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O Florir de um Encontro Casual

 
- E agora, na tua casa ou na minha?
O meu impulso foi fixá-lo, mas ele parecia atento ao semáforo que acabava de abrir para os peões. Só agora o observava de perfil. Os traços do rosto denotavam uma firmeza não coincidente com o tom apelativo da pergunta. Eu seguia com passada larga e decidida e, naquele momento, a saia de tão justa estorvava-me. Para conseguir acompanhá-lo, o meu passo não era propriamente um passo soberano de deusa pisando a Terra.
- Não me digas que estou a ir depressa demais!
Avanço um passo e zás! Entalei o salto no empedrado. Ele tentou amparar-me, mas já era tarde. Apenas conseguiu segurar-me pelo braço e eu, de joelhos, ali em plena rua Cesário Verde... O fecho da carteira soltou-se com o impacto no solo, e toda a minha privacidade espalhou-se pelo passeio. Recompus-me, enquanto ele reunia os documentos, o baton, o rimel, o isqueiro, o tabaco... Detestei-o naquele momento. Nem poema, nem prosa. Acabava de me acontecer uma tragédia. Era a mais pura realidade. Tinha partido o salto.
- Estás bem? Estes passeios estão péssimos...
Um eufemismo, claro! Dizer-me isso, e eu com os meus dez centímetros de Galliano na mão. Perdera-se o élan. Um taxi assomou na esquina. Nem mais!
- Manda parar o taxi, por favor!
Ele pareceu desorientado, mas fez sinal ao táxi. Enfiei-me lá dentro, temendo a ideia de ele insistir em me acompanhar. "Na tua casa ou na minha?" A minha, sem dúvida! E a água para correr para um banho de imersão e bétadine para o meu joelho!
- Lamento o incidente... Mas foi um prazer estar contigo!
Exibi um sorriso de criança apanhada em falta, e ele fechou a porta do táxi.


(Texto inédito e propriedade intelectual de TeresaMarques)

 
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TeresaMarques
 
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