Karl Popper
Não contemples o horizonte
Esquece esse poeta antigo
Que vive nostálgico do infinito:
Não suporta a indecisão do finito.
Antes, a cada passo
olha a teu lado
Estende a mão
Agarra uma folha e oferece o aroma
Num ínfimo gesto
O infinito estremece
Porque só assim
És inteiro.
sai.
O motor da minha vontade:
cilindrada incalculável.
Sai. só quero que saias. A minha única funcionalidade
é ser pura velocidade
é nas veias que me corre o combustível
e esta boca metálica vocifera
uma voragem de combustão
O único medo é a demora
e o risco não é o preço da vertigem:
é o sal.
é o único sustento
de uma alma que se alimenta
que se sacia
da própria fome.
Ser
Esta maçã nasceu
No instante preciso
Que o meu olhar a cruzou
O vermelho é a memória de Adão
E o sabor o saber da terra sem tempo
Tudo o que é mundo nasce no seio
do mito. A ficção infinita,
é a nossa única morada
O homem civilizado
O homem dito civilizado vive como um bárbaro na civilização. Faz uso das coisas quotidianas que formam a sua vida - do telemóvel à internet, do automóvel ao ar condicionado - sem as quais não saberia viver e se sentiria complemente perdido, como se essas coisas fossem dadas naturalmente.
O homem civilizado não entende os princípios da civilização, não sabe o mínimo sobre a sabedoria envolvida, sobre a genialidade e imponência criativa que lhe subjaz. Um selvagem pega na banana e come-a, sem se perguntar como é possível tal fruto. O homem civilizado faz o mesmo quando pega no telemóvel: como se fosse uma dádiva da natureza à qual tem um direito também natural.
O homem civilizado carrega nos botões para aceder a tudo o que foi concebido na sua vez e desse sentimento de poder chega a confundir “entender” com “manejar”. Porque entender genuinamente está tão fora dos seus intentos que nem a própria palavra entende.
Música vertigem
A música como
uma vertigem encantada
em acelaração contínua
para o êxtase sucessivamente adiado
uma imagem-som-imagem
segue-se inexorável a outra
imagem-som-imagem
com uma ambivalência perfeita:
quero no exacto momento que cedo
e cedo no exacto momento que quero
inexorabilidade impiedosa
que alucinada torna vertigem
o vórtice que invade
e arrasta a vontade num voo livre
ao encontro do sol cujo fogo
tudo consume.
Absolutamente tudo.
Volúpia
O teu reboliço
Não nasce da sombra nem do sol
Se cria no puro girar estratosférico
Do inconformismo das estrelas
Um rebuliço donde não nasce uma tulipa
Nasce uma rosa vermelha rodopiando
E todo o teu corpo é uma pétala garrida
Que ampara as sombras fugidias que me formam.
Contudo
Loucura com loucura se paga
Uma volúpia louca
Poesia alienada
Uma chama molhada
Que acende no centro de ti
Verticalizando o meu desejo
Num ímpeto homérico
Penetrando completo o teu ser
Até tudo ser alucinação
Projectada no puro espaço