Poemas, frases e mensagens de Julieta Ferreira

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Julieta Ferreira

SAUDADE

 
Outra coisa não é, apenas saudade
O que carregamos na bagagem.
O amor, esse sim, é o que temos.
Mais a dor pungente por sabermos
Que ficaremos mais sós,
E passaremos a ser menos nós.
Tudo não é senão um logro,
Nada é mais do que uma miragem.
Caminhamos num pântano de escuridade.

Quando se larga todos com sofrer
Dissimulando a tristeza do adeus,
Rodeados estaremos pelo vazio.
Resta-nos só a doce lembrança
Cobertos com um manto de frio.
O que abandonámos, aquele que fomos
É uma ténue imagem do que somos.
Acabamos, na ausência, por nos perder.
Mais não foi que um engano a viagem.

Aquilo que, no fundo, vamos ter
É um poço habitado pela solidão.
Nossa única companhia é a esperança
Nosso alimento não passa da recordação.
Lutamos pelo direito de voltar a viver.
Isolados, carentes, reduzidos à memória,
Onde vamos buscar o alento, a coragem
Que nos conduzirá afinal à vitória,
De regressar ao porto da nossa veleidade?
 
SAUDADE

QUERO-TE

 
QUERO-TE
 
No calor rubro do teu abraço
Eu queimo o meu pesar.
Na chama ateada do teu corpo
Eu arrefeço o meu cansaço.
No brilho candente do teu olhar
Eu apago o meu passado morto.
No fogo ardente do teu beijo
Eu derrubo o meu fingimento.
Na centelha viva do teu desejo
Eu disperso o meu sofrimento.

Quero-te assim…

Nesse instante e para sempre
Perdida em êxtase me deter.
No labirinto de ti aprisionada
Suor a escorrer pelo meu ventre
Na entrega de mim desnudada.
A fêmea outrora adormecida
Surge agora ainda mais mulher
De máscaras já toda despida.

Quero-te em mim …

Do que antes eras esquecido
Na voragem da minha paixão.
De me possuíres tão sequioso
Alimentado no suco do prazer
Que humedece cálido e viscoso
Meu sexo que está ao teu unido.
Afundado num mar de emoção
Embriagado no auge de me ter.

Quero-te assim…
Bem fundo dentro de mim!
 
QUERO-TE

MEU ANSEIO

 
MEU ANSEIO
 
Espera-me…
Com a pueril e sã ingenuidade
Do amor ignorante das tramas.
Num universo despido de idade
Repelindo os enganos e manhas.

Espera-me…
Com a história ainda por saber
Do passado já esquecido da dor.
Num lugar onde só carece viver
Reinventando-te no meu amor.

Espera-me…
Faz de teu corpo meu suave leito
Cobre da minha alma a nudez.
Desprovido do frívolo preconceito
Acredita sim naquilo que não vês.

Espera-me…
Faz de teu abraço meu vero lar
Acalma do meu espírito a fadiga.
Liberto de tão nefasto magoar
Confia no eterno segredo da vida.

Espera-me…
Recebe em ti minha louca paixão
Manifesta em mim teu abandono.
Esse será o auge da fogosa união
No culminar do radiante sonho!
 
MEU ANSEIO

Soneto à Saudade

 
Mais do que palavra, vão conceito
É nostalgia, é grata emoção.
É alimento para a solidão,
Muitas vezes com ela me deito.

Dá cor e luz ao passar da hora.
Companheira fiel do presente,
Ela é aquela que nunca mente.
Recordação dos tempos de outrora.

Vive na terra da gente lusa,
N’ alma portuguesa raiz tem.
Sem ela não haveria fado.

Do poeta a inspiradora musa,
O seu sofrer não priva ninguém.
De muitos é cantar magoado.
 
Soneto à Saudade

Diálogo Nocturno

 
Depois ou antes tanto faz
Do diálogo dos nossos corpos
Da paixão com que te dás,
Na hora nocturna já tardia
Ao despontar dum novo dia
Sussurras ao meu ouvido
Baladas de amor sentido.

Falas e tocas-me…
Eu aninhada nos teus braços
Despida de todos os cansaços
Na nudez daquele abandono
Dizendo que não ao sono.

Gosto de te ouvir…
Gosto de te sentir…

Enlevas-me numa quimera
Volto a ser aquela que era
Ou então nunca cheguei a ser
Com o medo de me perder.

Falas e tocas-me…
Furto-me a duvidar
Do momento real tão nosso
Em ti quero acreditar
Entregando-me quanto posso.

Gosto de te ouvir…
Gosto de te sentir…

Falas-me talvez sem tino
Homem amante menino
Queres-me com tanto ardor
Que chego a sentir o Amor.
 
Diálogo Nocturno

POSSE

 
Num tempo que ficou parado

No desalinho do cálido leito

Num espaço por nós limitado

Nossos corpos se dão febris

Em abandono total o meu ser

Bebe em ti a sequiosa loucura

Tua vontade aguda de me ter

Suor resvalando pelos quadris.



Desapossados já da candura

Solto o grito do meu prazer

Nas sinuosidades do teu peito

Nossa respiração jorra arfante

Sufoca os arrebatados beijos

Nossas mãos colhem segredos

Na alvura da pele escaldante

Na entrega tórrida dos desejos.



Ofegantes e de corações ledos

Longe de ter acalmado a avidez

Nos quedamos ébrios e quentes

Após a fúria da posse enleados

Prà entrega mais uma vez.
 
POSSE

O PRESENTE

 
Quando começa ou acaba?

Ao amanhecer do novo dia

Ou na véspera já tardia?

É porventura o instante

Ou o arrastar moroso da hora?

Uma continuidade galopante

Hoje ou simplesmente agora?



Para todos tão desigual

Como se define afinal?

Porque lhe rouba o sentido

A sombra de um passado

Que é apenas uma memória

A incerteza de um futuro

Ainda sem ter uma história?



Queria vivê-lo intensamente

Despojada do tudo e do nada

Com a lembrança afundada

Do que perturba minha mente.

Abraça-lo sem dele duvidar

Perdida na trama do tempo

Nele a felicidade conquistar.
 
O PRESENTE

Palavras em mim

 
No desassossego das noites mal dormidas,
As palavras visitam-me.
Em rios de pensamento,
Transportam-me para a desmedida esfera
Que transpõe aquela que sou ou julgo ser.
Querem ser ouvidas, escutadas, sentidas,
Querem existir fora de mim.
Adio o momento do adormecer.
Imploram o meu desvelo,
Tocam-me numa brisa de desejo.
Perdida na sua teia, sigo-lhes o rasto,
Ignorante do percurso que iniciarei.
Sinto, nos ouvidos, seu bafejo.
Levam-me numa onda que me arrasta,
Para além daquilo que julgo conhecer
Num turbilhão de sentimentos sem fim.
Insistem, persistentes, inabaláveis,
E eu sem saber que rumo lhes darei.
Elas, insinuantes, em torrentes,
Jorram de uma nascente, em mim.
Contam-me histórias, falam de sonhos,
Desvendam segredos intocáveis.
Possuem minha mente num frenesim,
Numa fúria de amantes ciosos
Ao meu cansaço são indiferentes,
Quer eu lhes diga que não ou que sim.
Encontro-me nelas: renasço uma vez mais
E elas ganham vida, independente de mim!
 
Palavras em mim

Aquele nó...

 
É um vazio feito de pequenos mundos
E no vazio um poço de lodaçal de águas paradas
Onde há muito se afundou o grito do nosso ser
E nesse poço aquele nó … um nó sem laçadas
Que tem nada a ver com as vísceras enfastiadas
É um nó no vazio atulhado daquilo que fomos
E do que ainda não sabemos e porventura somos
É um nó no espaço do vazio do desconhecido
Onde atámos a saudade que não sentimos
É um nó feito do passado que ficou esquecido
Onde amarrámos os amores que repelimos
É um nó que nos lembra o presente não vivido
Onde abafámos os desesperos perdidos
É um nó feito da ânsia calada e do desejo morto
Onde os quereres jazem agora amortecidos
É um nó das culpas que sempre ficaram negadas
Onde as memórias se fizeram dispersas
E o caminho não trilhado de esperanças mudas
É um nó de uma enormidade de pequenos nadas…
 
Aquele nó...

O POETA

 
É aquele que passa

Por nós…



É aquele que abraça

O mundo…



E com sua escrita

Nos deixa…

Menos sós.



Vê em tudo a magia

Ao sonho nos convida

Oferece-nos a fantasia

Dá sentido à dura vida.



Acordado de madrugada

Inquieto em sobressalto

Palavras gritam na mente

Traduzem a emoção

Já não pode fazer nada

Apenas dar vazão

Àquela incessante torrente.



Será assim tão diferente

Aquilo que ele sente

Daquilo que sente a gente?



Nas rimas do seu escrever

Faz a escolha de revelar

O que por vezes sem pensar

Tanto queremos esconder.



Se fala ou não a verdade

De muito que importa isso

Se nos traz sua realidade

Na forma de puro feitiço?

Julieta Ferreira
 
O POETA

Encontros Tardios

 
Chegamos tarde quase sempre
Nem é atraso ou demora
Somos somente tardios.
Sem encontro marcado sem hora
E num constante desfasamento
Essa será a fatalidade
De errarmos no momento…

Chegamos tarde e cansados
Do que éramos quando fomos
Julgando esses que não somos
Diferentes de nós…vã ilusão!
Fecham-nos as almas em arremesso
E a nossa fica mais em turbilhão
Na espera de um recomeço.

Chegamos tarde quase sempre
A culpa não é percebida
Num calar de corações desfeitos
Ignorantes do tempo pontual
O outro como nós está dormente
A probabilidade assim é perdida
Nas tramas da chamada Vida.
 
Encontros Tardios

TUDO OU NADA

 
O nada é falta, carência.

Do tudo senão a ausência.

Falar dele é já afirmá-lo,

Contrário de invalidá-lo.

Se o nada é não realidade

E também pouca porção,

Ainda menor quantidade,

Ao dizer coisa de nada,

Mesmo que seja ninharia,

O seu real não se negaria.

De nada é resposta cortês,

A um obrigado Cordial.

Implicará o nulo esforço,

De tudo o que se fez,

Negando aquilo que vale?



Nada ter é vã asserção.

Sinónimo de inexistência,

Está muito longe de ser.

Oculta a nossa falência,

Do tudo do nosso sofrer.

Afirmar que nada vemos,

É de ver a impossibilidade,

Ou escolha, da nossa parte,

Do que não ver, queremos?



Pedimos tanto pra nada ter,

Ardil encoberto de cobiçosos.

É do tudo sermos desejosos,

Pois o nada fica mais além,

Da possibilidade de haver.

A mim não levem a mal,

Pela questão que vos ponho.

Que é tudo sem nada, afinal?
 
TUDO OU NADA

Entre nós

 
Entre nós…
Cultiva-se a imaginação e a magia,
Superando toda a realidade fria
Até ao instante do encontro planeado.

Entre nós…
Há a doce e confortante cumplicidade,
Dos sonhos que juntos tecemos
Para os dias em que os viveremos.

Entre nós…
Desabrocha uma paixão calada.
Prudentes não a queremos revelar,
Esperamos pela altura desejada.

Entre nós…
Paira o que ficou por dizer
Mas esperamos vir a conhecer,
No tempo pelos dois ansiado.

Entre nós…
Brota a incandescência do desejo.
Alimentamos a chama que nos abrasa,
Para o minuto da consumação sem pejo.

Entre nós…
Transparece a vontade de amar,
Num crescente que nos empolga
Até ao ponto de o podermos concretizar.

Entre nós
Ainda não há o passado.
Todos os momentos são o presente
Na preparação dum futuro sonhado.

E assim ficam
As palavras, os sorrisos,
Os murmúrios, os suspiros,
O silêncio, a loucura
Ficam assim…
… Só entre nós!
 
Entre nós

UMA MULHER ENAMORADA

 
Deixou-se ficar, alguns segundos, sem abrir os olhos.
Sentiu um frémito a percorrer-lhe o corpo cálido, debaixo do edredão. Rolou sobre o lado esquerdo e esticou o braço direito sobre o espaço vazio. Foi então que descerrou as pálpebras, devagar, numa tentativa de não deixar escapar para a realidade que a envolvia, aquela outra realidade que tinha provado, momentos antes. Queria retê-la, por mais tempo possível. Sabia que os pormenores dos sonhos não perduram na memória e, por isso, fez um esforço para se recordar do mais ínfimo detalhe, antes de saltar da cama e iniciar mais um dia, igual a tantos outros, nessa sucessão monótona a que já se tinha habituado. O peso da solidão, no silêncio e na penumbra do quarto, fê-la arrepiar. Voltou a fechar os olhos.
Espreguiçou o corpo franzino, naquela cama demasiado grande para ela, e soltou um suspiro. A pouco e pouco, a expressão do rosto foi-se suavizando, ao mesmo tempo que um sorriso começava a aflorar os seus lábios.
Lembrou o sabor da boca dele, as carícias das suas mãos e o calor do seu corpo. Quando tinha sido a última vez que sentira a proximidade física de um homem?
Ele não era, de modo algum, fruto da sua imaginação. Apesar da vida que levava, ainda não enlouquecera ou mergulhara nesse mundo fantasioso de quimeras e faz-de-conta. Conhecia-o, isto é, sabia quem ele era, embora nunca se tivessem encontrado. Falavam-se regularmente, usando meios da tão abençoada tecnologia que encurtava distâncias e aproximava as pessoas. Tinham passado os últimos quatro meses a dar a conhecer um ao outro quem eram. Tinham começado um relacionamento que se tinha vindo a desenvolver numa paixão. Ultimamente, planeavam, ponto por ponto, o encontro que ambos desejavam.
Numa das conversas mais recentes, ele tinha dito que ela era a sua namorada. Num entusiasmo quase pueril, tinha-lhe pedido para repetir o que dissera. Soube-lhe bem ouvi-lo. As palavras dele fizeram com que um rubor lhe colorasse as faces e um calor lhe inundasse o peito. Lembrava-se de ter ficado de respiração suspensa, gozando com volúpia o instante, como uma criança a quem se dera um rebuçado, há muito apetecido.
Muitos anos tinham passado, desde que ela tinha sido a namorada de alguém. Tinha sido esposa, amante, mulher usada e abusada, fêmea perdida nos braços daqueles que não amara; tinha sido brinquedo que se joga fora, depois de deixar de servir; tinha sido bibelot ou adorno; tinha sido o que outros tinham desejado que ela fosse. Agora, namorada, isso só fora no tempo, já longínquo, de uma juventude descuidada, quando acreditava saber o que era o amor.
Já se tinha esquecido do prazer que era ser namorada de alguém. Ele estava a fazê-la recordar. Esperava, com desmedida ansiedade, o momento em que falaria com ele: esse era, sem dúvida, o ponto alto do seu dia. Quando falavam, ela transfigurava-se: o rosto adquiria uma luminosidade, a voz soava sensual, com laivos de alegria, o tom era arrebatado, os gestos ganhavam vivacidade.
Ele dizia-lhe, às vezes, que ela parecia mesmo uma adolescente. Ria-se, como uma tolinha, fazia trejeitos, tinha vontade de rodopiar. Era verdade, sentia-se mesmo como uma adolescente. Só com ele e para ele.
Decidiu levantar-se. Nessa manhã não falariam, mas sabia que ele estava muito perto.
 
UMA MULHER ENAMORADA

Para ti...

 
Espreguiço-me, ainda ensonada, após uma noite,
perdida na solidão de um mundo alheio.

Sinto a falta da tua presença que nunca tive.
Sinto a carência do teu contacto que nunca provei.
Sinto a perda do que nunca me pertenceu.
Sinto a mágoa de não te tocar.
Sinto o pranto de não te beijar.
Sinto a tristeza da tua distância.
Sinto o desânimo do que não comecei.

Conheço-te!
Desses encontros, num tempo e espaço desencontrados.

Tenho saudades!
Murmuro, na voz sufocada pela dor da tua ausência.

Tenho saudades do amor não vivido.
Tenho saudades da paixão não consumada.
Tenho saudades do tempo que será.
Tenho saudades do que nunca foi.
Tenho saudades do desejo do teu corpo inatingível.
Tenho saudades de mim, abandonada no teu abraço.
Tenho saudades de nós, num tempo inventado pelos dois.

Imagino-te!
Traço os contornos do teu rosto no vazio dos meus enganos.

Sonho o instante do nosso encontro.
Sonho os beijos que trocaremos.
Sonho as carícias em que nos afogaremos.
Sonho a entrega de nossos corpos ávidos.
Sonho o abismo do prazer na dádiva ansiada.
Sonho a realidade de uma ilusão que criámos.
Sonho o que seremos num futuro apenas nosso.

Espero-te!
És a realidade mais real, da existência que vivo.
Só tu sabes quem és!
Só tu sabes que eu existo!
 
Para ti...

Julieta Ferreira