Poemas, frases e mensagens de VeraCarvalho

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de VeraCarvalho

Falta-me a essência

 
Falta-me a essência

não vês que sou apenas pó
por entre o cerco dos teus dedos
e que devagarinho vou caindo
na areia que te cobre os pés

não vês que sou apenas gota
num oceano imenso de encanto
e que vou evaporando
junto ao ar que expulsas

não vês que sou apenas tinta branca
nessa paleta que guardas incompleta
e que vou pingando
sobre as tuas mãos

não vês que me faltas tu

para me tornar colina em corpo de mulher
mar de emoções transbordante
que explode em sentimento rubro por ti

não vês que és essência em mim

Vera Carvalho
 
Falta-me a essência

Hoje acordei no verde musgo dos teus olhos

 
Hoje acordei no verde musgo dos teus olhos

estendida sobre brancas flores
acariciada pelo vento que adormece as ervas

beijo-te os lábios de morango silvestre
e deixo que o suco ácido adoce em teu corpo
bebo-te como água que rebenta da nascente
fresca, intensa, límpida
e deixo que as mãos espalhem em meu rosto,
gotas de carícias, de beijos orvalhados

estendida sobre brancas flores
acariciada pelo vento que adormece as ervas

revolvo-me nas encostas do teu ser
e caio perdida de braços abertos,
de sorriso aceso ao sol que te contorna os lábios
e ao vento somos pétalas,
leves sombras que se unem num abraço
e difundem o perfume das margaridas

Vera Carvalho
 
Hoje acordei no verde musgo dos teus olhos

Aborto

 
Arranco os pedaços de versos
que guardo no ventre
e choro a dor lacerante que
me adelgaça a cintura.

Não queria abandoná-los
assim,
ensanguentados,
serenos,
miseráveis,
apaixonados, ainda!

Não queria largá-los
à podridão do tempo
mas o vento que outrora
me desfolhava e os versos levava
fugiu de mim.

Não arrasto sozinha o peso das palavras
que te dedico.
Não amo o suficiente a solidão
das noites em que me sinto pontapeada.
Não suporto mais a veemência
ilusória dos dias partilhados.

Arranco os pedaços de versos
e deito-me no leito
da minha crueldade,
à espera que isso me fortaleça.

Vera Carvalho
 
Aborto

Peleja

 
Entre o que sei e o que não digo
ponteiam súbitos de serenidade.
Entre o que não sei e o que digo
cravam-se abismos de vaidade.
Fico-me pelo pudor do silêncio
que sufoca a peleja acesa
de bocas soberbas.

Vera Carvalho
 
Peleja

Delicadamente broto...

 
absorvo cada sussurro teu
com palpitações trémulas
que me aproximam à boca
o coração

com a suavidade dos lábios
teço linhas
entrelaçadas
em beijos

doces sobejos
fogem da razão
e espalham na alvorada
a brandura da tua mão

delícias
doces
delícias

librinam a flor
que brota em meu seio
e se abre ao alcance de um veio
onde possa enraizar

o amor

Vera Carvalho
 
Delicadamente broto...

Escrevo - Experimento

 
Numa tentativa de contornar as palavras da voz
escurece-me a tinta
que goteja da pena,
é negra,
oculta-me o entendimento.
Castigo a minha ambição,
aprimoro o traço,
ardo de ânsia
mas a gota continua a pingar e
é negra!
Derrubo-me infrene sobre o papel
e esmago as palavras.
Sou ruína sem entender
o que queria
ter dito.

Vera Carvalho
 
Escrevo - Experimento

Fala-me de ti

 
Fala-me de ti

Hoje não adormeças

deixa-me sentar diante de ti
olhar-te o rosto como quem figura uma admirável película
tactear-te a pele em descompasso
e ouvir-te a respiração como uma sussurrada melodia

Hoje sou suspiro, sou leito, sou baía

Fala-me de ti

Fala-me de ti como quem implora uma súplica
como quem grita uma mudança
como quem chora uma dor
como quem lastima uma mágoa

Fala-me de ti como quem canta o dia
como quem rejubila o vento
como quem abraça o tempo
como quem sacia a paixão

Hoje fala-me de ti
e ficarei perdida na janela do teu mundo

Vera Carvalho
 
Fala-me de ti

Foi-se embora o dia...

 
Foi-se embora o dia...
 
Os dias são escuros, as noites cruéis
chovem lágrimas de luto
que encharcam os meus olhos enterrados no chão
e me maltrata a alma com a sádica recordação

Porque foi embora o dia de sorriso vadio, as horas indolentes?
Sozinho, magoado, sem despedida

Vence a dor, a revolta,
a minha fraqueza lampeja em luz negra
que aferra com estigmas adornados de saudade
Condeno a mão que o levou e o doou à liberdade

Porque foi embora o dia de sorriso vadio?

Vera Carvalho
 
Foi-se embora o dia...

Sentes como te sinto num poema?

 
Percorre-me o suor do teu corpo
nas mãos ansiosas d’escrita
e esborratam esta folha limpa
em palavras d’amor
que escorrem da minha boca.

Como te sinto os beijos!

Desejos
provocam-me as palavras,
obscenas cenas
se espalham num grito
que me arfa o peito.

Desenhadas em movimentos rangidos
por vontade voraz de te sentir os gemidos,
a tinta da cor do que sinto
pinga das pétalas que permanecem
esquecidas nas minhas mãos
que agora pinto.

Vera Carvalho
 
Sentes como te sinto num poema?

Sem - amor

 
Sem – Amor

no túrbido das minhas pupilas
o eco de um lamento me hipnotiza
vem de longe e não sei porque está em mim

tange-me os contornos da boca e abre-a num grito mudo
com um sopro frio persegue-me o sangue
e gela-me os extremos do corpo

a dor sente-se mas não se vê, não se ouve

comprimida pelo ruído que dilata em mim
vou encolhendo na grandeza da dor
coração sem - amor

pobre, escondido por um manto sombrio
trai a noite e deixa-se levar pela aragem fria
que varre as estrelas, sem perdão, sem gratidão

cai no vazio

Vera Carvalho
 
Sem - amor

Insânia

 
Talvez eu não possa amar-te

talvez a insanidade dos meus sentidos revogue
a serenidade de um poema ladeado de lírios e organzas
e me acerba esta vontade de te rasgar a pele
e colar-me a ti

talvez a sede de mulher sugue
as palavras doces da tua boca
e me atice esta vontade de te trincar os lábios
e beber-te o sangue

talvez o despropósito do meu ser arranque
as raízes dos teus braços
e me enlouqueça esta vontade de te roubar ao mundo
e fundir-te em mim

talvez eu não possa amar-te
com a lógica da razão

amarra-me então o corpo
mas liberta-me deste coração

para que eu não possa
amar-te

Vera Carvalho
 
Insânia

Espectro de consciência

 
Pega-me ao de leve no corpo entardecido do sol,
despe-me do laranja e do vermelho
e entorna-te sobre mim,
monocromático.
Sorve, voraz,
os alaridos da minha alma
e guarda-os em teus lábios
em penitência perene.
Apaga esse padrão repetido que me veste de dia
e desenha-me de novo, com traços convexos,
conexos ao desalinho
do tempo.
Figura-me nua
de sentimentos,
subtil
de entendimentos,
e preenche-me com a alvura inocente das gaivotas.
Sopra-me ao vento
e ganharei asas circundantes na altivez do céu,
espectro índigo que desce na bruma branca
das manhãs de Inverno.

Vera Carvalho
 
Espectro de consciência

Diz-me...

 
Diz-me…
como da chuva que se cola ao calor da pele
e adivinha na noite a frescura da alvorada

Diz-me…
no bulício do ar que se forma em nós
enquanto a lua guarda segredo

Diz-me com lânguidos sussurros
que a noite me espera
que o mar atraca nos suspiros largados na areia
e tu és água

e somos infusão

girando no gorgolejo das ondas

Diz-me
se é este vento que funde em gotas de brisa
o teu cheiro
e me solta este vício lúbrico em maré vermelha

Diz-me
que a noite me espera…

Vera Carvalho
 
Diz-me...

Sonho alentejano

 
Sonho alentejano

Lembras-me
o cicio de vento que percorre
o trigal dourado.

Brando,

acompanhas o trinado fluido do rouxinol
que anuncia o entardecer
e convidas-me a dançar, por entre
o azul que se dispersa
e a luz de sol poente.

Numa singeleza descalça,
assemelho-me
à loira espiga,
ondulando ao vento
danço
envolvida na expressão de sentimentos
das palavras radiadas.

Contornas-me um sorriso no rosto e
espalhas num beijo
uma ternura de mel.
Doce embalar que me recolhe em sonho.

Vera Carvalho
 
Sonho alentejano

Amor (-) perfeito

 
se em cada palavra de amor
florisse uma flor
em minha boca
eu te oferecia um ramo de acácias

seriam amarelas
especulando o sol de todos os dias

se em cada palavra de amor
eu te tomasse o mel dos lábios
e te estendesse
na suavidade do meu colo

seria doce cada memória
aspirando o enlevo dos beijos

se em cada palavra de amor
eu unisse ecos dos nossos sussurros
os espalharia ao vento
sedentos por unirem o mundo

teria criado a perfeição

Vera Carvalho
 
Amor (-) perfeito

As lágrimas que me secam

 
Correm lágrimas desalinhadas
em meu rosto
quando, à minha direita,
vejo o vazio rebatido de tenras ervas.
Eu continuo lá
absorvida pelo rio
mas largada na margem
[amiserada pela tua ausência].

Intimida-se o vento
que ao passar por mim se esconde
no mesófilo da folha.
Murmuram os estomas
prantos que choram em uníssono
e cada gota
pesa sobre o sol .

Apaga-se o fervor
dos beijos em meus lábios,
descora-se a alma,
tranca-se a vida.

Escorre a saudade em lama
neste rio,
manchando de negro as bordas do corpo
que racham
em estilhaços
ao passar do tempo.

Sangram memórias
no reflexo da imagem
que escondes do céu
e entorno-as novamente sobre ti
[na esperança que algo de mim sobreviva].

Vera Carvalho
 
As lágrimas que me secam

Sede

 
A língua atrai e retrai-se
aos conjuros da sede.

Ah!!! Pecado foi beber-te
e não caberes dentro de mim!

Vera Carvalho
 
Sede

Querer mais que vontade

 
É olhando a linha que nos separa
que a vontade sedenta morde o teu vulto
sou víbora airada, alucinada pelo teu odor

trespasso, invado e domino-te os contornos
do teu colo avançam os dedos fingindo delicadeza
lentos e atilados acautelam-me os sentidos
serás presa dócil, submissa desfrutando da iguaria

acorrentado o teu corpo oscila
em júbilo do ardor da mordida acérrima
num sopro gemido contestas a tua oportunidade
falhada, proibida.
Sou víbora airada, sem vénia, sem permissão, sem restrição

Vera Carvalho
 
Querer mais que vontade

Será tua esta praia?

 
Serão tuas as lágrimas
que o mar expulsa e me devolve ao rosto?

Será teu o lamento do marejar das ondas
que me cinge os lábios ao sabor salgado?

Será teu o calor dos penedos macios
que me repousam o corpo?

Será tua a memória espelhada na bruma
que me turva e me comove a alma?

Serás tu que roubas meu nome d’areia
e me unes a ti (terra ao mar )?

Ou

Serás tu o barco, o enigma, o corsário
que me lança ao mar e se afunda em mim?

Vera Carvalho
 
Será tua esta praia?

Partida

 
há uma visão repetida
retida
na concavidade da minha retina
e há lágrimas que se juntam
à neblina da manhã

há o pulsar trémulo nos dedos da mão
e um bramido contido
que acelera a baqueta do coração

há a verdade gélida
nua
acinética
e a tua partida entornada no vinho
que verte de minha boca
ainda
céptica

há um ímpeto amargo
e um rasgo incisivo na maciez da seda
que me perfura o ouvido
e me faz cair
pena

fica a vontade de partir
contigo

Vera Carvalho
 
Partida

Vera Carvalho