Que caiam as tormentas e todas as chuvas 
dos infernos benquistos.
E que o Mostrengo bata três vezes, três
vezes bata na minha porta, 
para que eu o possa receber, como num rito,
com todos os luxos a que tem direito.
Que me sobre o espanto, para acolher
todos os fantasmas desavindos, dos que
se fizeram ao mar em busca de novas terras
e que seus gritos de defuntos entrem
por minhas entranhas adentro, 
passeando-se no espelho oblíquo ou nas trevas
dos meus olhos, em horizontes de linhas
paralelas. Paralelepípedos cegam-me 
instantaneamente e 
estátuas, com olhos vazios de mosca, 
honram os desaparecidos no mar, pelo meio 
da fome e do escorbuto, da perda de razão
e das chagas que se alimentam de seus frágeis
corpos, amarrados a mastros para não
caírem na tentação do Mostrengo.
E que continuem a cair as tormentas e se
abra a boca do Mostrengo, que três, três vezes
bateu nos umbrais de minha janela, pois 
todos sabemo-lo bem, que na facilidade não
veio nunca distinção, aos homens de vista curta.
Porque tu és Portugal senhor dos caminhos 
marítimos e dos grandes Mestres, que 
trouxeram fortuna ao nosso país lutando 
contra todas as intempéries e feitiços 
de uma vida dura,
desbravando águas até então desconhecidas.
Jorge Humberto
02/10/09