[Auto cárcere]
Olho em volta,
pesam as circunstâncias,
e surge a velha questão...
Estou preso... a mim mesmo?!
Por isto, só por isto,
o nó é tão difícil de desatar.
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[Desterro, 18 de fevereiro de 2018 – 21h10]
[10h58 - Da crítica do silêncio]
Eu — consumido pelos anos,
malogrados os sonhos de ver o meu nome
impresso em letra de fôrma na capa de um livro,
eu concordo com o "maldito" Lima Barreto:
— "A única crítica que me aborrece é a do silêncio."
--------------------in "Amplius".
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[Desterro, 20 de fevereiro de 2018 – 10h58]
[20h45 - Reina a paz na minha vida labiríntica]
Às vezes, eu não sei explicar a paz que reina, calma, suave, na escuridão do meu labirinto... quando lá fora o mundo continua tão ameaçador, agressivo como sempre!
Como eu não dependo de deuses para viver [e morrer], eu dispenso explicações. Vivo a paz até... a ansiedade voltar!
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[Desterro, 25 de fevereiro de 2018 – 20h45]
[Ressaibos daquele prazer antigo]
O que fica como resíduo de um certo prazer, vivenciado em um certo tempo de intensa entrega? Difícil dizer. Mágoas? Talvez sim, talvez não — mas indiferença, nunca!
Mas, se como disse o poeta, de "tudo fica um pouco", então, daquele tempo inebriante, há de ficar sim, um resíduo... aquela raspa do fim do doce agarrada no fundo do tacho da alma abandonada!
As pessoas sempre encontrarão um modo de nos julgar e nos culpar pelos os ressaibos de suas dores...
Afinal, é como nos relata Goethe —
... "Foi assim que, já muito cedo, percebi como as pessoas nos cobram amargamente pelo prazer que lhes proporcionamos um dia".
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Cobrança inócua! O Bem e o Mal não têm duração. Nada, nada mesmo nos garante proteção contra a erosão do querer, contra os lances do Acaso — um perito em cruzar caminhos!
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[Desterro, 13 de janeiro de 2018, às 23h23]
[Contando sonhos]
Penso agora, quando já amanhece, em todos quartos em que dormi durante a minha vida. Talvez, não de todos, mas se eu pousar o espírito que tenta se desgarrar, vou me lembrar da maior parte deles.
Tortura-me o suave pensamento de que eu não consigo contar os sonhos que eu tive em cada quarto, assim como não sei do rol das batidas do meu coração.
Em tempo: já não penso em contar todas as batidas do meu coração, mas apenas em enumerar aquelas vezes em que ele bateu por alguém!
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[Desterro, 23 de fevereiro de 2018 - 05h49]
[02h48 - Infinitos são os vales de lágrimas]
Desde Minas, eu via tudo, sim, eu via... mas eu não dizia nada, pois a cena me cortava as palavras — aquela "água corria não se sabia para onde e para quê". Excessiva no tempo, a água corre, corria, correrá...
Quase uma pergunta... Mas por que me fiz essa pergunta aprisionada, tímida, carregada de dolorida incerteza? A hybris ou o excesso de tudo, é que me atormenta — excessivo, eu não tenho medida, eu não sou a medida das coisas. Tudo me parece supérfluo, excessivo. Não há fundo: melhor nem me olhar... Transbordo o meu olhar, e me perco — escoo sem onde, sem quê.
Que importa para onde as águas correm... correm para avolumar outros cursos de água, que sua vez correm também para onde... para o mar, para o nada? Correm, correm, e correm até perder, na dissolução total, a identidade, a referência de origem. Sorrio — o Nada é salgado, eu não sabia!
E o que me importa o mar? O que me importa o infinito? Por que há tanto sal... infinitos são os vales de lágrimas? Silêncio... De onde eu estou, todo ponto de chegada está no infinito! Prisão, doce prisão dos pensamentos meus... os vales são mesmo infinitos...
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[Desterro, 18 de abril de 2018 - 02h48]
[11h40 - O Judas de si]
[Simples homenagem aos delatores]
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Por que ser o infame Judas de si mesmo?! Mera ausência de coragem, ou um reles espírito de merda? O que é isto — esta fraqueza congênita dos traidores de si e dos outros que alguns têm como fardo?!
Senão, vejamos o que diz a poeta maldita —
...[...] Ou voltando na manhã clara, limpa, inocente, sem remorsos porque a simples presença foi o meu pecado. E não existe erro se não nos negamos a nós mesmos[...] — in "Rosa recuada" . Maura Lopes Cançado.
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[Desterro, 19 de abril de 2018]