Poemas : 

Nome nenhum pra isso

 
Acordei com gosto de ferro.
Nenhuma marca à vista.
Mas havia um silêncio
entalado no céu da boca
e doía quando pensava.

Me vesti com o que restou do sono,
duas palavras sem dono,
um sussurro que mordia de leve.

Andei pela casa
como quem atravessa um campo minado
com os olhos vendados por dentro.

Havia um fio de luz atravessando o corredor.
Ele tremia, como se de algo soubesse, mas não dizia.
Segui por ele
até não saber mais o que era caminho
e o que era ar preso entre frestas de vidro.

Me disseram que era dia.
Não acreditei.
De onde eu vinha, o tempo
era um bicho sem espinha.

Me engasguei com os minutos.
O chão respirava devagar.
E eu fiquei ali,
de pé,
sem peso,
feito coisa que ainda não decidiu se vai cair.

A pele seguiu mentindo.

 
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Aline Lima
 
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Enviado por Tópico
Alemtagus
Publicado: 21/07/2025 11:04  Atualizado: 21/07/2025 11:04
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 Re: Nome nenhum pra isso p/ Aline Lima
A realidade distorcida pelo que se quer ver e pelo que se tem receio de ver, ver ou sentir são aqui sinónimos. O leve sabor aziago da morte que dia a dia nos delapida, e antes lapida, e nos deixa brevemente num estado de quase hipnose. Transe.
Fiquei preso na última estrofe, sentir-me parte de tudo e de nada, em suspenso.