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CANÇÃO DO COVEIRO

 
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CANÇÃO DO COVEIRO

Cava, escava, cava a cova!
Sua, pena, sangra, lida...
Diz ao morto em despedida:
-- "Eis tua morada nova!
A última de tua vida."

Repete ele um canto antigo
(Elegíaco, em verdade...)
Pela funda cavidade:
-- "Eis tua morada, amigo,
Para toda a eternidade!"

Se incerta a vida futura
D'alma que partira enfim,
Ao corpo ele diz assim:
-- "Eis tua morada escura
Onde t'encontras um fim!

Mais arruma enquanto canta...
Mais amarra seu pé junto...
Sem olhar para o defunto:
-- "Eis tua morada santa,
Onde o silêncio é assunto!"

Fechando a tampa sem dó,
Bate os pregos do caixão
E sussurra-lhe a canção:
-- "Eis tua morada só,
A sete palmos do chão...

Desce o esquife até o fundo
Feito semente plantada
À derradeira mirada:
-- "Eis tua morada-mundo,
Tu que vais do nada ao nada!

Cobre, espalha, lança, enterra...
Fecha a cova para os vivos,
Que já se afastam altivos:
-- "Eis tua morada-terra
D'onde voltam redivivos."

Pondo o nome do sujeito,
Resta ele apenas, funéreo,
A cantar no cemitério:
-- "Eis tua morada e leito
Onde dormes duro e sério!"

Canta ainda ao falecido
Na lápide ao lhe escrever
Latino epitáfio a ler:
-- "Eis tua morada ao Olvido,
Onde tu deixas de ser..."

Canta o coveiro a canção
Que na morte faz igual
A todo humano e mortal:
-- "Eis tua morada, irmão,
Até o Juízo Final!

E ao fim da canção coveira
Quando o silêncio se faz
Encerra àquele que jaz:
-- "Eis tua morada inteira
Onde descansas em paz!"

Belo Horizonte - 02 11 2018


Ubi caritas est vera
Deus ibi est.


 
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RicardoC
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