Crónicas : 

Filhos

 
Um caso: Na cantina de uma empresa, um jovem fala com os colegas para conseguir arranjar filmes de animação, conhecidos comercialmente, que ele pudesse copiar. Sem avaliar eticamente a ideia, verifica-se que os filmes são para o seu filho, de cerca de 9 meses, ver na televisão, em casa ou no carro. Qual o objectivo? Ocorre imediatamente um: manter o miúdo quieto enquanto conduz, ou enquanto faz algumas tarefas em casa. Mas mais do que isso talvez. Afirma convicto que estimula o garoto, aliás, argumento sublinhado por uma rapariga, a caminho dos trinta anos e sem filhos. Apontam para o desenvolvimento de competências linguísticas, cognitivas e de atenção, sobretudo, e um genérico: - Faz-lhe bem! O que fará melhor a um petiz que não fala ainda; uma atitude passiva perante um caixote de cores e sons ritmados, cativante por isso mesmo, ou a interacção com pessoas de verdade, observando, ouvindo e sentindo, desenvolvendo competências cognitivas à custa do tempo e atenção dos seus interlocutores e companheiros de brincadeira. Actividades exigentes para os adultos, sobretudo quando esgotados depois de um dia de trabalho, das tarefas familiares e preocupações pessoais.
A reacção ao alerta de perigo por parte de outro trabalhador, foi desvalorizar o possível efeito negativo, já que todos vemos televisão. Sem pensar sequer nas diferenças abissais entre um adulto e uma criança de tão tenra idade. Nestas questões, são muitas as nuances, e ninguém deseja reconhecer publicamente estar errado, sobretudo quando dá tanto jeito “prender” a atenção do miúdo, compensando o mal presente pelo bem que vai fazer, desenvolvendo as ditas competências. A depreciação do aviso foi determinante, respondendo à insistência nos perigos: - És mesmo anjinho! Rematou rudemente a conversa, deixando muito por dizer, muitas perguntas por fazer, algumas até, para além do assunto concreto em discussão. Quais as expectativas que é normal ansiar para os filhos? Até que ponto projectamos frustrações e sonhos nos nossos filhos? Quereremos filhos sobre-dotados, hiper-mega estimulados, quase esquizofrénicos, mesmo que com reduzidas competências sociais e com dificuldades de interacção com o mundo exterior ao seu ego? Ou eventualmente, filhos treinados para ganhar a batalha que gostaríamos de ter vencido? Em vez de garotos com seus próprios interesses, sensibilidade e caminho. Queremos os nossos filhos na vanguarda da tecnologia, pelo que valorizamos as competências de interacção com máquinas em detrimento das competências emotivas. Todos sabemos que as máquinas são na nosso tempo, vantagem competitiva determinante. Mas, Justificar que as crianças querem é computadores, consolas de jogo e telemóveis, acedendo desde logo ao mínimo capricho de desejo por esses brinquedos, frequentemente antes de serem capazes de os utilizarem com segurança e responsabilidade, não será a via do facilitismo ou até irresponsabilidade? A quem cabe senão aos pais, em última análise, reflectir e decidir o que é adequado às crianças mediante o senso comum, a sua experiência pessoal, ou reunindo alguma informação com antecedência, e em caso de necessidade dizer: – Não, ainda é cedo.


Boa semana!


Garrido Carvalho

Março '09
 
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Garrido
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