os acabamentos finais.
Antes que o temporal desabasse sobre toda a Vila Embratel chegaram Gordinho e depois o serralheiro Aguinaldo, este veio apanhar uns pedaços de ferros para fazer uns ferrolhos. Quando a chuva cessou, apareceu Seu Cesar Bude vindo da Lan-house do mercado, disse-me que se diverte muito lendo os textos no face e por último Claridio e suas fantásticas novidades a respeito de tudo. Gordinho bateu em retirada silenciosamente e o atleta Wood surgiu - então o papo foi somente futebol.
- Parceiro, teu carro tá cheio - Advertia seu Cesar Bude ao parceiro rapaz Tiago, quando era betoneiro numa construção e o menino ficava zapeando e atrapalhava os outros e os pedreiros ficavam zangados e reclamavam. - Parceiro, teu carro tá cheio - e repetia varias vezes, até os outros começarem a gritar, O resultado o rapaz Tiago acabou demitido a bem do serviço da peonada.

Pensão - um pouco frio - 25 graus. Achei esta caneta na gaveta da antiga máquina de Costura Singer que está sobre a cômoda. A princípio pensei que estivesse seca. Testei e para minha grata surpresa está boa. É uma robusta Göller, barra 6mm. - Contorço-me de inveja quando olhos aqueles pacotes de dinheiros que as pessoas estão devolvendo, do assalto ao Banco do Brasil em Bacabal. Eu não devolveria de jeito nenhum. Hoje não digitei nada, estava sem saco para tal- assisti dois filmes com o comediante Adam Sandler - o último foi "Tratamento de choque" com o grande mestre Jack Nicholson - sou fã dele, desde "Um Estranho no Ninho" nos anos 70. Esteve divino em naquele trailler de suspense de Stephen King "O Iluminado" - mas para mim o melhor foi no papel de Coringa em Batman - Divino sua interpretação. Leio "O Coiote" do psiquiatra paulista Roberto Freire, que Janos emprestou-me domingo após a feijoada - uma coisa de louco -baseado nas teorias psico-eróticas de Willian Reich, discípulo de Freud. Exilou-se nos Estados Unidos e foi preso e condenado por fraude nos seus pseudos tratamentos.
Bocejo, um atrás do outro e uns rojões explodem em algum lugar na outra margem do rio Bacanga.

Quarta-feira, cinco de dezembro

Quatro cães vadios deitados dormiam tranquilamente na calçada debaixo da puxada da galeteria do canto da rua 19. A esposa de Seu Raimundo, proprietário do deposito São João das bebidas onde devo a ínfima importância de dez reais há bastante tempo acompanhava duas senhoras idosas na caminhada em volta da Praça das Sete Palmeiras, a cumprimentei sutilmente. Três operários fardados esperavam o ônibus da firma. O clima de 25 graus como nos verões ártico e siberianos.
Wilheim Reich foi condenado a dois anos de prisão por fraude, seu laboratório destruído e seus livros queimados. Encarcerado na Penitenciaria de Lewisberg na Pensilvânia, morreu oito meses depois.

- Dez e dez - Disse o negão Velino, com sua voz típica de bom malandro olhando no celular. Estava contente, fizera as pazes com seu love, depois de uns dias separados - é uma ciumeira dos diabos.
A fôrma do bloquete pronta. Eu e Janos fomos apanhar os ferros da grelha do mercado na Aço Maranhão. Um ratinho de botica filha da puta roeu a fita isolante que reforçava o cabo do arco de serra.
- Olha ai o salgadinho ai! - Ofereceu um jovem moreno com a caixa pequena de plástico, parado no meio da porta.
- Não, obrigado - respondi-lhe. Duas horas atrás reforcei-me com dois pães e um enrolado de presunto com queijo.
Meu amigo Berg, ator e diretor teatral, acadêmico de Geografia prometeu pegar na biblioteca da UFMA a biografia do meu amado Dostoiévski. A boa velhinha franzina do Alto São Benedito veio buscar um trabalho há muito feito. Fiquei feliz, já estava sonhando o que iria fazer com esse bendito cinco reais e ainda me pediu um pedaço de ferro - colocou tudo dentro de uma sacola:
- Depois eu te dou uma coisa que tu gosta muito - E saiu tranquilamente e eu fiquei com a cara de tacho. Mas tudo bem. C'est ma vie!
Troco de pilhas, mas fica a mesma merda. Janos levou a fôrma.

Tarde na Pensão

Mamei apenas uma lata de Glacial com os dois reais que ferrei do peixeiro Lucas, depois que remedi a grelha e fui vítima de pilherias dele:
- Papudinho, todo dia tu mede essa merda ai?

Decidi digitar somente o diário de oficina, que escrevo pela manhã, aproveitando o tempo ocioso, e sempre ocioso, depois com o tempo o da pensão também.
"Coiote" levou dez anos para ser concluído - o personagem Flögel é o alter-ego do autor pirado. - para mim todo psiquiatra é um pouco louco, somente um pirado para entender outro pirado. O meu mal foi descobrir o maravilhoso mundo literário e através dele conhecer esses fabulosos homens que escrevem historias que nos enchem de conhecimento da alma humana. Y love Dostoiévski - para mim o melhor ao lado de Dickens, Balzac, Defoe, Cervantes e outros luminares da sagrada literatura.


 
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efemero25
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