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CARTA DE UM LOUCO (8) - A Pantera

 
Querida,

Um dia, e isso já faz tempo, eu ainda era garoto, vi numa pequena jaula de um circo, uma pantera negra. Ela caminhava de um canto a outro da jaula, incessantemente, seguindo com matemática exatidão, uma linha invariável e virando, a cada vez, na mesma barra. A cada virada, seus pelos negros possuíam estranhos reflexos dourados.

Sua jaula era colocada à frente da entrada do circo; para chamar a atenção do público. Desde manhã até a noite, uma multidão se apinhava diante da jaula; gritavam, resmungavam, mas a pantera em sua patética caminhada, com o focinho abaixado, olhava direto diante de si, sem nunca voltar-se a multidão. Alguns espectadores sorriam, mas a maior parte, como eu, olhava sério, quase triste, aquela imagem viva de um infinito desespero.

Aquela imagem ficou gravada para sempre em minha memória. Sempre que algo não ia bem à minha vida, eu me lembrava da pantera; o que poderia ser pior do que a vida daquele magnífico animal, encarcerado para sempre em uma jaula pouco maior que o tamanho dele?!

Hoje eu acho que aquela visão me marcou, porque havia algo de comum entre o meu destino e o da infeliz pantera. Pois, agora em minha jaula de tijolos, eu também me tornei igual a ela.

Todos aqui são panteras enjauladas. Dia após dia, caminham de um canto a outro do corredor, seguindo sempre uma única direção, sem se importar com o que se passa a sua volta.

Minto!... Nem todos são panteras enjauladas. Há aqueles que abandonados pelos que o colocaram aqui, sozinhos, a mercê do destino, perderam qualquer esperança de dias melhores. Deixaram de caminhar e permanecem sentados, enfileirados, imóveis, mudos, sem um gesto, sepultados até os ombros nos sofás, poltronas e cadeiras do salão; como se todos fossem sombras do nada! Nada do nada!

Eu também caminho. Caminho e penso: “Enquanto você existir em minha vida, vou continuar caminhando de um canto a outro do corredor; não vou me sentar, porque você é a esperança, a minha esperança”.

Do sempre seu Maluco Beleza.
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Agradeço a leitura e, antecipadamente, qualquer comentário.
Se você encontrar erros (inclusive de português), por favor, me informe.


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Enviado por Tópico
Tânia Mara Camargo
Publicado: 02/02/2008 16:20  Atualizado: 02/02/2008 16:20
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Usuário desde: 11/09/2007
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 Re: CARTA DE UM LOUCO (8) - A Pantera
Se você leu o último recado que deixei, entenderá
o que escrevi em Balada da loucura. Algo temos
em comum, estou gostando demais do maluco beleza!

Enviado por Tópico
Tânia Mara Camargo
Publicado: 02/02/2008 16:24  Atualizado: 02/02/2008 16:24
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Usuário desde: 11/09/2007
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 Re: CARTA DE UM LOUCO (8) - A Pantera
Fui buscá-la:

BALADA DA LOUCURA

Martírio horas estúpidas, obscuras
Os deuses declinam com dignidade
O pássaro rompe a noite escura
Asas negras a desafiar a verdade

Paira na escuridão lembranças do viver
Estou encolhida, de olhos vendados
A realidade insiste em sobreviver
Os sonhos que tive estão enterrados

Até quando irão me esconder?
Não sou daltônica nem alma penada
Condenada a um eterno sofrer
A vagar sem rumo, desesperada

Nesta caverna pestilenta não há luz
Nem resquícios de humanidade
Nada que ao meu imo seduz
Apenas o dissabor, a crueldade

Minha mente perturbada grita
Caso que nem mesmo Freud explica.
Insanidade encarcerada,
O cérebro a tal massa cinzenta
Que se ausenta e lamenta,
Pois me roubaram a oportunidade
De SER FELIZ!