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E de um poema, nasceu…

 
Foram muitas as palavras, trocámos poemas e comentários, avolumou-se a caixa postal. Cada vez, as palavras faziam mais sentido, olhava cada frase, cada poema e só sabia que todos os dias, ia querendo mais e mais. O gosto da cumplicidade preenchia os nossos tempos, e percebemos que tínhamos criado algo único e pessoal onde só nós podíamos entrar, como os cantos secretos dos adolescentes, onde o mistério e o segredo animam cada fracção do nosso corpo. Tremia só de pensar nela, percebia nas palavras dela, a mesma intimidade, a mesma necessidade de algo diferente e especial, que só cada um de nós podia dar ao outro.
Um dia acabamos por ir mais longe, trocamos telefones e e-mail, soubemos como era o aspecto físico um do outro (como se isso interessasse), e combinámos encontrar-nos. O medo e a ansiedade iam tomando conta de mim, já sabia quem eras, quanto esse teu coração podia entregar, a profunda sensibilidade que criavas em cada poema, a forma como sentias a vida. Decidi abandonar-me a esta paixão, nascida da emoção das palavras, sem qualquer destino, sem qualquer certeza. Apenas como se o mundo fosse um recanto ingénuo, onde nos faríamos felizes, para além de qualquer coisa. Decidimos encontrar-nos.
Olhei-te demoradamente, como se já te conhecesse, como se o teu olhar estivesse para além de ti, da tua forma, da tua roupa. Pousei meus olhos nos teus lábios, segurei tuas mãos, sentindo nelas a força da tua escrita, e quis meu peito contra o teu, como se já fosses minha e te abandonasses sem receios.
A verdade de um beijo formal e um “como estás?”, parecia não fazer parte do nosso quadro, mas foi assim que aconteceu. Procurámos uma esplanada, agradecendo a mesa que nos dava a distância suficiente a nos entendermos, e tentámos começar a conversa, que no nosso canto era tão fácil e fluida. Percebemos rapidamente o nosso embaraço. O nosso desejo contido pela formalidade física, as nossas limitações do outro lado da vida. Formais e inquietos, entregávamos sorrisos tímidos, perguntas esbarravam com os tiques nervosos – tu meneavas o cabelo, eu arrependia-me quanto podia, de ter deixado de fumar.
Acabámos por começar a conversa, acerca do teu poema que escolheras não sei para onde, o tal que me pediras ajuda. E depois foram conversas sobre mais um e mais outro, a vida começava a fazer sentido outra vez. Perdemo-nos nas horas, nos compromissos, fomos papel e caneta, escrita a dois, poemas inventados, a felicidade de nos termos, e por fim um poema em cima da mesa, que copiaste numa letra soberba e me entregaste. Já não sei se nos despedimos ou ficamos, se nos beijamos ou nos amámos.
Essas são as memórias que o nosso canto irá guardar para sempre, como nós dois guardámos esse poema que só nós, sabemos dizer de cor.


Jorge

 
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JB
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Enviado por Tópico
ângelaLugo
Publicado: 30/10/2006 20:03  Atualizado: 30/10/2006 20:03
Colaborador
Usuário desde: 04/09/2006
Localidade: São Paulo - Brasil
Mensagens: 14852
 Re: E de um poema, nasceu…p/ jorgebicho
Olá poeta se foi verdade deve ter sido maravilhoso. mas se não foi espero que a encontre um dia e te faça feliz... Amei este texto me fez recordar passagens de minha vida!Beijinhos iluminados


Enviado por Tópico
Isa
Publicado: 07/11/2006 10:38  Atualizado: 07/11/2006 10:38
Super Participativo
Usuário desde: 25/04/2006
Localidade: Leiria
Mensagens: 168
 Re: E de um poema, nasceu…
Olá, gostei de te ler,

Quando existe cumplicidade e partilha, a realidade já existe mesmo no virtual.

E de um poema,pode nascer a suprema felicidade.

Beijinho


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 30/01/2008 11:53  Atualizado: 30/01/2008 11:53
 Re: E de um poema, nasceu…
hummmm...amor entre poetas...e vale agora a recordação!gostei de ler, fiquei curiosa...rs bjs