O QUE É UM VERSO?
O QUE É UM VERSO?
Victor Jerónimo
Verso?
O que é um verso?
Pois então...
São palavras...
Reuniões de palavras
ou serão palavras em reunião?
Têm que seguir a ordem
Marcada na agenda
Regras fixas
E adoptadas convencionalmente
Não podem fugir da linha
Senão a composição poética
Termina a reunião.
No entanto podem ser...
um anverso ou um oxítono.
Pode ser o Alexandrino
ou até o Datilíco,
que nasceu exdrúxulo ou
proparoxítono.
Um verso pode ser
da arte maior
com nove silabas...
fazendo uma pausa na
terceira sílaba
recomeçando depois,
pois então, mas vai pausando
na sexta e depois
na nona sílaba.
Mas também pode ser
da arte menor, coitado...
nasce assim com...
poucas sílabas, sabem?!
como uma redondilha.
Mas coitado
Há o de pé quebrado
Há o errado
Há o heróico
O heroico quebrado...
não, não é aquele
ferido na guerra,
é aquele com seis sílabas.
Depois há o intercalar
sabem aquele que
se repete várias vezes
em canções...
Há também quem lhe chame
estribilho... esse mesmo!
Ah...
E o leonino...
Tenham calma
que não é do Sporting...
É antes um verso
em que a sílaba da cesura
rima com a última!
Depois há os...
livres ou brancos
também há os
brancos soltos.
Há o sáfico e
o ritmico.
Há os que ficam
encandeados,
enquanto outros preferem
emparelhar.
Há os feitos à candeia
daí ficarem quebrados
e...
há o verso...
de uma página
o lado posterior de
qualquer objecto, e...
até o ânus!...
Então?!...
O que é um...
verso?!...
CRIANÇA SÓ
CRIANÇA SÓ
Victor Jerónimo
era uma criança só
sozinha e oprimida
reprimida de ter dó
vivia sua triste sina
sozinha e oprimida
era uma criança só
com a vida parada
por adultos sem dó
vivia sua triste sina
reprimida de ter dó
a criança sem vida
definhou na nota só
TU E EU
Victor Jerónimo
Lisboa/Portugal
Quem sou eu?
Eu, sou o mesmo que tu
a mesma cor do sangue
o mesmo embrião original,
Nascido da mesma hierarquia
sem menos nem mais que tu.
Anseio à vida como tu
à mesma felicidade e saber, amar,
Ter o calor de um carinho
nem mais, nem menos, que tu.
Desejo o sol como tu
ver resplandescente o seu nascer,
E à noite olhar a lua lá no alto
nem menos que eu, nem mais que tu.
Quero o firmamento como tu,
Sentir o calor das estrelas,
Ver o explendor dos cometas,
Como tu e como eu.
Sentir a natureza como tu
ver nas flores o renascer da vida,
E a sensibilidade das borboletas,
Sem menos nem mais que tu.
Anseio ao místico como tu,
Prever o futuro deste mundo assolado,
Sentir em tudo o presente e o futuro,
Nem menos, nem mais, que tu.
Desejo crer em mim, como tu,
Crer nos sonhos que me assolam
e com eles gozar a magia do mundo,
Como tu e como eu.
Quem és tu?
O mesmo que eu,
Nos desejos de construir um mundo novo,
No sentir a paz das florestas,
Na construção da felicidade,
Tu, dá-me a tua mão, irmão.
2ª Antologia Internacional Dois Povos-Um Destino
Grupo Ecos da Poesia
ISBN – 85-905170-5-5
SAUDADE
Victor Jerónimo
Portugal/Brasil
Saudade que me apertas o peito
feita tenaz numa suprema angustia,
Saudade de tudo o que perdi, desfeito
nas amarguras de uma vida vivida.
Saudade da juventude que longe vai
e em que os amores já envelheceram,
Saudade dos amigos que se perderam
ficando-me a nostalgia de quem sai.
E as palavras ecoam como lembranças
dos tempos heróicos, os tempos vividos
e palavras que soavam como esperanças
de uma vida melhor em terras alheias,
Porém, tudo se vai perdendo nos prantos,
ficando-nos apenas as recordações singelas.
04.Agosto.2006
OS VELHOS
Victor Jeronimo
Portugal/Brasil
Passa a vida, passa o tempo e o pensamento
Passa a luz e tudo se envolve em escuridão,
Passam os dias perdidos no fim do tempo
E tudo fica sem alento, em enorme solidão.
Foram-se da vida os belos cantos e encantos
E os gestos de amizade e amor se perderam,
pobres dos que não têm afagos nem carinhos
Infelizes dos que sem amparo envelheceram.
Resta-lhes o cansaço, a desilusão, a amargura
Fica-lhes as recordações de um vida de desilusão,
Foge-lhes correndo o fulgor da vida, a ternura
Abandonados e sem terem quem lhes dê a mão.
30.12.2005
2ª Antologia Internacional Dois Povos-Um Destino
Grupo Ecos da Poesia
ISBN – 85-905170-5-5
TEMPO
Victor Jerónimo
Recife/Lisboa
Quem sabe ...
Eu acabe por ceder ao tempo
O tempo que o tempo tem,
Numa luta constante
Pelos tempos do Além.
Tempo...
Que me escorres entre os dedos
Num tempo que a gente não tem
Talvez possa pedir ao tempo
Que me conceda o bem
Venha...
Não me deixe assim
Sofrer por tempo perdido
Faz-me ganhar o tempo
Com teu amor infinito.
Amiga...
Não lutes sem fim
Deixa o tempo correr
Verás que todo o tempo
É tempo que vem por bem!
Brasil.05.Março.2004
1ª Antologia Poetica, (2004) edição histórica da AVBL, ISBN 85-98219-02-9
http://www.avbl.com.br
A CASA
Victor Jerónimo
Portugal/Brasil
Era noite de inverno...
Na serra a neve caía
Muito lentamente
Num embalo sereno
Quais flocos alegres
Esvoaçantes
Não querendo chegar...
Ao fim.
Havia uma casa
Onde a lareira...
Crepitava
Tentando aquecer...
O frio
A casa...
Era enorme
Com muitos quartos e salas
Por onde o frio entrava
Sem pedir licença.
Tão fria era a casa
Que a lareira gelava
Nessa casa...
Habitava um homem
Muito só
Em solidão
Onde só o amor e...
Carinho dessa casa
Lhe amainava o coração.
Nessa casa
Onde a lareira...
Crepitava
Tentando aquecer...
O frio
Todas as noites...
Com um frio espesso
A solidão do homem amainava
Pois ele tinha na sua frente
A mulher
Que tanto...
Amava.
Mas...
Oh deuses dos deuses
Ele não podia tocar-lhe
Como se fosse
Um suplício de Tântalo
Sem a puder...
Acariciar.
Era assim nessa casa
Onde a lareira...
Crepitava
Tentando aquecer...
O frio
A Primavera chegou...
Com ela, as neves
Transformaram-se,
Em água.
E criando caminhos
Desceram alegremente
Beijando a terra.
A terra...
Agradecendo
Começou a dar os seus
Frutos
Transformando-se
Numa alegria de cores...
E sons.
O Verão chegou...
E com ele o amor.
Frustração, ânsia, decepção
Tristeza e...
Solidão
Tudo enfim
Terminou.
Naquela manhã...
Serena
De muita luz e cor
Um anjo...
Desceu dos céus e veio à terra
Amar, e...
Ter amor.
Um encontro
Um sorriso
Um beijo
Uma lágrima.
E a solidão...
Terminou!...
Agora...
Aquele homem
E aquela mulher
Vivem felizes
No céu
Que finalmente
Encontraram.
Na casa
A lareira...
Aqueceu.
Terra Lusíada, Antologia Poetica Internacional (2005) ISBN 85-905170-3-9
ÓBITO: OVERDOSE
Victor Jerónimo
Portugal/Brasil
Era um menino de boas famílias,
Daquelas que têm quase tudo na vida,
Este quase, subentende que algo falta,
Faltava o amor e carinho nos corações,
Para eles o dinheiro era tudo e com ele
Tinham o poder e até o amor comprado.
O pai viajava muito, por muitos países
A mãe sentia-se só e viajava também,
O filho esse ficava entregue aos avós
Os únicos que com desvelo e carinho
Tão bem sabiam cuidar do seu neto,
Apaparicando-o, amando-o, acarinhando-o.
Mas a vida é muitas vezes madrasta,
Esta não contempla os designios humanos
E eis que doença fatal acomete a avó,
Esta se foi num dia cheio dos raios do sol,
O avô coitado ficou tão só e sem vigor
Que um dia pôs termo à sua vida.
Coitado do neto, que nasceu sem culpa
Fica só, entregue a uma ama de companhia
Que só roubava o que naquela casa havia.
E o menino esse crescia a cada dia sem amparo
Sem o carinho devido a tão tenra idade
Crescia assim num desamparo moral.
Eis então que, decisão das decisões dos pais
Vão de pôr o menino num colegio interno,
Daqueles de onde nunca se sai, como uma prisão.
Prisão doirada é certo pois o dinheiro tudo pode
Mas de onde nunca se sai nem em excursão
Numa pena a ser cumprida por um inocente.
Pena que este paga na terra pelo pecado
Dos pais, que viajam cada um em sua terra.
Bons hoteis, bons amantes e tudo o mais
Enquanto o filho esse, definha na prisão doirada
Sem amor, sem carinho e sem sequer ilusões
Dia a dia cresce aquela criança, assim sem culpa.
Visitas tinha-as dos pais, sempre desencontrados
Porque a direção avisou: “Vosso menino não pode mais
Ele precisa de vós do vosso carinho e amor
Porque senão vai ser um ser humano de dor
Ou pior ainda um revoltado para com a sociedade
Daqueles que só na morte descansarão”.
Pais desnaturados e sem amor próprio
Que seguiam uma vida sem lar nem norte,
Lá tinham que se sacrificar e visitar o filho
“Menino venha comigo, vamos de férias
Vamos conhecer outros países e gentes
Temos hotel de luxo, piscinas e iates”.
O menino ansiou pelo mundo e pela vida
Iria viajar com a sua mamãe querida
Conhecer o que este nunca tinha visto
Enfim, sentir o poder e força do dinheiro
Pois tinha sido essa a sua grande educação
E preparação para a vida, mesmo que madrasta.
E foi naquelas férias que o seu destino foi traçado
Naquele hotel de cinco estrelas pleno de luxos.
Mamãe coitada não tinha tempo para ele
E este ficou entregue aos filhos dos amigos,
Filhos estes que já há muito tinham suas vidas
Marcadas no ferro e fogo do consumo das drogas.
E o menino, aí entrou pela porta grande
Com a pompa e circunstância devidas
Aí a provou e sentiu o seu prazer,
Devorando suas entranhas e sentidos
Que lhe toldava a vida e o fazia esquecer
Em noites de orgias regadas a drogas.
Muitos anos se passaram e o menino
Fez-se homem, homem que continuou sem rumo
Sem carinho ou amor dos pais agora separados,
Frequentou clinicas de desintoxicação
Roubou para matar o vicio e esteve na prisão
Dia a dia definhamdo cada vez mais e mais.
Seus sonhos eram diferentes dos nossos
Queria deixar aquele vicio que o corroía
Queria ser normal, ver o sol e lua
Queria encontrar o amor ou apenas a amizade
Até que um dia seu corpo cedeu à doença
E este num misto de medo terminou consigo.
Óbito: Overdose
Coitado, mais um que terminou seus dias
Escolhendo o caminho mais fácil
Porém o mais cruel, que um jovem
Na flor da vida tem que escolher
Por falta de amor e carinho.
30.Set.2005
O CARVOEIRO
Victor Jerónimo
Portugal/Brasil
Não havia o que comer e beber quase também não.
Era assim até depois da segunda guerra mundial em montes perdidos das Beiras, em Portugal.
A água gelava nas fontes, o frio era intenso e o agasalho muito pouco. Serviam as sarapilheiras de cobertor e os cavacos eram bem poucos para acender o lume.
Havia grandes pinhais, mas estes eram guardados pelos donos e mato não havia, já tinha sido roçado. Os poucos cavacos eram dos donos dos pinhais.
Por vezes lá se encontrava algum tojo para aquecer o lume, mas até esses eram uma raridade. Os carvoeiros precisavam deles para fazer o carvão e não era tarefa fácil.
Iam para os montes, longe das propriedades, abriam um buraco no solo o mais profundo possível e de preferência redondo; enchiam-nos com tojos e caruma. Depois de acenderem o fogo, havia que tapar o buraco com terra, deixando um pequeno respiradouro, para este não apagar. E assim tinham que ficar entre uma a duas semanas perto dos seus buracos, pois havia o perigo de algum ladrão os roubar.
Era assim que o Manel fazia anos a fio. Tinha mulher e seis filhos para criar.
Naquele ano o Manel estava com sorte, o ano estava a ser muito frio nas cidades e a venda do carvão estava em alta. Nesse ano ele tinha começado a fazer o seu carvão mais cedo, mas agora o frio era tanto que ele não conseguiu subir aos montes.
Tinha acabado de regressar da cidade e tinha o produto da venda consigo numa bolsa por dentro das calças e presa na perna.
Escolheu um terreno baldio lá para os lados de uma quinta procurando um abrigo. O frio nesse dia apertava tanto que ele foi recolher-se debaixo de uns beirais da loja da quinta.
Foi aí nesse beiral que o Manel, homem honesto, trabalhador e amigo do seu amigo foi encontrado sem calças e morto.
Hoje o dono da quinta é um rico industrial, que começou a fazer riqueza depois da morte do Manel.
Ele há coisas...
11-02-2004
Publicado como Editorial no jornal “O CANTINHO DO BACALHAU” Recife/Brasil, jornal de circulação entre todas as comunidades portuguesas espalhados pelo Mundo
O PESO DO OURO
Victor Jerónimo
Portugal/Brasil
Sinhõ... pão por Deus.
Minha mãe tá tuberculosa
Meu pai em cadeira de rodas
E eu sou pequeno pa trabalhar.
Cenas como estas deambulam em muitos lugares no mundo, esta particularmente a recordo nas minhas viagens diárias para o emprego. Crianças sujas com estes cartazes em papelão, no meio de senhores e senhoras perfumadas que fingiam dormir, ou estarem distraídas com uma leitura de momento. Ele arrasta-se de vagão em vagão, sem pernas, uns tamancos nas mãos, que substituem os pés, pendurado ao pescoço uma lata e um cartaz: - Tenham dó e piedade desta pobre alma, que não tem o que comer.O comboio rola, vencendo os trilhos de ferro, lá dentro o povo trabalhador, segue impávido, sereno e pensa, coitadinho, que horror. De vez em quando lá cai uma pequena moeda na latinha.Os olhos do invalido brilham como se tivesse ganho na lotaria. Ela ainda menina, mas já bem "apetrechada" vai ganhar a vida na... rua.Sua mãe assim o faz há muitos anos e seu pai esse... nunca existiu.Quase como que uma tradição de família, a menina, vai ganhar a vida, pois sua mãe está velha e cansada e os homens já não a querem.Preferem a carne fresca... a carne acabada de sair da infância, para entrar directamente no mundo da prostituição. Tantos, milhares, milhões, biliões de casos iguais, diferentes, mas todos em busca do pão. Pão que é tirado das searas em ouro, por homens que trabalham para um patrão, que o vende a peso de ouro.Em países com leis que destroem o excesso de produção, dando mais ouro a esse patrão.Destruição dos excessos de produção, que não podem matar a fome no mundo, pois destroi a balança de pagamentos.O ouro, que faz e desfaz, em nós complexos.Quem o tem chama-lhe seu. Quem o não tem, arrasta-se, chora e até mata por ele.Ouro esse vil metal, que podia ser do bem.Quantos séculos, ou milénios ainda terão que passar para que o homem, entenda, que o mundo pode ser um paraíso?
07.Set.2005