Meninângela
Meninângela
Olhos verdes
Penetrantes
Cabelos curtos
Lisos
Adornados por borboletas que não voam
Só encantam
Seu semblante angelical
Transformando vivência em esperança
Saudade em amanheceres reluzentes
Tampos não passados
Relembrados, apenas
...”Pega Pega”...
...”Amarelinha”...
Rodopios cantadores
Sorrisos inocentes
Olhos verdes
Meigos
Cabelos trançados
Lisos
Enfeitados por fitas coloridas
Moradias futuras
Das borboletas que não voam
Só encantam seu semblante angelical
Transformando esperança em vivência
E reluzentes amanheceres em saudade.
Alexandre Sansone
2007
O amor está de luto
O amor está de luto
Nação brasileira chora seu luto negro.
Lamenta a presença asquerosa do ódio.
Reprime com fervor os braços da violência.
Grita sua indignação diante do clamor popular.
Cobre florestas, cidades, mares e rios por vergonha.
Busca um abrigo que garanta proteção.
Procura algum vestígio da perdida humanidade.
Clama pela presença do respeito a todos os cidadãos.
Exige dignidade e paz sem separação de raças.
Implora competência para correta justiça.
Pede luz para trazer de volta a compreensão.
Nação brasileira orando se ajoelha e pede perdão.
Em momento triste acaricia o amor.
Silenciosamente respeita seu luto.
Alexandre Sansone
21.11.2020
Carícia
Carícia
Espanto! Surpresa! Temor!
Sensações presas à tristeza.
Perplexidade! Indignação! Desamor!
Cotidianos amarrados à incerteza.
Desumanidade! Ódio! Ignorância!
Cresceram arrebatando a violência.
Medo! Dúvida! Incompreensões!
Afastaram amizades dos corações.
Isolamento! Solidão! Saudade!
Formaram miscelânea de confusas correntes.
Descompassaram opiniões divergentes.
Misturaram ideologias com rancores.
Trouxeram feridas não cicatrizantes.
Embeberam lágrimas com amargos suores.
Esqueceram que somos humanos.
Deletaram o necessário respeito.
Atiraram na alma rotos panos.
Deixaram o amor sem jeito.
Luz! Esperança! Amizade!
Surgiram com o preparo salvador da ciência.
Avançaram com um terremoto de sapiência.
Objetivaram doce carícia para nos trazer de volta à vida.
Alexandre Sansone
19.01.2021
Indigência
Indigência
Ventre rasgado.
Filho engolido.
Arroto explodido num riso sarcástico.
Dentes limados.
Boca enlameada.
Cuspida arrebatada num choro convulsivo.
Dor no peito: saudade
Nó na alma: remorso
Consciência negra: nojo.
Mistura de odores que penetra nas narinas alargadas.
Chorando, espinhos caem das pálpebras.
Tristeza perseguindo a trajetória vazia de ser apenas um inútil, perdido na trilha.
Alexandre Sansone
1982
Um homem comum?
Um homem comum?
Olhando daqui parecia um homem comum no banco da praça. Sem atrativos. Nada de brilho no olhar. Apático. Indiferente. Tão somente respirava. Sentado ereto e com os braços estendidos até os joelhos. Pés juntos. No esquerdo, sapato preto. Marrom no direito. Este era o detalhe que o transformava em assunto dos que por ele passavam. Espantados, riam ou lamentavam sem saber exatamente o porquê.
De longe percebia-se sua palidez seca na pele endurecida pelo passar do tempo. Roupas limpas e surradas. De perto talvez exalasse um perfume deixado no corpo por algum sabonete inexpressivo. A cada badalada do sino da igreja anunciando um quarto de hora, enfiava a mão no bolso do paletó, retirava o maço de cigarros e o isqueiro vermelho-escarlate. Ao último som, acendia o cigarro e sorria.
Não atirava a sobra do cigarro no chão. Apagava-o, nos dias pares, na sola do sapato preto e o guardava em uma caixinha que trazia sempre com a mão direita aberta. O esmero era tanto, que para um observador atento daria a impressão de ser do mais requintado cristal. Era de papelão vermelho-escarlate. O sorriso apareceria no próximo cigarro. Assim permanecia por exatamente seis horas.
Às vezes alguém sentava-se ao lado dele. Quando o cumprimentava, recebia de retorno um silêncio frio e distante. Não trocava única palavra. Espantava com um abanar de mãos os pássaros que ousavam dele se aproximar. Aos pombos dirigia um ríspido bater de sola do sapato marrom. Com o preto empurrava as folhas perdidas das árvores. Essas recebiam um leve balançar de cabeça. Seria respeito por também estarem ali?
Da janela da sala era sempre observado e admirado pela pontualidade de seu gestual diário. Nos dias ensolarados usava um largo chapéu claro que enchia de sombra seu rosto. No inverno, trocava-o por um acinzentado que escondia seus cabelos brancos sempre muito bem penteados. Dava a impressão que ao ajeitar o chapéu sentia orgulho em mostrá-los.
Caso a chuva marcasse presença, usava capa preta, daquelas bem antigas e um comprido guarda-chuva de pano também preto e sofisticado cabo de madrepérola. Nada o abalava. Dava a nítida impressão de estar cumprindo uma obrigação. Ou estaria sempre a aguardar alguém? Havia um detalhe. Ao chegar e ao se retirar olhava ao redor como se procurasse algo. Tinha apreensão nesse gesto.
O banco era o mesmo todos os dias. Aquele, do lado esquerdo de quem daqui observa e bem defronte da padaria mais antiga do bairro. Ao perceber que estava ocupado, dava voltas pelo lado direito da praça até que permanecesse vago. Somente nesse momento se sentava. Não comia e nem bebia. Fumar era seu deleite. Cigarro barato e com forte odor amargo de nicotina. Assim transparecia nos semblantes dos que por ali transitavam.
Houve um período sem aparecer. Era outono.
A praça estava enfeitada para as festividades de final de ano na manhã em que o homem surgiu trazendo uma pequena mala preta com palavras em vermelho-escarlate. Forçando a visão era possível ler: Casa do Bom Idoso. Ocupou seu espaço no mesmo banco. O rosto desenhava uma ligeira esperança de alegria. As passadas tinham sido mais firmes. Havia decisão em seu andar. O sino soou sozinho. O cigarro não compareceu.
Vestia seu antigo terno com aparência de novo. Os sapatos, cada um de sua cor, lustravam de tanto brilho. Trazia ainda seu guarda-chuva enrolado em uma fita madrepérola. Na cabeça, o chapéu claro. O outro certamente estaria na mala. Ou o teria abandonado, por ter triste aparência. Pela vez primeira consultou as horas em seu dourado-velho- relógio- de- algibeira. Apreensivo? Temeroso? Nervoso? Saudoso?
Somente ele para dar a exata resposta. Provavelmente aquela jovem senhora de vestido lilás que para ele acenou da janela do carro que parou na frente da padaria saberia. Ela demonstrava inquietação e até mesmo uma certa contrariedade. Notava-se pela rispidez de seu distante cumprimento. Não houve abraço e aperto de mão. Leve acenar, talvez. Encaminhou o homem para o banco de trás e mandou o motorista seguir. Ela entrou em outro veículo e acompanhou o primeiro.
Ao darem a volta na praça foi possível notar seus olhares. O homem trazia um suave sol em suas lágrimas que molhavam a palidez seca de sua pele endurecida pelo dissabor da solidão. Ela, com sua altivez, apagava a luminosidade do afeto. Não admitiria olhar para trás e enxergar o passado na presença daquele homem comum.
Seria!?
Alexandre Sansone
25.05.2020
Feliz Aniversário
Feliz Aniversário
Dedicado ao amigo Dr. Arthur da Motta Trigueiros
A máquina para
ao olhar distraído
da cinza pomba
que busca entre as migalhas do ar
um pouco, ou quase-nada, do tudo
retido na lembrança colorida
de um sentimento agora adormecido
pela ausência saudosa da presença partida.
Aniversário,
rosário de fatos
acumulados no álbum memorial
de nossas existências,
marca seu ponto
no dia desse desencontrado
sabor de lágrimas
salgadas pela recordação.
O homem sonha
sempre com o brilhar do sol
que carrega em seus raios
a sinistra e escura – será assim?
figura da morte.
Parabéns ao tempo.
Abraços ao passado.
É aniversário de uma vida eternamente amiga.
Alexandre Sansone
16.04.1982
Gelinha
Gelinha
Do dia, resta a noite.
Do trabalho, arrota o nada.
Da amizade, sobra a tristeza.
Mas, do amor, transborda a alegria de ter você.
Alexandre Sansone
03.04.86
Procura-se
PROCURA-SE
Buscamos por um ser imenso em sua essência e invisível aos olhos de todos. Presença imprescindível nas cotidianas e justas atitudes. Perdido no emaranhado da negatividade que insiste em querer permanecer. Solicitamos união fraterna nas investidas para encontrá-lo. Sua mãe, nação brasileira, está angustiada, triste e aflita. Não a deixe sofrer. Sua alma está dilacerada. Ele é belo, amigo, sincero, meigo e honesto. A recompensa será seu largo sorriso. Atende pelo nome de respeito mas pode também chamá-lo de amor.
VIDAS NEGRAS IMPORTAM.
Alexandre Sansone
22.11.2020
Dia da Terra
Dia da Terra
Paz, a borboleta, e Universo, o passarinho, voavam novamente.
Percorriam planícies, montanhas, mares, vegetações.
De maneira doce folhas acenavam aos corações.
Transmitiam leveza ao sol e a lua suavemente.
Os astros cantavam e davam vivas às comemorações.
Naquele dia, 22 de abril, a Terra sorriria alegremente.
Celebraria os cinquenta anos de sua data, o Dia da Terra.
Todo o Planeta resplandecia de felicidade: não haveria guerra.
Por horas não se lembraria de frases banais soltas no ar.
Taparia os semblantes do espaço para manter seu lar.
Paz e Universo conscientes disso espalhavam pétalas sem parar.
Em pouco tempo tudo e todos ficaram cobertos de perene fraternidade.
Água, terra, ar e fogo se abraçaram e louvaram a amizade.
Unidos manteriam acessa a chama vermelha da solidariedade.
Paz e Universo cumpriram a tarefa amiga de elevar a lealdade.
Alexandre Sansone
23.04.2020
À infância
À infância
É o riacho que ri o riso que desponta a ponta que lança o algodão no ar
... Penumbra leve traz em seu bojo pequenos traços que formam laços azuis brilhantes...
É o mar que zomba da bomba que chocolateia borrando o rosto
...Pedra branca leva dentro de si grandes abraços que enlaçam desejos, amigos prateados...
É o riacho que zomba do riso que desponta a bomba que lança o algodão borrando o rosto com ponta de chocolate.
Alexandre Sansone
2003