Sabado, 24 de novembro
Mr. Wolf amanheceu na esbornia e agora cochila esparramado como um tapete de pele de urso sobre a terra seca no meio da oficina. A orelha direita ferida, na certa brigou pela madrugada, disputando os favores sexuais de uma cadela no cio. Seu Obina joga a ponta do cigarro ainda aceso no rego da sarjeta e erra, está naquela base, a lisura bate em nossas portas. O dono do outro carro quer o recibo e ele acredita que esta com o motorista que o quebrou e o abandonou num posto de gasolina no bairro do Anil, deixando as chaves dias depois no Seu Cardozo, após muitos telefonemas desesperados de Seu Obina.
Mr. Wolf muda de lugar, Seu Obina levanta-se para ir apanhar o celular que deixou carregando em casa. O baixinho encabuloso do sofá sem camisa, com o cós da bermuda acima do umbigo, pedala nervosamente, vindo da padaria. Enfiei mais um pedaço de arame no cabresto da sandália Havaiana.
Seu Obina retorna, coloca o maço de cigarro no bolso dianteiro da bermuda, acende um com o isqueiro e volta a sentar-se, cruzando os seus gambitos. Mr. Wolf sempre arreliado com as pulgas e as coceiras que elas impiedosamente o afligem, coça a orelha com a pata traseira e grunhi baixinho.
Uma pálida lua teimava num céu cinzento, quando sai da pensão as cinco e meia da manhã. Mr. Wolf me encara entre uma mordida e outra na pata e com a longa língua lambe o úmido focinho. Mr. Caracalas, o homem do vidro passa silenciosamente, Seu Obina o chama, estão apolíticos, por causa da namorada do homem do vidro que pegou uma dúzia de sandálias novas em consignação, vendeu todas e não repassou a parte de Seu Obina. Mas agora conversam amistosamente como velhos parceiros.
Uma pausa para esfriar o transformador de solda após soldar o portão de Jades e nem Seu Vá apareceu com o resto do dinheiro. Então vamos ao plano B - ao menos comprar o zinco. Little Fat vai fazer as suas orações, mas antes colocou a caixa de lixo na borda da calçada alta de sua garagem.
Um carro para e acende uma esperança dentro de mim, talvez fosse seu Vá com o dinheiro. Mas é Dona Sorimar, que falou algo que não compreendi bem. O seu digníssimo esposo Jean Gaspar ficou de vim para umas aulas práticas de solda elétrica. Ele comprou um transformador de solda e quer aprender a manuseá-la como hobby.
O técnico de radio do mercado perguntou-me o preço da minha vistosa cadeira senhorial:
- Cento e cinquenta reais.
- Dou cem.
- Não, até cento e trinta a gente conversa.
- Tá, depois eu apareço para negociar.
Tudo conversa fiada.
O mestre Valdecir de boné a estilo Pablo Neruda, uma camiseta do Flamengo e uma bermuda jeans e a sua volumosa barbicha. Perguntei-lhe de onde vinha tão estiloso. Foi fazer um bico, mas o pessoal ainda estava dormindo, agora iria vender camarão seco com o irmão de Seu Valter que os trazem de Cujupe.
- Ele já está me esperando - E foi embora.
Fiquei na minha solidão, apanhei "Guerra dos Tronos - I" de Martin e viajei para os setes reinos e suas intrigas.
Domingo, 25 de novembro
Cheguei tarde na oficina. Seu Obina me esperava preocupado e impacientemente em pé, frente a porta de seu escritório que está com a mola quebrada. Suspendo a minha com muita dificuldade, posiciono a cadeira de plástico no lugar e o convido para sentar. O que faz sem cerimônia e acende um cigarro.
- Pensei que Seu Raimundo não viesse hoje, tivesse bebido umas cervejas e amanheceu ruim - Deu uma tragada, tirou o smartphone do bolso, digitou alguns números e conversou com um parceiro
Minuto depois uma moto estacionou mais adiante. Seu Obina levantou-se e caminhou na direção dela. É um conterrâneo, antigo inquilino de suas quitinetes, o mesmo que lhe adiantou as sandálias...
Seu Vavá a caminho do mercado com a esposa e a netinha sapeca, ficou da dar os trinta reais na volta. Caso tivesse entregue os oitenta juntos -eu teria um bom lucro, mas como sempre as coisas nunca saem com planejo.
- Vou aqui, beber um cafezinho - disse Seu Obina erguendo-se -se calmamente da cadeira e indo para sua casa.
Calabresa, o meu redentor todo bem vestido com a sua vistosa Bíblia debaixo do braço vai na sua missão espiritual.
Jean Gaspar chegou todo invocado com seus apetrechos pronto para a sua primeira aula de solda. Trouxe o seu trans formador de solda Worker, made in China e umas merendas, uns pedaços de bolo de cenoura..