Poemas : 

regresso a casa

 
não havia novidade na surdez da casa vazia
embora pairassem calados os passos gastos de fantasmas domésticos

sentava-me a ler uma revista e não era só eu
alguém folheava na minha vez as páginas amarelecidas que tentava decifrar

vozes antigas de músicas entoadas por violinos desafinados

família, legado, espectros

cromos gastos na caderneta da casa

incompleta de mim

aguardando como se me atrasasse para jantar
de prato voltado para baixo sobre a refeição morna

aguardando na certeza de me sentar à mesa

embora gritasse de terror para que não

não me sentassem à mesa
me largassem
me deixassem ir embora que viera só de visita

 
Autor
gillesdeferre
 
Texto
Data
Leituras
96
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
4 pontos
2
1
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
Beatrix
Publicado: 14/03/2025 08:34  Atualizado: 14/03/2025 08:34
Da casa!
Usuário desde: 23/05/2024
Localidade:
Mensagens: 457
 Re: regresso a casa/gillesdeferre
.
Olá, Gilles.

Tu e o beijadordeflores andam com inspirações similares, embora os resultados sejam completamente díspares do ponto de vista da forma.

Este teu poema é fabuloso. Colocas um twist no final que torna o que lemos anteriormente ainda mais forte. Na casa vazia... a refeição morna... os papéis amarelecidos... vozes antigas... uma casa incompleta de mim. A vontade de ir embora e nunca mais voltar. De não ter estado ali. De não ter sido dali.
Fabuloso.

Fantasmas de outrora voltam sempre para nos assombrar.

Ab
Beatrix