Catete - Por Katz
O Fogo
Estava no silencio dela
no rigoroso comércio
do seu corpo
no meu quarto de rapaz
solitário
ou no carro
a descer
nossa senhora de Copacabana
e findar talvez nas laranjeiras
em ruas residenciais
mas o que eu desejava sempre
era lev-a-la para a nascente
ali do lavradio
em vez disso
ela queria mesmo era subir o catete!
Chris Fonte Katz
Camisa Amarela com Passarinhos - Por Chris Katz
Camisa Amarela com Passarinhos
Hoje o dia nasceu cantando
no tom exato da minha camisa:
amarela como raio sorrindo,
cheia de asas e de brisa.
Cada passarinho estampado
no tecido que toca minha pele
é um poema que se enfeita,
é um voo que não se repele.
E ao passar pelas calçadas,
Meu riso é pura alvorada.
O sol acena em reverência
à toda luz encantada.
Sou jardim que caminha leve,
Sou verão bordado em flor.
Donzela vestida de voos,
espalhas cantigas de amor.
Por Chris Fonte Katz
O Jantar - Chris Fonte Katz
Naqueles dias,
eram dias de maio
haviam manhãs e noites
que brincavam
Em ruas esguias, em ladeiras
ou em casas apinhadas ao longe
Meu par de olhos, virgens
a criança em mim, os pés sujos
O grito de minha mãe
no tique-taque acelerado
de um relógio que não para
de uma vontade que não se finda
E em nossas casas antigas
feitas de estuque e paciência
na esperança de que a noite seja breve
Deixei-me porém, em alguns instantes
os cotovelos sobre a mesa
lá fora o silêncio em pratos limpos
infinitos pensamentos, o guardanapo a boca
Findo o jantar, e durmo a contragosto.
Reza
Reza
As chagas que tu
agora enxerga
minha vida nua
e tua boca crua
enraivecida rasga
as fotografias
e as joga em
profunda cova
retira os olhos de mim
queima meus livros e dores
adormece
testemunha o mundo
o profundo golpe
reza por mim
e glorifica os dias
em que purifiquei tuas mãos
e te jurei com dedos cruzados
amor.
Chris Fonte - Donzela do Gelo
Mangue - Katz
Mangue
Eu suplico aos que dormem
Ao menino Jesus, falo
Obedeço e rezo
perto do mangue com os pés no lodo
Onde,
Não vejo nem veias ou tornozelos
Quem eu sou menino Jesus?
Serei eu como palmeiras que se suicidam em frente ao mar?
Ou serei como as lágrimas do cavaquinho ou do pandeiro que choram?
Sofro o desgosto de ser Mulher
Então obedeço
Rezo e mais nada faço
Vivo como um reco-reco
no fundo, ao fundo
Feito meretriz no mangue
Com caranguejos aos meu pés
Onde vejo o luar
a tornar-se uma coisa só
no meu dorso nu
feito ponta de faca que suando
vaga meu corpo adentro...
Por Chris Fonte Katz, Donzela do Gelo.
Sede
O Dia Foi duro.
Ardido.
Acredito em mágica. Ou em páginas em branco?
Choveu e não houve café.
Nem cafuné.
Tão pouco sorrisos.
Apenas escureceu.
E nublou toda uma busca.
Feito o rio diante da moça.
Que seca e a deixa com sede.
Por Chris Fonte - Donzela do Gelo
Casa de Rua - Por Donzela do Gelo
não sou casa de rua
nem sou abrigo miserável
curvo-me ao chão
diante de ti para que não entres
sinto demais, mas não te perdoo
se te faço isto,
seremos dois novamente
não tenho coração
ou será que o som que escuto
em meu peito, é meu coração
atado a corda que ainda vibra?
distância, é o que meu coração vibra
tudo acabou, até o sofrer
não há casa, é pura verdade
rebentei em pranto, e penso ainda
não sou casa de rua
ou talvez,
nunca tenha sido
amor
Copacabana - Donzela do Gelo
Copacabana - Por Donzela do Gelo
Em Copacabana as ondas
se abrem em esquinas infinitas
das ruas que em mim, habitam,
ondulando sinais de chegadas
e partidas
quando ando nessa areia
nessas ruas de espumas,
grito, até abalar as entranhas
lugares que em mim,
antes, nem conhecia
em Copacabana o mar se torna véspera
e banho-me em espumas diante da multidão
neste banho mordo-me salgada
na beira dos morros que me cercam
e em risadas ébrias e vãs afundo
nestas águas de Copacabana que
agora habito e tento com afinco
no sal, e na espuma me livrar
da minha dor
quem sabe nas nadadeiras de algum
peixe, encontre leitos
e descanse do verão
pois, na verdade,
não há descanso em mim
mas sim multidões de ondas de marfim
e eu talvez junto a um cardume de tainhas
fique presa a uma rede e vá parar num
aquário
ou apenas
vire sereia, de um verão só
fantasma sem nome, em Copacabana
de ondas e esquinas infinitas
Sentidos. Por Chris Katz
Sentidos.
O vestido rodado contrastava com as luzes que atravessavam as cortinas de cetim barato. Estavam repicadas pelo tempo e por tudo que se temia. Olhando assim de lado, no lusco-fusco daquele ambiente que se dividia em sonhos encomendados, a silhueta desajeitada descansava desbotada em tons de marfim. Não pense que era covardia, mas sim, timidez, uma mistura de pedidos desmedidos, exaustão e sorrisos largos.
Os saltos de carmim e as roupas lustrosas dançavam diante de seus olhos, nenhuma brisa, nenhuma chuva, nem à noite, tão pouco a luz do dia. Não havia respiração, não havia raciocínio. Nada era lógico para quem vivia no inferno do fogo, na luz da noite.
Mas em tudo que ouvia, era como se fosse um crime sem defesa, uma alma perdida. Um sustento perdido no tempo, no fundo do seu olho. Cirandava vestida de princesa, uma coroa de hortaliças e um cetro que não continha magia. No tempo de um abraço sempre era outra pessoa, todos os dias se modificava e se mortificava.
Nalgum lugar, no passado, no futuro então, haveria alguém melhor que ela, algo mais colorido e vivo do que ela almejava ser. Tudo tão passional quanto à inércia de seu próprio corpo fotografado com seu copo preferido na mão. O mundo naquele momento girava em torno dela, uma forma inédita para ela. Era a revolução de todos os seus sentidos, de todos os seus desejos. Seu olhar estava preso em passos pequenos, em vestígios de imensa solidão e até certa dose de ironia.
Sua presença ali era doce e terna, um relance do cansaço da noite refletindo no calor da falta de um abraço. Um mergulho num mar impuro, um vinho acima da temperatura, um banho num chuveiro úmido. Seus traços agora pensados no esfumaçado espelho, eram de desespero. Cabelos molhados, à noite, e um suspiro desajeitado, uma voz que não fazia efeito, uma espera de si mesma.
Nada exorcizava o que sofreu. Sozinha no quarto a fraqueza era querer usar o azul do céu na cor do seu vestido. Mas aquele baile exibicionista iria começar mais uma vez, por isso não podia. Contudo a vida fluía em seus poros, talvez sem timidez, mas banhada numa certa covardia. Em palavras, nos seus olhos buscava as estrelas, pois só sabia ser feliz assim.
Chris F. Katz
Almas
Cada rua
beco ou viela
era tudo das almas
tudo que vaga
é espetáculo
pedaços de histórias
E haveria de pasmar
se no seu olhar
contemplasse
pinturas,
fisionomia,
amor
e gozo
Porque as almas
não tem segredos
Tão pouco travam
diálogos surdos
na contramão do frio
São suspiros no
contrafluxo
dançando no sereno
vazio
Donzela do Gelo - Chris Fonte