O VAGABUNDO
Ausente do mundo
Ausente da vida
Chegou ao fundo
Não tem mais saída
O pobre vagabundo
De cabeça perdida
Vagueia nas ruas
Vagueia nas estradas
Pelas pedras nuas
Daquela calçada
Chegou mais além
Sem saber porquê
Dinheiro não tem
Comida não vê
E a sorte jamais
No chão vai dormir
Envolto em jornais
Num qualquer jardim
A ouvir os pardais
Uma vida perdida
Ausente do mundo
Numa esperança sentida
É assim a vida
De um pobre vagabundo
O NOSSO ALENTEJO
Serras, veredas
Caminhos
E estradas velhas
Ribeiros que pouco correm
Para dar de beber ás ovelhas
Arvores secas a cair
Vinha que já não dá uva
O Inverno está para vir
Com ele virá a chuva
Os ribeiros vão encher
Ovelhas irão beber
E árvores irão florir
E o povo irá sorrir
Quando estiver a chover
E eu espreitando á janela
E através dela o que vejo
Vejo campos a florir
No nosso querido Alentejo
FALEI COM A LUA
A lua falou comigo
Baixinho ao meu coração
Com sua voz de ternura
Palavras meigas e doces
Bem cheias de emoção
Contou-me que estava triste
Que a noite se tornou fria
Porque o poeta de outrora
Debaixo do seu luar
Não mais escreveu poesia
Com carinho respondi
Não fiques triste donzela
O poeta vai voltar
Mas até ele chegar
Tens a companhia das estrelas
E continuei a ouvir
Pela madrugada dentro
Pobre lua que tormento
Que saudades do poeta
Que voltará com o vento
Tornei-lhe a responder
Com a noite a terminar
Querida lua podes crer
O poeta de que falas
Promete que vai voltar
E poesia escrever
Debaixo do teu luar
VIDAS PERDIDAS
A madrugada começou fria e gélida
Pelas ruas são cada vez mais
Aqueles que fazem das estrelas o seu tecto
Sonhos que cabem numa simples mala
Os cobertores que não têm abafar o frio
Estômago vazio tristes lembranças
Alimentam esperanças
Recordando a vida que passaram outrora
Junto da família e amigos
Mas a crise e o desemprego
Trouxeram-nos para a rua
A viver do nada
Onde o nada por vezes é muito
Onde por vezes uma simples palavra de conforto
É superior a uma refeição que é difícil de arranjar
Vidas perdidas
Vidas rejeitadas por uma sociedade que vive
Olhando apenas para si e só para si
Fruto de um egoísmo incompreensível
Fruto de uma vaidade falsa
Num país que já foi nosso
E que agora não é de ninguém
E cá estamos novamente junto deles dos sem abrigo
Com uma sopa quente e uma palavra amiga
Para tentar ultrapassar ou amenizar a solidão a fome e o frio
Até que venha a nascer o sol novamente
A PASSAGEM
Já fui criança
Fui jovem
Brinquei com bolas de trapo
Também já perdi a esperança
Tive a vida num farrapo
Quando jovem
Tive sonhos
Como toda a gente tem
Andei por sítios medonhos
Que não interessam a ninguém
Também fui feliz um dia
Por pouco tempo talvez
A vida não me sorria
Mas hoje
Hoje sou feliz outra vez
Agora já homem feito
Sei o que quero e onde vou
Nos meus sonhos dou um jeito
Mas sei que nada é perfeito
E sou apenas quem sou
O QUE SERÁ DE MIM
Se um dia partires
Que será de mim
Que sentirei eu
Ao ver-me só
Sem ninguém
A quem entregar
O meu amor
Sem ter o teu carinho
Sem sentir os teus
Lábios nos meus
Quando me dizes boa-noite
É impensável deixar de sentir
O teu carinho
As tuas meigas palavras
Quando te peço para tudo decidires
O que será
O que será de mim
Se um dia tu partires.
O SONHO
É noite
O Sol desapareceu para além do horizonte
E ela apareceu, mais linda que nunca
Toda vestida de branco.
Seus olhos brilhavam no meio da escuridão
Fria e serena
Tudo isto numa solidão de arrepiar
Seus cabelos balouçavam ao sabor da brisa que
Se fazia sentir
Trazia um manto, também este branco
E foi então que vi e senti que era um Anjo
Um Anjo do Bem
Vinha para me levar
Tinha chegado a hora
A hora de partir para um mundo novo
Sem guerras, sem tristezas, sem mentiras
E sem solidão.
Ao caminhar até si, vi que se afastava
Mas porquê?
Foi então que abri os olhos e acordei
Afinal era um sonho.
Um sonho que podia ser realidade.
MONTEMOR
Era ainda muito novo
Quando me deste guarida
Cidade de Montemor-o-Novo
Onde iniciei minha vida
Aí cresci e fiz amigos
Fui feliz e namorei
Mas estava um sem abrigo
Quando um dia te deixei
Quase vinte anos de vida
Por tuas ruas passei
Fui vagabundo na noite
E na tua ermida rezei
No início era homem bom
Por todos era abraçado
Nos últimos tempos era mau
Por muitos indesejado
Um dia decidi partir
E no silencio da noite saí
Montemor, tu me acolhes-te
Também me abandonas-te
Por isso não me despedi
PRESO AO PASSADO
Preso ás amarras do passado
Não vou continuar
Vou acordar um coração
Que dentro do meu peito
Estava adormecido
Vou soltar para o mundo
Um amor que estava
Enfraquecido
Uma paixão escondida
Que agora está a ser vivida
Vou olhar para o espelho
E dizer
Estou aqui
Vou viver a vida que perdi
Estou pronto a começar
E preso ás amarras do passado
Não vou continuar
DESABAFO DO POETA
De que nos serve a nós poetas
Ter momentos mais sensiveis
Se a vida nos deixa marcas
Muitas delas bem visiveis
Nos momentos bem dificeis
Que todos atravessanos
No peito a nostalgia
Quando na escrita desabafamos
De que nos serve a nós poetas
Escrever frases sem fim
Se um dia quando morrermos
Já nada será assim
E quando chegar essa hora
Sairá então de cena
O poeta escreve e chora
No seu ultimo poema
E para os que gostarem
Do que o poeta escreveu
A obra vão continuar
E ao mundo inteiro gritar
O poeta não morreu