Quinta-feira, 24
O livro de Clarice (Lispector) cheirava a novo e isso mexia com o poeta, como amava aquele odor de tinta recém-impressa, o mesmo que emanava dos matutinos do sul que comprava nos finais de tardes nas bancas da Praça João Lisboa, centro velho no começo dos anos 80 – um momento magico curiando as manchetes dos grandes jornais: O Globo, A Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, mas sempre optava pelo e velho e bom Jornal do Brasil, que as sextas tinham um bom suplemento literário.
Ganhara o livro em edição especial e de luxo, próprio para colecionadores do excêntrico professor Valdir – Possuia um exemplar de capa dura azul que achara num bota-fora do Convento das Freiras que desfaziam-se de sua biblioteca comunitária. Começara a lê-lo, confessa, mas Clarice não é fácil digeri-la, principalmente para quem penetrara no mundo joyceano através dos icônicos “Ulisses” e “Retratos do Artista Quando Jovem” – Na verdade verdadeira, achava-a chato assim como “Dom Casmurro” que lera aos empurrões – e ele a lia penosamente em doses homeopáticas até que a relegara de vez, trocando-a pela ágil Agatha Christie e seus mistérios. Porém o mundo dar muitas voltas, o que embaixo sobe e o de cima desce e somente os tolos e os imbecis não mudam de opinião. Foi preciso vim esse livro espacial com cheiro de novo com vários ensaios enaltecendo o talento nato da escritora precoce, os datiloscritos (originais datilografados) com anotações da autora de 22 anos para aguçar o desejo começar a rele-lo - o titulo “Perto do Coração Selvagem” vem de uma frase do mestre Joyce – E foi assim que ao despertar no seu humilde aposento na Pensão Vince, Vila Embratel, antes de mesmo de descarregar a bexiga no quintal, foi aparta-lo e ao sentir o aroma da tinta impressa entorpecera a sua alma. A ideia inicial era presenteá-lo a filha de Juvan Senior – uma jovem e promissora pintora – já lhe dera um Jane Austen, Anne Frank e Dickens – tudo para sua boa formação intelectual – Mas decidira que o leria ou melhor releria primeiro e depois faria o combinado.
No meio da manhã, fechou o atelier e subiu rumo a casa da ex e do filhote (que ontem o surpreendeu com uma visita agradável) para deixar na caixa de correios deles as contas vencidas de água. E aproveitou para visitar seu velho vizinho, Sr. Grisus que retornou a velha morada, depois de um tempo banido pela companheira, a mesma que o resgatou. O sr. Com sentiu-se muito feliz quando ela contou-lhe a novidade e o convidou a visita-lo.
De volta ao atelier, resolver matar uma ‘beata’ que adormecia candidamente dentro da caixa de fosforo e deus ‘tapinhas’ para se conectar com o universo e embarcou no bonde ovariano do mestre amado Henry Miller em seu icônico “Tropico de Câncer”.
No começo da noite de ontem comprou um pepino, antes no meio da tarde os pães na padaria renascer na Praça das Sete Palmeiras – Comeu um no café vespertino e guardou os dois para janta – um sanduba de pepinos. Voilá!
Ontem foi um dia abençoado, ganhou vinte reais (Aleluia! Aleluia!) com uma solda no carro de mão, que dividiu com o filhote desempregado. Como foi gostoso essa visita inesperada do filhote amado, fazia quase um mês que não se viam. E eles ainda se amavam não como pai e filho, mais como bons amigos. Almoçou uma boa omelete de carne com arroz, feijão e umas rodelas de pepinos. Na siesta relia o escritor policial americano David Goodis em “Sexta-Feira Negra” – da mesma geração de Raymond Chandler, Dashiel Hammet e outros.