Vejo o gato
Vejo o gato
esgueirando na relva
para surpreender o pássaro.
Olhos brilhantes
- dois diamantes
a agilidade do tigre,
a graça da gazela.
Um salto
do alto
da janela
de costas
caiu
derrubou
no chão
o vaso
de porcelana.
Abrindo asas o pássaro voou,
deixando-me rindo
do absurdo salto,
vendo ao largo
o felino contrito,
silenciosamente frustrado,
rosnando mansinho
por não comer o passarinho.
Reflexo na vitrine
Hoje no shopping
vi seu reflexo numa vitrine
da loja de sapatos femininos,
ao lado de uma flor,
anunciando uma liquidação.
Tão suave me parecia,
que pensei sem real o que via.
Esqueceram-me os desvelos,
pensei na flor em seus cabelos,
idealizei venturas - presunção,
como antes da separação.
Mesmo quando vi que me viu,
- passou ao largo e não sorriu,
consegui me manter firme,
mas o entusiasmo derreteu em mim,
como sorvete do Mc Donalds
salpicado de castanhas de caju e amendoim.
Suba as escadas até as portas do céu
Poema inspirado nos brados iniciais da “haka”
Suba as escadas que a morte já vem,
faça uma opção pela vida se desejar.
Suba... até encontrar as portas do céu,
mas não se detenha nesse limiar,
suba... suba, vá muito mais além.
Suba as escadas até as portas do céu
do cume do mundo verá o sol brilhar...
Trecho citado original em dialeto maori e uma tradução livre da wikipédia:
“ Ka mate, ka mate
Ka ora
Upane...Upane
Upane... Kaupane"
Whiti te rā,!”
Tradução livre
“ É a morte, é a morte!
Eu vivo!
Suba a escada, suba a escada
Suba até o topo
O sol brilha!”
A "haka" é uma dança executada pelos guerreiros maoris da Nova Zelândia antes de uma batalha ou outras ocasiões importantes.
O humor do céu
O humor do céu
correndo
em paralelo com o tempo ,
era lido
nos relógios de sol.
Místico espaço
contemplativo
do presente
mítico,
e passado sublime
à espera do futuro.
Mas as ampulhetas
viraram celulares,
não há mais areia azul.
São bytes que caem,
enquanto a vida se perde
transcendente, atemporal
em longa espera
formatando um HD.
só era diferente do que podiam ver
Já amei quem não me queria,
deixando a quem me amava.
Muito errei e não fui perdoado,
perdoando o que se fez errado.
Jamais encontrei o que procurava,
quis o que não devia ser encontrado,
disse aos ventos que eram absolutas
muitas das verdades que questionava.
Não sabia que poderia ser tão frágil,
nem todos quiseram me conhecer,
nem todos eles ali poderiam saber,
mas eu não era melhor, nem pior,
só era diferente do que podiam ver.
Olhando seu decote
Lanço olhos de fornalha,
quais chicotes na batalha.
Já contorno o destaque
a procura do arremate
do reduto lateral,
que do dote só detalha
a migalha parcial.
Fecha a cara, muda o tom,
se defende
com o rímel e batom,
mas normal e cordial,
esconde as armas
na trincheira natural
do decote sensual,
Não me abate o achaque,
armo o bote contra lote
protegido por muralhas;
aos ataques do olhar
que acuro e esbugalha
rebate duro, é fornalha
que usa o truque
do semblante glacial,
e o potencial de todo o arsenal.
É letal, mas eu juro,não censuro.
cometa impudente
Acabrunhadas,
tímidas estrelinhas
- num canto de céu,
coram envergonhadas,
ante a lúbrica visão
da cauda em chamas
de um cometa impudente.
o ciclope corrupto
Diziam que era austero o ciclope,
exímio acrobata e filantropo,
impudico residente em Madagascar.
Corrupto, bateu recorde,
apondo rubricas pérfidas
nos projeteis inúteis,
sem caracteres válidos,
porém profícuo
em proveito próprio.
Agora posso te beijar
Agora eu posso finalmente
te dar um abraço.
Agora sei que livremente
posso te beijar,
fazer a mais efusiva saudação
Não vais me repudiar,
tenho certeza que não,
agora que vês a face dos anjos
estendida nesse teu caixão
Maitê, um poema para você...
Era uma russa de corpo escultural,
dizem que trabalhou para a KGB,
decifrando o algoritmo infinitesimal,
fotografando rostos para um dossiê.
Teve tanto êxito entrosada no metiê,
quando foi transferida para a Turquia,
pena que se aposentou antes dos trinta
mesmo se queixando da vida sucinta,
que poderia ser quase tudo, menos vazia.
Diziam que usava óculos e cueca colorida,
de tanto ódio jamais aprendeu fazer crochê,
procurava um amor ideal para encher a vida,
mas era uma espiã e seu nome era Maitê.
Onde estaria o homem perfeito, seria você
o herói da espiã russa teria que ter valor;
sequer poderia roncar assistindo TV,
mais que tudo deveria ser um bom atirador.
Num stand improvisado no fundo do quintal
a espiã atirava em latas de caviar,
treinava para lidar com o marido ideal,
gemendo ao ouvir cada estampido soar
Juntos e alegras tomariam o café da manhã,
as granadas guardariam debaixo dos lençóis;
depois do jantar, o tremor de febre terçã,
mas as ferraduras ficariam nos urinóis.
A morada comum seria uma bela mansão,
também poderiam trabalhar com matemática,
dos arredores de Moscou teriam bela visão,
compilando juntinhos expressões idiomáticas.
O final da historia que foi meio sombrio,
não houve heróis para contarem o final,
depois de apagar com os dentes um pavio,
evitou varias vezes uma guerra mundial.
Livrou de explosivos o casco do navio a pique,
pisou numa mina terrestre em Moçambique.