Na Noite
Oiço baratas na minha almofada,
com o meu arrastado pestanejar.
Oiço o sangue da noite,
o zume zume que embala a cidade.
Hoje deitei-me virada para a janela,
sem dormir, vendo um prédio sonolento,
como eu não estou.
E só não te queria à minha beira,
porque faz calor, e eu suo muito,
fico suja... amarela.
Deixo a janela aberta,
convidando melgas para me chuparem o sangue.
Deito-me na noite, sendo parte dela
esperando o seu efeito bumerangue.
Carla Venta
A Aula
Aqui é só perder por perder.
Aqui é só dor e maldizer.
Sabem nada por tudo,
Contudo nada para saber.
Estupidez incógnita
Este grito no ar sufoca!
Não é para agradar,
e não o faz,
toda a estupidez incógnita,
que o eco nos traz.
Pode ser questão de ótica,
mas a mim tanto me faz,
ver gente sólida,
ou os fantasmas por trás.
Vera Soja
Certeza não é
Não há, não é, não sei.
Nem que, nem se, será.
Tudo o que, pode e foi.
Não é.
Mas onde raio estará?
Qual pergunta,
certeza, loucura,
Vida, se interrogará?
Mentiras da Mente...
São do mais.
Inundam-te e não o és,
não foste, nem serás.
A Figura
Qual figura obsoleta,
neste mundo sem constante,
não me vim a esquecer?
Qual criatura esperta
que com breves movimentos
me conseguiu prender?
Cheiro, presença ou essência
que me calhou testemunhar,
tudo toma por coincidência,
para além daquele seu ar.
Ó dita soberana!
Trazes-te a mim sem o saber fazer,
toda a alma, tempo e vida,
em que me deixei perder.
Tudo perco,
sem sentido.
Mas o que disto é razão?
Com cara de riso, ainda hoje
pondero em vão,
toda a lógica de um mundo
que nos escapa da mão.
Querer-te por tempo
Queres querer que queres,
mas sabes que em ti
não há verdadeiro querer.
Sabes que a verdade
não se faz de tempo,
mas sim com a visão de o ter.
E sabes que eu não quero,
não quero de todo,
te perder,
deixar ir a visão
de um tempo que esperei ter.
Eda Tadeu
Pacto Oculto
Coisas acontecem e nem tens
tempo para falar com os átomos
que tocaram e anseiam por mais,
de mais, a mais, posso ter mais?
Ah, cruel ânsia,
que levas todo o bom momento.
Que te concentras em mais,
sem saber o que há para dar.
Que voltas para desesperar, tocar,
revolver no sentimento.
Porque não voltas tu,
para matar fatal duvida?
E levar ao momento em que tu, eu,
nós criamos tudo.
Alecrim
Alecrim, meu amigo,
teu fumo em mim se retem,
limpando as maleitas
que surgiram e não vieram sem
me afogar em memórias...
Mas isso agora não convém!
Curas-me assim então,
e tudo isso desaparece
com um respirar,
grato por ti,
e por te achar.
Em mim
Luto contra aquilo que nunca quis ser.
Nunca esperei,
Nunca pensei,
Não estava predestinada a ter...
Tão grande mártir,
Então a mim, tão pequena que sou...
Mas penso, fui feliz,
Com muitos méritos á toa.
Agora nada,
Já não sou,
O que tudo em mim sempre esperou.
O Resumo
Esta tua falta,
Contigo ainda presente,
Consome-me a mim,
E eu a ti te consumo.
Este meu amar,
Que não sei mostrar,
Perde-te a pouco,
Sem te largar.
Para este amor sem fim,
Palavras procuro.
Mas p'ra quê?
Se eu em ti me resumo.