Poemas, frases e mensagens de luciusantonius

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de luciusantonius

Venho de longe, tão longe que quando olho para trás vejo muito tempo. Venho do Norte, de terras de Amarante onde o canto dos poetas sussurra a cada instante. Não sou poeta mas o murmúrio desse canto ressoa em mim ousadias não sonhadas.

PARA TI

 
PARA TI

O amor com que te amo é lendário
É diamante, não sonhado privilégio
É sede que quero ter, é lampadário
É fogo que arde em mim em sortilégio

O amor com que te quero foi já sonhado
Num misto de rubis e ouro puro
É vaso de cristal inacabado
Dos sonhos o maior que eu auguro

O amor com que te amo é sol nascente
Telúrica erupção dos amores de amante
É fome que quero ter, fome inclemente
É esquecer-me de mim em sonho galante

O amor com que te amo é loucura
Desnorte, enlevo, alucinação
Mas no embalo quente da ternura
A mais fogosa, a mais ardente canção.

Antonius

(No aniversário de Alguém – 30/12/2009)
 
PARA TI

AMANHÃ DÁ SOL

 
AMANHÃ DÁ SOL

O sol despede-se na linha do horizonte derramando filigranas feitas fios de ouro num gesto de despedida grandioso mas sereno, como que fazendo crer ao mundo a promessa de um inevitável amanhã. Eclipsados esses últimos raios de sol, aproxima-se a noite pujante de força na aparência sinistra, mas logo ostentando prelúdios de grandeza, porventura de dignidade. Dir-se-ia que esta hora, tornada pouco mais que um instante, é a do ancestral enlace grande e solene do dia que se fez velho com a noite, ingénua donzela. O encanto deste casamento nesta precisa hora acorda os sentidos da menos atenta criatura. É que, é a natureza que fala no seu esplendor maior na hora vivida entre a vida e a quietude. As árvores da alameda dão o seu contributo sem par ao espectáculo que graciosamente se lhe oferece, atirando os seus galhos desnudados para um céu onde se descortina ainda um vago mas incomparável azul. A noite chega portentosa, cobrindo montes e vales, aqui e além contrariada por importunos focos de luz que o homem criou para sua conveniência. Mas a noite também é ou tem no seu cerne o sentido da solidariedade. É então que incumbe a lua de suavizar num rasgo que esbanja poesia a sua proverbial negritude. E assim acontece o milagre do equilíbrio do dia e da noite feitos deslumbramento aos olhos e sentidos do homem. É por isso que vale a pena que ele de quando em vez abra os olhos, apure os ouvidos e afine o pensamento, porque a natureza é sinfonia que vale a pena ser escutada.
Antonius
 
AMANHÃ DÁ SOL

RAIZ QUE SOU

 
RAIZ QUE SOU

Oiço o barulho do tempo

Trazido na onda dos eternos silêncios

Oiço dos medos a amargura

Velada por palavras de candura

Vejo o que não vejo que esse tempo

Trazido por ventos de loucura

Trás sussurros do canto de uma mãe

Escuto em murmúrios de enlevo

Vozes que vêm de há muito

Consumidas da vida no enredo

Daquilo que são vestígios de mim.

Oiço remotos silêncios

De quando eu não era ainda

Chegam a mim como original momento

Essencial força feita raiz funda

Dessa árvore não medida

Em que o tempo me tornou,

Antonius
 
RAIZ QUE SOU

TROVADOR

 
TROVADOR

Fui poeta e trovador
Lá para as bandas do Islão
Cantei cantigas de amor
Ao próprio Rei do Sião

Na barca que me levava
Cantei cantigas de amor
Sabia que me escutava
Do Islão o Imperador

Encantado se mostrava
Ao ouvir coisas de amor
Orgulho eu não simulava
E vaidade mesmo ostentava
Ao sentir-me trovador

Lucius Antonius
 
TROVADOR

A Voz do Silêncio

 
A Voz do Silêncio

Não, não quero o silêncio
Rejeito a soledade.
Não logro ver aí a verdade
Prefiro ouvir os sons
Os timbres da humana voz
E por que não o toque dos sinos
Às Trindades
Nessa quebra dos silêncios
Sinto mais a minha verdade
Mais integrado na barca
Que carrega a humanidade.
Tenho medo da sobranceria
Essa que nos coloca distantes
E segue a estrada do silêncio.
Ainda que este de bom tom
Da moda nos ditames
Prefiro, insisto
Ouvir dos homens a palavra
Da mulher os cantos da sereia

Antonius
 
A Voz do Silêncio

VÃ GLORIA

 
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VÃ GLORIA

Emerge na nação Colombana
Torquemada que nova pólvora descobriu
Às gentes de bom senso ele não engana
Mal vai a quem tão iníquo ser pariu
Essa pátria que da riqueza se ufana
Do seu tempo vive a hora emergente
Nos tempos que correm dela emana
Um toque de sinos, mortal, plangente.
Arremedo de homem ele se mostra
Dia a dia se tornando evidente,
Alcandorado ao cume da glória
Toma falso sentido de vitória.
Esquece que transposto o cume da montanha
Não lhe resta mais do que
A vertente ingreme e escarpada
Que leva as águas infectas e tenebrosas
Lá bem no fundo do vale.

Homem pequeno, afinal

Lucius
 
VÃ GLORIA

DESNORTE

 
DESNORTE

Nos céus deste Lusitano rincão

Pairam nuvens negras, cúmulos cerrados

A prenunciarem inclemente borrasca

Sendo ainda dia faz-se noite

Que o sol, esse fazedor de vida

Qual guardião dos dias de sempre

Parece prometer ao homem

Vergastada solene, merecido açoite.

Nos céus deste rincão velhinho

Parece ter o homem perdido o norte

Incapaz de seguir o seu destino

Feito um tornado em desatino

Reclama de outros a sua sorte.

Num passado glorioso fundeada a ancora

Rumou para a frente sempre altaneiro

Não consintamos nós, filhos deste tempo

Que espúria rajada de inusitados ventos

Leve a pique o sonho do Infante marinheiro

Antonius
 
DESNORTE

ENTRE O ONTEM E O HOJE

 
Para o homem de hoje o que passou
Não tem história, é letra morta
Foi levado na noite por feroz procela
Perdeu razão de ser já nada lhe importa
Parar é pura perda de tempo
Olhar para trás é recuar
No futuro está todo o seu intento
Que só nele tem razões para ganhar

Esqueceu o homem do meu tempo
Que de tudo no passado estão as raízes
E não foi o vento que as arrancou, não foi o vento
Que do exterminador são outras as matrizes
Sim o homem deste tempo esqueceu
Que este seu mundo brota do passado
Outros antes dele cavaram fundo
Com um fervor deveras extremado
Ao homem de antanho a grande gesta
Se deve de um mundo construir
Não caiba ao do meu tempo a não honesta
Capacidade de o fazer ruir

Antonius
 
ENTRE O ONTEM E O HOJE

LUSITANOS POETAS

 
 
Parafraseando o poeta Andaluz
Ou arrebanhando-lhe a intenção
Eu canto os poetas,
Os poetas Lusitanos de Agora
No remanso das ideias que lhes assomam
Na palavra transparente
Que deixa passar a verdade que sentem
Aceitando do outro
A verdade que supostamente não tem que ser a sua.
Neste enlevo poético
Se assim o posso chamar
De novo eu direi
Que canto os poetas,
Os poetas Lusitanos de Agora.
Mas não no fingimento
Na palavra insidiosa
Feita mortífero aguilhão
Mas antes sem rodeios e sem aleivosias
Um hino ao amor e à amizade
Afinal um hino ao belo
Que de mil e uma formas
E outras tantas pétalas
Se derrama sobre o desfiladeiro de sensibilidade
Que se não queremos negar-nos
Fatalmente somos
E que inevitavelmente
Passa também pela amargura
Pelo sofrimento
Que às vezes não tem limites.
Enquanto assim
Desabrocha em mim
O desejo de ser poeta
Ainda que pelo desejo me fique.

Naquilo que será um magnífico sonho
Eu cantarei com desassombro
Os poetas,
Os poetas Lusitanos de Agora.

Antonius
 
LUSITANOS POETAS

ALGO DE MIM

 
ALGO DE MIM

...Eu sou o meu amanhã somado ao tempo que me ficou para traz.
Eu sou aquele pedaço de mim que sobrou na voragem dos indecifráveis vermes que moram por dentro do meu ser. Sobretudo sou aquela franja de amor que sobrou do infinito amor que desfiz em ti. Ao ser isto sou coisa que já valeu a pena, areia do deserto gota de matinal orvalho, letal vírus por desventura, sopro de vida, mas também inalação do cheiro de violeta vindo de ti, porque de ti exumado, do teu corpo de sereia nascido de um sonho que prometeu e foi fecundo e ainda que moribundo um novo Perseu deu à luz.
Rendo-me a ti, aos teus encantos, ao teu deslumbre, à tua graça, ao teu sorriso, à doce criatura que sei que és, ao teu norte, à elegância do teu porte, inelutávelmente àquilo, aquela, que me foi dada em sorte. Há tempos de privilégio.
 
ALGO DE MIM

O TEMPO PASSA

 
E O TEMPO PASSA

Um ontem, um hoje, um amanhã
Tempos de um tempo que é meu
Subordinados assim à vontade do meu eu
Portas que se abrem à investida desses tempos
O ontem e o hoje horas já vividas
Na voragem dos ventos inviável o seu recuo
Inabaláveis são no que foram e no que são
Irrepetíveis na veloz caminhada
Que retorno algum consinta
Não há já expectativa
Que mais e mais para traz se fica
Esperança toda vai no bojo do amanhã
Que se deixa montar por garboso galã
Que ilusões conhece ainda
E se o ontem e o hoje não são já
Tudo o que resta e fala de futuro
Não é senão o insondável amanhã
Antonius
 
O TEMPO PASSA

SINFONIA

 
SINFONIA

Chuva de oiro que inunda os teus cabelos, sede de água que o homem da terra implora. Águas do meu rio que a neblina cobre em remansos do mais puro linho, edénicos sons saídos do vazio imenso, nascidos por de traz do infinito. Orgia de sons que chega do meu eu saudoso, distante, daquela metade de mim que mais do que sinto pressinto imaterial. Escuto melodias que não tem preço, ecos de zarzuelas em que se tornou o estrépito dos desfiladeiros das montanhas das alturas da terra que é mítica só porque nela nasci. Ecos trovadorescos que estão inscritos no meu amanhã a dar-lhe consistência. Ruídos que o não são porque me enternecem dando-me conta de sair de mim ao escutá-los. Arco Íris melódica pauta de uma sinfonia de que me chegam arrebatadores murmúrios.
 
SINFONIA

PARA ALÉM DESERTO

 
PARA ALÉM DESERTO

Ténue luz
Distante, nos confins
Sede de água no oásis, além
Deserto sem medidas
Inatingível no seu termo
Longe lá muito longe
Suave, essa luz tremula.
Não mora esperança
Neste vislumbrar distante
Não há lugar para o sonho
Demasiado branda essa luz.
Mas de a ver,
De a adivinhar
Sonhei com ela
E ela se fez grande.
Pouco a pouco
Iluminou o meu deserto,
Que deixou de o ser
Na medida em que
Resplendente
Essa luz se faz prodigiosa.
Num instante
Bem mais que distância
Que ténue luz longínqua
Que oásis perdido
Num deserto que já não é
Mora a grandeza do amor
Safira em que se tornaram
As desérticas dunas

Antonius
 
PARA ALÉM DESERTO

Força da Saudade

 
Força da saudade

Borbulham dentro de mim alvoroçadas
As águas de acumulada saudade
Correndo montanha abaixo desordenadas
Na ânsia de se darem à saciedade

Sinto-me feito uma albufeira
Ansiando pelos rios, pelos vales
Cabaneiro cansado de um dia de jeira
Procuro bebendo furtar-me aos meus males

Penso em ti cada instante que passa
Passas o dia no meu coração
Mas não julgues que o faço de graça
Hás-de paga-las com dura caução
 
Força da Saudade

EU MORO NO ESPAÇO

 
Eu Moro no Espaço

A vida é uma aventura
Que nas nossas mãos
A natureza determinada coloca
É rasgo de coragem
De um poder de que nos escapa a imagem
Chega a ser se o quisermos
Fonte de ternura
Não interessa muito
Onde e quando nasceu
Se semente da terra ou do céu.
Ao pensar a vida eu sonho o mundo
E ansiando vê-lo do espaço
Penso que só daí
Lhe descortino a grandeza
Lhe agarro a beleza
Que gira nessa esfera azul
Onde o homem vive ou vegeta
Onde eu próprio percorro os meus dias
No trabalho, nos anseios
Na dor e na alegria
Mas onde verdadeiramente
Agarro a vida.

Antonius
 
EU MORO NO ESPAÇO

SERÁ QUE EXISTES

 
SERÁ QUE EXISTES?

Oh Deus, porque não existes? É tão lindo este mundo, há nele tanta coisa preciosa! Há sentimentos, coisas que sentimos lá bem nas profundas da alma que nos estremecem, trazem até nós sentires inefáveis como esse a que chamamos Amor.
Este fala-nos numa linguagem muito própria, inatingível para a nossa inteligência mas que a nossa sensibilidade misteriosamente agarra e digere em delírios enternecedores que nos despertam o espírito e estremecem o corpo físico que nos acompanha.

No meio de tanto encantamento, como não existes oh Deus? Como vibra em nós esse sentimento fabuloso, inigualável, mas também outras sensibilidades que não têm preço, como a Amizade, apesar dos riscos de ser enganadora. Isto no que respeita ao nosso mundo interior e às efabulações da nossa mente. Mas oh Deus! Tu não existes apesar dos meus argumentos, mas há mais: há todo um mundo fantástico ao alcance daquilo a que chamamos sentidos e que alcançamos através dos nossos olhos, dos nossos ouvidos e de outros agentes físicos. É que com os olhos eu vejo a natureza, vejo os rios e as montanhas, as quedas de água, os desfiladeiros, os prados verdes e as árvores, esse milagre cresce e se torna frondoso e dá frutos que são delicias, tudo isto por obra e graça não sei de quê. E os meus ouvidos? Se os não tivesse ou por absurdo não funcionassem, eu não ouviria coisas maravilhosas, como o murmúrio das águas, o canto do rouxinol, a Tosca de Puccine, o alarido das crianças, a voz de uma mulher. Além disso, apesar de não existires, como pode oh Deus existir o sol, essa lua que sempre apaixonou os mortais.
Eu sei que há sofrimento também, e que tantas vezes tortura a alma. Eu conheço-o. Quase todos o conhecemos. Mas justamente porque ele existe, Tu devias existir, para aplacar os demónios que o injectam na vida dos homens.
Sinceramente, acho absurdo que não existas para que nós, pobres criaturas ignorantes víssemos lógica, entendêssemos o fantástico da vida e interpretássemos o porquê do sofrimento. Sabes uma coisa? Eu às vezes penso que Tu se calhar até existes, por aí escondido algures, atrás de um penedo no cocuruto de uma árvore, no cimo de uma montanha ou com mais lógica ainda, por detrás das estrelas. Só que escondido. Mas escondido porque? Pensando bem, talvez haja lógica nessa coisa de te ocultares aos olhos dos homens. O que seriam eles, o que seriamos nós se te víssemos, se estivesses ao nosso alcance? Acho que tenho que concluir que o homem só consegue ser homem às escuras, isto é, não Te vendo. É que no dia em que Te visse estaria chegado ao cume da montanha, teria acabado o tempo.
Sabes uma coisa? Às tantas Tu até existes, só que para nossa realização plena, fora do nosso alcance, apenas nos dando a chance de Te pressentirmos.

Antonius
 
SERÁ QUE EXISTES

Insondável Caminhada

 
Insondável caminhada

Às vezes, muitas vezes sinto entranhada ânsia de ver para além do que vejo, de sentir para além do que sinto, ao fim e ao cabo, de interpretar a vida e este mundo onde dia após dia dou os meus passos. Nesses instantes tomo consciência plena de que estou a chocar com o mistério , mas mistério que me desconcerta e com o qual quase desatino por não dar resposta às minhas interrogações – desmedidas que são certamente – de sempre. E desatino porque quando enveredo por estes caminhos – verdadeiros meandros da humana existência – sinto que o mistério se adensa, depois de um momento extremamente fugaz de falaciosa promessa de que uma energia interior para que não descortino explicação, me vai desvendar o mistério. Só que a cortina que nesse momento se me anunciou, em vez de subir e me dar a chance de ver a banda de lá das coisas, no que estava a iludir-me, desceu o pano (como é vulgo dizer-se) e uma vez mais e sem contemplações me impediu de ver o espectáculo (sublime espectáculo terá de ser) que se desenrola no inimaginável mundo da ribalta desse acontecimento que constitui o até agora indecifrável espectáculo da vida.
Ao pensar assim e depois de digerida a constatação decepcionante de que continua tudo como dantes no que toca às minhas investidas na busca da verdade das coisas, deste mundo em que vivemos e de que fazemos séria parte, só me resta ou desistir desta tentação de querer saber, ou continuar a parar aqui e além nas estações do meu reflectir. Em boa verdade sinto que à minha natureza não resta outra hipótese que não seja a de, de vez em quando parar para pensar, apesar de saber de antemão de que prosseguirei na ignorância e na sede de resposta daqueles que há mil, dois mil, dez mil anos a procuravam.
Há ainda uma dúvida que me fica: é se essa coisa do «espectáculo da vida» se desenrola da banda de cá, sendo nós os actores, ou o seu desempenho é da misteriosa banda de lá.
E por aqui me fico nesta viagem dos homens, que há-de ser uma incógnita até aos fins dos tempos se esse fim acontecer.

Antonius
 
Insondável Caminhada

QUANDO O FRIO VEM DE DENTRO

 
QUANDO O FRIO VEM DE DENTRO

O tempo está frio e o céu de chumbo. Só no Poente uma franja longa e esguia deixa espreitar o vermelhão do Sol que vai já longe no Atlântico. É a noite a entrar tarde dentro, que é Inverno.
Em casa não está ninguém. Está gélida como o tempo que faz.
Abandono-me no sofá, frente à televisão que desisto de ligar.
Embrulho-me no robe e decido-me a encarar de frente toda a verdade que impregna o frio que nesta hora me enche a casa, numa estranha necessidade de agarrar em toda a sua crueza a solidão que me cerca – também ela gelada.
O robe bem cingido ao corpo para esconjurar o frio, disponho-me a dialogar com ela – a solidão.
O olhar poisa aqui e além. Neste móvel em que o gosto dela foi decisivo, naquele bibelot que materializa a gratidão dum aluno, naquela pequena foto que marca um instante precioso de uma Era que já não “é”, que passou devorada por esse Tempo implacável, que por nada nem ninguém tem contemplação.
Os olhos, sinto-os húmidos. Mas as lágrimas jorram mais no coração.
Deixo que eles se me fechem como que para melhor me embrenhar no mundo do meu drama pessoal, mas em que há uma réstia de estranho fascínio, como que a avalizar o sentido das coisas, a possível razão de ser do próprio sofrimento.
Talvez embalado nessa etérea franja de “claridade”, adormeço, e por cinco longos minutos a minha mente voga por acalentadores e reconfortantes mundos.
Acordo com a alma mais quente, parece mesmo que está menos frio e, num repelão, tiro o robe e apresto-me para o mundo. Neste instante preciso de me misturar na multidão.

Antonius
 
QUANDO O FRIO VEM DE DENTRO

No estertor de uma sociedade

 
No estertor de uma sociedade

Decorridos quase quarenta anos sobre a denominada revolução dos cravos, conclui-se por um lapso de tempo que se aproxima a passos de gazela do tempo de vida do famigerado estado novo. É que ninguém segura o tempo e se o tempo do estado novo foi uma eternidade, igual eternidade decorreu desde a dita revolução, de que se não vê terem emergido resultados que honrem com significativa energia a caminhada deste pais para a modernidade.
Considerando apesar de tudo que a mudança se impunha e que algo de positivo resultou, são tantas as cicatrizes e as equimoses ainda em carne viva vividas pelo nosso povo, que se não nota neste um convincente entoar de loas à governança (sucessivas governanças), que tem conduzido este país. Tem sido flagrante a falta de senso, de previsão de situações, por reconhecimento da nossa efectiva pequenez (já lá vai o tempo do império) a mais que visível ausência de condições para a ostentação de um nível de vida acima das nossas posses, escandalosamente estimulado por Instituições nisso interessadas e com a complacência de plêiades governantes sempre incapazes de verem à distancia. Penso que o facto de sermos um país pequeno não teria nem tem que nos forçar a uma atitude de continua subserviência perante os maiores. O tempo do poder dos grandes está a ser ultrapassado, pelo que não temos que abdicar das nossas responsabilidades num mundo novo e forçosamente mais justo que ao longe se anuncia em que os pequenos terão respeitável lugar, e em que temos que acreditar.
Quero terminar sublinhando que quero acreditar que caminhemos para uma sociedade em que o dinheiro terá apenas a importância que tem e não a inflacionada pelos humanos abutres que ainda enxameiam as sociedades. Estou a pensar na corrupção a todos os níveis e nos ordenados escandalosos que por aí se pagam, quer em Empresas publicas quer privadas. Sim terá que haver forma de estabelecer tectos, de acabar com escândalo. É urgente inventar formas de neutralizar esse tipo de abutres que desempenham funções de responsabilidade muitas vezes em áreas para que não têm competência. Sim acredito que sociedade venha em que o dinheiro não seja endeusado, como tem vindo a ser no sórdido espectáculo a que há muito temos vindo a assistir. Sim, porque ele (o espectáculo)não é só de agora.

Antonius
 
No estertor de uma sociedade

INESPERADA VISITA

 
INESPERADA VISITA

Se bem penso, nem só para o amor, o eufórico, o lúdico, o humorístico, o sensual mais ou menos ousado, existe este site. Também nele há ou deve haver lugar, assim julgo para a alusão – já que de canto não é fácil nele honra-lo – para o profundamente sofrido, já que a dor é inerente à humana condição. Por isso que ninguém se escandalize por uma curta viagem pelo patético da vida.
O tema que nesta hora acorda em mim mexe com o mais profundo da raiz humana, rasgando em lúgubre transversal toda a sua natureza, enraizando no corpo e volatilizando-se no espírito. È patético - repetimo-lo - o tema, mas ao mesmo tempo arrebatador, na medida em que interfere, integral, nas profundas do nosso ser. Há um certo pudor, não sei bem se medo, um certo respeito – não sei se é o termo correcto - por o leitor. Mas uma réstia de coragem ou ousadia, ou despudor, desafia-me a abrir e com determinação a porta e a entrar com desassombro na matéria que hoje – não sei se por estar um dia de acentuada intempérie me sinto desafiado a abordar.
Sem me considerar poeta, ouso defender que considero o assunto rotundamente susceptível de ser tocado, porventura cantado.
Era um imenso e aparente relvado com árvores que até davam fruto, de premeio. Ao centro uma pequena colina da qual se dominava o verde prado. Fomos para ali conduzidos num anúncio de surpresa da guia do grupo já que identificar a visita poderia ser desestimulador para alguns. Uma vez postados na colina, espraiado o olhar pela distância como quem busca apetitosa novidade, os nossos olhos vão-se aproximando das imediações da colina e é então que se apercebem da natureza do lugar. Aqui e além, mas como por inusitada magia cada vez mais próximas, uma e outra e depois outra e, afinal, um sem fim de cruzes a salpicarem o relvado. Aqui, além e mais além, uma simples flor. Está desfeito o mistério. É um cemitério, não à maneira dos nossos.
Ali tudo era simples, igual, não havia distinção de classes. Os que ali repousavam tinham a mesma idade, mais ano menos ano (dezanove a vinte e um anos) e para ali foram levados numa mesma época, a da brutal segunda grande guerra. Eram militares alemães os que ali jaziam, aqueles cujos corpos jovens foram entregues há cerca de sessenta anos às leis implacáveis da terra-mãe. Sim por estranho que possa parecer e explicação não nos foi dada e também não a descortino, eram militares alemães. Isto em terras da Normandia, terras da nação Francesa, naturais inimigos da nação Alemã. Perpassou por mim e decerto por outros, um acolhedor sentir, quase ternurento. Surpreendeu-me que fosse dada aquela dignidade a jovens militares da grande nação inimiga. Não tive lágrimas. Estas imaginei-as nos olhos daqueles que foram pais desta juventude brutalmente sacrificada na flor da idade. Neste instante escutei distante – tive essa ilusão, eu sei – uma melodia que me é profundamente cara e que me toca a alma em determinados momentos. É uma canção de Marléne Dietrich que de algum modo canta a tragédia desta guerra e lhe é contemporânea. Então os meus olhos, eles mesmos vertem lágrimas que me fazem sentir no mais esconso da alma que existe uma resposta para este drama. Os sentimentos que remanesceram em mim remeteram-me durante algum tempo a um silêncio que me fez viajar por um inexplicável mundo caldeado na dor, na violência desfeita em humanidade, numa estranha paz interior, na saudade.

Antonius
 
INESPERADA VISITA