Ressuscitar-te
RESSUSCITAR-TE
Chamo pelo silêncio,
Silêncio dos ventos.
(Faz silêncio minha dor)
Silêncio de todas as cores.
Chamo pelo silêncio do mar.
(Faz silêncio minha voz)
Silêncio, fez-se em minha alma,
Solo que jaz em mim.
(Faz silêncio minha paixão)
Silêncio te peço que faça, Sol...
A noite nela se deitou.
(Urge que deites em minhas mãos
do fogo de tuas chamas)
Silêncio te peço, Lua,
E de todos os corpos do céu.
Mas deita em minhas mãos
da tez de tua luz)
Silêncio, peço ao silêncio!
E a todas as conchas do mar...
(Mas deita em minhas mãos
todo som dos maremotos)
Silêncio de versos, poeta,
E de todo fervor de tu’alma...
Mas retendes, em tuas mãos, sopros-poesia.
Soem agora em uníssono,
Do todo deitado retido contigo:
Liberte de alma o espírito em paixão!
Soem... Soem... Soem...
Timbales, fagotes, cellos...
Sopre teu Sopro naquela que jaz...
Soem todos os sons...
Urge o rugir da sinfonia e harmonia...
Liberte do barro todo vermelho-vinho.
Soem... Soem todas as artes!
Faz mister da criação
Tudo que tens será pouco
se pronto não ressuscitar-te...
Valhacouto
Valhacouto
Longe de eu obscurecer nos tugúrios
entre betumes e azorragues.
Afasta a azáfama das asas
— todo deserto é um pio insólito
no labor fátuo de teus vôos.
Alaridos! Becos, vácuos e átrios
Lastro! Vasta semeadura do pó.
Interiores de aços frios e baços
— opacos de meus cantos
ao pranto porcelana dos anjos.
De um alpendre pende o bronze
zoar dos dias lidas fadigas.
Prumo sonoro guia-me
— carismático morcego
mensageiro de meus cantos.
Nas marés esvoaçam tuas azáleas
apregoadas nas escamas.
Olores outrora prometidos
— esmaecidos convés
lírios casquilhos viés andrajos.
Perdem-se nos templos uma pluma
vácuo contido nos silos.
Limbo solene vão da falta
— entoam perenes coristas
regência de minhas odes lástimas.
Decifram-me as garatujas sábias gruas
empedernidas dermes.
Estátuas sacras sargaços
— cantam a fala do rouco
deitam na vala o louco da falha.
Lábios empalhados clamam do vime
ao sustenido chamado.
Sustos decanos enganos
— escusam ouvidos e só
castas legiões inversos portais.
Prelúdio para uma esfera triste
Prelúdio para uma esfera triste
Teu espelho de barro
[tão raro... tão caro
Absorve dos lábios
Pergaminhos vencidos.
tempo dos ícones
instransponíveis sinais.
Absorve uma lágrima
[tão lírio... tão casta
Abasta-se da trama
Falésia carpida na fala.
reflexo das sancas
talhadas gruas vestais.
Inexatas âmbulas de saibro
[tão pias... tão vinhos
Amálgamas inexatos
Dançavam loas na pira.
imagens óbvias
um rosto nódoa e palha.
Ao solo a fenda da sombra
[tão sóbria... tão hóstia
Nas salas entrelinhas
Cruzada trôpega espia.
o dorso ao solo
elegia pousada na linha.
Esparge embargada imagem
[tão nobre... tão presto
Sisal amarra espumas
Prosaicas arcas de gelo.
seiva e argilas
uma esfera triste espera.
Ilusório ardil no barro espelha
[tão peixe... tão lastro
ELES COMEM AZUIS
ELES COMEM AZUIS
Cavaleiros de distantes terras
a viajar por infinitas estradas.
Entradas de estrelas e brilhos
percorrem caminhos tão claros
sempre repletos de fome
(Azuis comem e seguem,
deixando restos de escuros:
sobras de tons acinzentados.
Sim, eles comem azuis.)
Pregam pratas palavras
em púrpuras esperanças,
promessas e abastanças,
abastados fidalgos amantes
transportam na garupa de seus corcéis
elegantes senhoras
(De fomes iguais comem
de fomes a mais
de bela estética compõem-se:
trazem nos alforjes tratados canônicos
de idôneos autores —
e falam da ética com a mesma elegância
com que cuidam a fonética).
Comem azuis
certos de que o mal não lhes entra
o coração repleto de tons.
Falam palavras azuis:
Belos altruístas, performistas,
artistas de refinadas retóricas,
Teóricos clérigos carregam verdades
(E comem azuis...)
Afinados ouvidos em cristais, diapasão,
ouvem atentos ao que lhes sopra o vento...
Atentos... Sempre atentos...
Ouvem e apregoam, proféticos,
o sopro supremo e extremo
da chegança liberdade,
sempre a favor (sem dor ou clamor).
Elegantes, sempre, em seus corcéis
(Sob seus galopes ávidos estão
aqueles que azul não têm.
Sobram-lhes migalhas fartas
daquele escuro deixado caído ou tombado
por descaso ou larga cortesia
das benfazejas senhoras
que, prenhes, estão de azul).
E a terra. Ah! a terra que não se encerra
encharca-se de verde e musgos
e limos e lamas dos restos
e restos de sobras e sombras
gestando no seio, esteio do peito,
da carne que se avermelha em barro.
O lírico alvo (delirante meta)
completa ode como encanto
sem engano ou desencontro.
Sopra vento forte de escuros:
Azul não brilha (prata esfria)
onde luz não há:
Brotará refulgente, urgente,
Vermelhos reflexos iguais.
REMISSIVOS OMISSOS
REMISSIVOS OMISSOS
[a uma prosa burlesca...
Em verdade, nem noite era... apenas os escuros onde as almas deitavam suas sombras ressonantes a meus ouvidos, espargindo ocos amorfos em meus olhos. Ecos em fantasia de minhas cirandas nas danças alecrim (vestia-me das verdes Artemísia debruadas em sianinha verdadeiras).
Mas tu que sabias as entranhas de minhas fomes e das forjas do trigo às formas das pedras; o mais-que-perfeito em tradução de meus ritos inscritos aos umbrais, tinha-me Sulamita. Esfinge fui-te ao absorver-te as miragens... antropofágicos enigmas de minhas ânsias. Dei-te meus delicados lábios de mármore em indecifráveis conflitos, contritos das sendas nas tendas. Dei-te Teu Nome nas pelejas dos pássaros entre os cacos espargidos — coelhos de vidros — mosaicos adornados ao chão nos prumos afagos em lenda das portas.
[Quando sair era inevitável...
Ah! E tantos foram os momentos de minhas atrições nas ofertas dos beijos... Infiel viés das pontes nas insustentáveis noites-vítreas; dei-te visgo nas espumas das falas que nem mesmo sabias.
[E dizia-te mel...
Sedutora, nas danças, convites fiz-te aos indevassáveis lugares de minhas missas nas homilias das dores arcanas. Clamei-te em guias vazias, aos meus labirintos. Teus olhos se me negaram aos escuros, pois teus castanhos, já entronizado nas eras, intentavam a luz.
[E ardia-te archotes...
Meus choros mais castos ofertei-te nas teias; trama das danças nas sombras, entre brumas mescladas ao éter das lágrimas e da cevada. Mas você jamais entendeu... Falei-te da agonia das horas (e foram tantas) de um corpo ancho imiscuído às ranhuras do chão... e das vozes armadas, compadecidas do ato, em auto final. Mas você não atendeu minhas danças.
[Gargalhadas nas piras...
Consagrei-te! Oh, quão incomensurável os mistérios de minha face aos candelabros! Revelei-te minhas lágrimas deitadas em fios das ceras ao destino do chão. Sombras de velas pálidas... cálidas... sempiternas e de mosto sabor. Pasodoble! Banderillera sedutora, convidei-te as minhas arenas. Gitana das marcas, de meus seios ofertei-te cravos... em minhas ancas absorvi-te os lírios.
[Enganos miosótis...
Hoje assino-me máculas, a ferida fendida nas páginas de um livro que não te servi.
[Eleison...
Adágio
ADÁGIO
Pousa em meu peito
Um canto escuro qual gema:
Oculto encanto de um melro.
Fazia-se hora plena nas tardes-jardins.
Um casulo cor das sedas sequiosas,
Envoltórios falam faunas bromélias:
Voa aos passados magésticos
Singulares plurais, imagens, sabores,
Lamentos doces, ocra em sons...
Uma lágrima, eugenia furta-cor.
Sabores, pomares, manjares, ceias
Sobejam... Harpejam-me adágios.
Voa... Voa-me teus escuros,
Macios, suaves, queridos lugares.
Seduza-me vento, asas e sol:
A cor mais bela da dor, fulgor
Colore-me de aves, areias e flores;
Lugares-jades, centeal sempiterno
O tênue do peito acalanta um ninho.
Escura, cintilante gema – raro canto:
Abrigo, encanto oculto... Revogares.
Voa na tarde um melro...
Sanctus
Sanctus
És!
O Nome dentre os nomes
Altares de meus ofertórios
espargido sangue communio
ao corte das hóstias; máculas
de minhas taças, louvam-te
És!
Dentre os homens o Nome
Manto de espadas às noites
páscoa das carnes frementes
lancinante e frio grito conflito
contrito às paredes na arca
És!
Dentre as tendas o Nome
Ceias ao mogno e ao cravo
serve-me de tua fome; tantas
pomo aos silêncios esperantos
honro-te em exauridas ceias
És!
O Nome dos nomes dentre
Templário de meus átrios
sisais limítrofes cercas adros
adorno-te o Nome nas horas
trança hedera em aura loas
És?