Contos : 

A vida é!

 
Ele entregou o dinheiro na mão dele, depois disse: "você tem mãos bonitas, sabia?"

O rapaz sorriu e falou: "obrigado, senhor! Próximo!"

Ele não se mexeu, para a impaciência dos outros que estavam na fila.

"Eu disse que você tem mãos bonitas, sabia?", repetiu.

"Obrigado, senhor!", respondeu maquinalmente.

"Quer ganhar dinheiro?...", ele perguntou para o rapaz. Depois completou "Se quer, me procure ali! Vá até à minha mesa", disse apontando para um local no canto.

Devia ser um veadão. Só um veadão falaria aquilo! E daí? E se fosse um veadão, uma bichona que gosta de dar o cu? Foda-se, que se foda, que se foda!, ele pensou.

"Preciso ir no banheiro!", falou.

Foi ao banheiro, olhou para o espelho, notou que seu rosto assemelhava-se a dum rato, um rato de esgoto. Depois dirigiu-se à mesa. O homem, sem dizer nada, entregou-lhe um papel com o número dum telefone.

"Pode ligar a cobrar!"

Voltou para o caixa e ficou lá até às 22:00. Saiu. Pegou o celular, ligou.

"Alô!"

"Alô! Que bom que você ligou!"

"Cê é veado? É para comer o seu cu? Eu já comi o cu de muita bicha velha, bicha igual tu."

"É pra outra coisa... já ouviu falar em e, glory hole?"

"Não."

"É um lugar onde os caras colocam o pau, é um buraco. Você vai lá, meu querido, e bate uma punheta para eles. Eles vão gostar da sua mão, mão macia.", o homem disse.

"Sei não...", o rapaz disse.

"Para de palhaçada! Você ganha uma porcaria de salário naquela lanchonete. Eu te ofereço sucesso profissional. É só ir lá bater uma punheta pros caras, eles nem vão ver seu rosto e você nem vai ver o deles. Eu gostei da sua mão, eu juro que gostei e eles vão gostar também, vão gostar."

O rapaz ficou pensativo, nunca tinha comido o cu duma bicha! Havia mentido! Pensava que era necessário por moral, queria mostrar pro velhote que ele não era qualquer um. Ele precisava de dinheiro, o pai era tetraplégico, não mexia nem o cabelo da bunda. Piscava, só piscava os olhos. Recebia uma aposentadoria de merda, e ele que trabalhava na lanchonete complementava. A irmã, Cíntia, estava com AIDS, não tomava remédio nenhum, dizia que a igreja ia curar! "Curar porra nenhuma! Curar nada! Só de olhar pra ela a pessoa já ficava aidética, não precisava nem de colocar a ponta do pau no cu na boceta dela", ele pensava.

"Quanto cê vai me pagá?"

O homem disse o valor. Ele assustou, era muito, daria para alugar um apartamento, um apartamento fodido, mas já era alguma coisa. Ele poderia deixar o pai cagado na cadeira de rodas e Cíntia se fodendo naquela casa de merda. Ele aceitou.

Noutro dia, não voltou à lanchonete. Foi ao endereço combinado. Entrou numa casa. Acompanhado pelo homem, seguiu em direção a um corredor que desembocava num quarto iluminado por uma luz vermelha. As paredes do local possuíam vários buracos.

"Tá vendo?" Eles vão colocar o pau num desses buracos; aí é só bater uma."

"Tem mais alguém aqui? Alguém que também bate uma bronha pra esses caras?"

O homem não disse nada. O rapaz interpretou como "bata punheta! Bata punheta!"

Segundos depois viu quando um pênis foi inserido num dos buracos. Deu uma cuspida na mão, pegou o pênis do estranho e começou o serviço.

Saiu do local. Ao chegar em casa viu Cíntia conversando com o pastor, o Genaldo. O pai, sentado na cadeira, estava cagado. A casa cheirava a merda, merda, mijo e merda.Não falou nada, entrou no quarto. Quis cortar a mão, quis cortar o pênis, quis cortar a irmã no meio, abrir a barriga dela, ver o útero e as tripas, queria cortar o pai ver as tripas dele, enfiaria a faca devagar na barriga de ambos, enfiaria depois a faca no peito do pai e colocaria fogo nos corpos, colocaria fogo na casa e iria enfiar a faca em todos; fugiria. Ser preso? Nem fodendo, pensava.

Noite. Dia. Noite.

Foi em direção à "casa da punheta" — era o nome que ele havia dado ao lugar. Entrou no corredor, em seguida, no quarto.

Depois de fazer um cara gozar, um cliente assíduo —pensava assim pois já conseguia identificar o pau de cada um —, ele viu quando cano duma arma entrou num dos buracos. Não teve dúvidas, abriu a boca, sentiu quando o cano bateu em seus dentes; alguém queria certificar se ele realmente tinha colocado a boca ali.

Sangue, cérebro e ossos e esperma. Foi um bom tiro, um tiro preciso, um impacto forte que fez com que alma pulasse do corpo.

 
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flaviogustavo
 
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