Poemas, frases e mensagens de cleo

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de cleo

As minhas raízes pulsam aqui...
http://benfeita.planetaclix.pt/

Foi em Setembro de 2008, aqui neste site...
http://www.luso-poemas.net/modules/sm ... ction/item.php?itemid=310

Numa cápsula do tempo

 
Numa cápsula do tempo
 
Meti-me numa cápsula do tempo e viajei sem destino. Achei-me no mesmo lugar de sempre, de onde, na verdade, nunca cheguei a partir...
Aquele lugar é refém das minhas memórias e é para lá que fujo em segredo tantas e tantas vezes quando me quero esconder da loucura deste tempo de agora. E vou pelos carreiros que conheço como as minhas próprias mãos. Tanto na ida como na vinda, tenho a companhia sempre pronta e desinteressada dos pardais e dos cucos esquivos, que me seguem lá no alto dos ramos dos pinheiros que me levam pela sombra. Demoro-me com as pequenas coisas que vou encontrando no caminho. Hoje pode ser um formigueiro e eu, sem pressa, a observar as formigas com os carregos maiores do que elas às costas. Ligeiras como se aquilo não lhes pesasse nada!
A velha casa de pedra serve-me de abrigo aquando da trovoada inesperada. Existe lá uma prateleira com livros. São Almanaques Bertrand antigos, já meio desfeitos e aos quais faltam muitas folhas. Arrancaram-se com o uso demasiado. Mas, nas que lhes restam, há sempre qualquer coisa nova que ainda não tinha visto nem lido. Um hieróglifo comprimido por descobrir ou uma anedota que já li uma data de vezes, mas que me volta a fazer sorrir. Uma quadra ou uma simples frase. Qualquer coisa.
Vou até ao algar e entro na mina escura, a ver até onde ela vai dar… nem três metros e um barranco a impedir-me de ir. Mais adiante, á sombra do velho abrunheiro ao fundo da quelhada grande, lá está o meu pai deitado numa saca a dormir a sesta. Há joaninhas que se misturam com morangos selvagens, salpicando de vermelho o ervascal abandonado por onde me entretenho a brincar enquanto a minha mãe trata da rega dos feijoeiros ali ao lado. Pela noitinha, de volta a casa, eu e os cabritos saltitamos contentes pelos muros adiante ou não fossemos todos, crianças!
É dia da matança do porco. Levanto-me mais cedo que o costume e corro para o mais longe que posso. Sento-me numa pedra, meto os dedos nos ouvidos porque não quero ouvir os guinchos do pobre animal. Estou por ali um pedaço... depois volto. E eu a adorar toda aquela azáfama em torno do animal morto e já esquecida do seu sofrimento. Porque é, afinal, normal e sem outro remédio.. E depois havia os torresmos do almoço com batatas cozidas com grelos de nabo e sangue cozido esfarelado por cima. O arroz doce da sobremesa…
Ao serão, um pau aguçado na ponta e pregado a uma tábua onde os pés a segurarem, um pedaço de carne espetada e toca a migar miudinho com a faca bem afiada, para as chouriças.
Duas ou três gamelas cheias de carne migada e os temperos pela mão certeira da mesma que lhe aparou o sangue ao golpe na garganta a mexer, a mexer, a mexer com a colher de pau para não coalhar. De maneira que, ela a deitar duas mãos cheias de sal, umas colheradas de colorau, um pedacito de cominhos...
Um outro serão mais quente e o canto dos grilos a cortar o silêncio. Um petromax na mão alumia-nos o caminho e vamos ali adiante à eira, ajudar a prima Laurinda à debulha do milho na casita. E outro candeeiro pendurado no barrote e as espigas do milho a verem-se tão bem. Eu a ajudar a descasularos grãos que ficavam nos casulos macios.
De tamancos com sola de pau, sobe ligeira a escada encostada aos ramos da oliveira grande do pomar. A mãe, aflita, chama-a. Mas ela, teimosa, finge que não ouve e sobe cada vez mais depressa. Sobe até ao fim, até ao último banço da escada comprida de madeira, armada, porque a azeitona em tempo de se apanhar.
A fogueira crepitava e erguia labaredas altas, tal como ela gostava. Sentadas no bordo, de mãos e pés esticados em direcção ao lume, riamos despreocupadas. Talvez o nosso riso se devesse apenas ao conforto de ver aquele lume a arder ali mesmo à nossa frente, a aquecer-nos por fora e por dentro. Nunca mais comi uma sopa de couves, aferventada, tão saborosa como aquela... Ao lado, num prato poisado no bordo, um naco de broa com toucinho cozido no caldo da sopa e uma malga de vinho para consolar. E eu, pequena, a tomar-lhe o gosto e a fazer: “Ah…!”(e foi um caso sério para te tirar o vício...) a minha mãe a dizer mais tarde e eu a não me lembrar de nada disso já...
Noutro dia, no telhado da mesma casa, sentadas nas lajes aquecidas pelo sol de Março, pedia-me que lhe enfiasse as agulhas com linha preta porque toda sua roupa era negra, de viúva e os seus olhos cor de mar rasavam-se de água e não a deixavam vislumbrar o buraco minúsculo da agulha. Estava sempre a coser qualquer coisa, ou a pregar um colchete ou uma mola que se haviam despregado, enquanto me ia contando histórias de lobos e de crianças no alto da serra, a tomarem conta do rebanho sozinhas.
Cleo
 
Numa cápsula do tempo

Profana confissão

 
 
Eu
Pecadora
Me confesso

Sim
É verdade
Quebrei todos os votos
Que te fiz por amor
Num impulso de fraqueza
Que me inquietou a alma...

As promessas
A dedicação plena
De só a ti pertencer

Desculpa-me Senhor
Mas não consegui

A tentação foi maior
E rendi-me ao desejo
Pois queria tanto conhecer
O paladar do pecado
Queria tanto saber
Se era doce ou amargo
Ousei
Provei
E... gostei!

Juro-te que falo a verdade
Nem sequer
Te rogo o meu perdão

Pois se pequei
Se vendi a alma ao Diabo
Num acesso de loucura
E paixão
Castiga-me por favor
Eu sei... bem o mereço!

Senhor...

Nada mais poderei fazer
Pois tudo o que eu fiz
Foi de total e livre vontade
Insana entrega
No leito da luxúria
E no deleite
Dos prazeres da carne

E sabes Senhor
Vou-te confessar um segredo
Não conheço melhor sabor
Do que o sabor do pecado
Pisar o risco
E ousar
Desafiar os limites
Do certo e do errado

Por isso
E se ainda me quiseres
Senhor
Terás de me partilhar
Com o demónio que me possuiu

Carregando com o peso do meu segredo!

E este desejo...
Que ainda me escalda a pele
Por debaixo deste hábito
Que encolheu
E já não me chega
Para me livrar da queda
Na alcova da tentação

Aqui estou
Senhor
À mercê do teu castigo
Pela minha redenção... [/i]

Cleo
 
Profana confissão

De Verão é que era!

 
Tal como em tantas outras terras, o Verão a trazer-nos os que vinham de Lisboa e por ali faziam morada por algumas semanas em gozo de férias. Eram as férias grandes!
Traziam os automóveis cheios de malas e sacos que descarregavam em delírio, numa animação de prisioneiros libertados. As mulheres a tratarem logo das humidades e das rendilhadas teias de aranha que ornamentavam cantos de paredes e candeeiros de tectos. Caliças caídas com vassouras enérgicas, arredando móveis e abrindo janelas por causa do arejamento de bafios e poeiras.
De maneira que, de pó limpo e chão esfregado de joelhos a cardoa e balde de pano e sabão amarelo, depois de seco, encerado e já de lustro puxado, a cheirar e a parecer logo outra coisa!
A prima Lucinda a trazer também as netas e a Paula e dali a nada o lavadouro cheio de animadas conversas e risadas que eu ouvia lá do oiteiro anunciando-me quem já tinha chegado. E uma inesperada inquietação de contentamento a subir-me pelo peito acima!
Da Peneda, chegava-me o recado para lá dar um salto no fim do almoço, que a prima Fernanda tinha mandado dizer. E, claro, findo o almoço lá estava eu a bater-lhe à porta com um cestito de batatas e umas cebolas mais um raminho de salsa que a minha mãe lhe mandava. E ela a dizer - a tua mãe é fantástica, até o miminho da salsa!... - e eu a concordar num aceno de cabeça e um sorriso. E depois de um sem número de perguntas e respostas e umas gargalhadas bem dadas numa euforia de quem enche uma casa de alegria, eu a voltar com uma sacada de roupa e calçado da filha, que ela nos tinha trazido e aquilo para nós a ter o mesmo valor como se fosse acabadinho de comprar numa boutique qualquer ou até na feira de Arganil. Tudo com tão bom aspecto como se fosse novo!
Os rapazes, ávidos de liberdade, a fazerem enlouquecidas corridas de bicicletas até ao largo da capela e a voltarem na boleia do balanço da pequena descida até à casa alta. Depois, era ao poder dos pedais e dos músculos pelo íngreme da ladeira, num só fôlego.
No oiteiro, o rádio do primo Fernando em cantorias infernais de cassetes piratas e a prima Lurdes a ter de falar mais alto para os dela a ouvirem por via de não interromper o Roberto Leal se lá fosse carregar no botão e lhe cortasse o pio. E nisto o primo Fernando em dificuldades de calos, a vir cumprimentar-nos sem se importar com a cassete que lá ficou aos berros dentro do aparelho.
E o corrupio de gente a querer telefonar em virtude dos telemóveis ainda por inventar. Ali a conviverem na brevidade de uns instantes que nos atrasavam o jantar. Instantes que, sem se aperceberem, a valerem por uma vida cheia de lugares vazios
lá mais adiante...

Cleo
 
De Verão é que era!

Homenagem a mim mesma...

 
Viúva até à morte

Do que te escondes tu mulher?

Mulher que já tanto sofreste
Mulher que já tanto enfrentaste
Mulher que já tanto perdeste
Mulher que já tanto lutaste

De quem te escondes tu mulher?

Tu que quase morreste
Tu que tanto calaste
Tu que não viveste...
Tu que tanto choraste

Não te escondas mulher!

Filha da pouca sorte
Herdeira da escravidão
Da vida já só esperas a morte
No silêncio... da tua solidão!

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Este foi o meu primeiro poema postado neste site.
Foi no dia 02-03-2007, faz hoje anos... mais precisamente, três anos!

E esta é a minha singela forma de o lembrar

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As cores do arco-íris

Subi ao último andar, abeirei-me da varanda e fiquei ali uns minutos...
Enquanto bebericava o café, ía observando...
O sol que já dava sinais de vida... as estrelas que ainda lá estavam...os pássaros, incansáveis no seu chilrear matinal... o cheiro da manhã e a quietude aparente da cidade... lindo!
São momentos como este, que um dia tive medo de não voltar a ver...
Os cegos, aqueles que nunca viram a beleza e as cores do arco íris, não sabem... apenas imaginam!
Mas os outros...
Aqueles que um dia já viram e que, de repente, ficaram privados dessa beleza, só lhes restam os outro quatro sentidos para as "verem" de novo... as cores do arco íris!

Ler mais: http://www.luso-poemas.net/modules/ne ... toryid=8296#ixzz0gz0233PO
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E este é até hoje o meu escrito mais lido - 7285 leituras. Ainda estou para saber o porquê, pois que assim, à primeira vista, não tem nada da especial. Mas até tem e muito! (pelo menos para mim).
Talvez seja pelo título que lhe dei, não sei...
 
Homenagem a mim mesma...

Quase sensual...

 
Quase sensual...
 
Escuta...
Ouves?
São cascatas
Que se despenham
Pelos teus olhos adentro...

São palavras
Que ninguém inventou ainda
Mas que já existem
Naquele lago secreto
Que escondes
Nas profundezas
Do teu sentir...

Sei-o
Quando te apanho a jeito
E te espreito
Pelo canto do olho
Enquanto me serpenteio
Diante de ti
E te vejo sorrir...

Adivinho-te
A braços com o desejo
Que te desperto
Entre mil ondas
De prazer
Capazes de te estremecer
Na crista de um arrepio...

Poema inspirado neste outro aqui
 
Quase sensual...

Noventa anos é capaz de ser muito tempo

 
Noventa anos é capaz de ser muito tempo
 
E ao cabo de uma vida, sentados sob o tecto azul de um céu que lhes cabe no olhar até ao infinito, rodeados de pedras cúmplices da sua história onde cada uma guardará, por certo, sorrisos, lágrimas e silêncios impossíveis de descrever por se acharem derramados nos rostos fechados. Vão desfiando memórias de ontem que lhes enchem a solidão dos dias de agora. Podemos até imaginar o chilreio dos passarinhos a cortar a quietude do ar, mas jamais saberemos do tanto que ambos guardam em si e que daria para encher um enorme livro de páginas que ninguém irá escrever.

Cleo (Lurdes Dias)
 
Noventa anos é capaz de ser muito tempo

Viagem no tempo

 
Viagem no tempo
 
Se ao tempo eu perguntasse
De quanto iria precisar
Para um bilhete poder comprar
Que àquele tempo me levasse

Daria toda a minha fortuna
Para àquele instante voltar
Voltar a ser esta pequena
Com a inocência no olhar

Quanto valerá uma viagem
Que só o tempo pode dar?
Não me faltaria a coragem
De nas suas asas voar!

O cão de contente a ladrar
E o primo Campos a falar
O Paulo ao pé de mim a olhar
E o lugar já lá tão longe de se chegar...

Cleo

Foto. Uma cena de um dia invulgar, porque não era todos os dias que ali os encontrava, os que ali estão... Deveria ser pelo natal, porque o primo Campos de casaco de cabedal e mãos nos bolsos. O meu amigo Paulo, de calças de bombazine e eu de camisola de lã por cima do vestido. ☺️
 
Viagem no tempo

O passeio do engano

 
Entre um ontem
Já distante
E um amanhã
Ainda longínquo
Há um tempo indefinido
Que o relógio vai marcando
No compasso vazio
Meio cheio de esperança
Por onde vai caminhando
A vida

Entre as memórias
Da lembrança
Que o vento não levou
E o que ainda falta
Do caminho
Lá vai o pobre do engano
Entretido com o sonho
Que toda a vida
Consigo guardou

Ruma decidido!
A passos firmes!
Seguindo as coordenadas do deserto
Que até daqui se avista
No horizonte
Do desconhecido...

Soubera eu o quanto
Do pouco
Que ainda me resta
E não desperdiçaria tanto
Com a ilusão
De que tudo isto
É o que me completa...

Mas que mais poderei eu fazer?
Se do tanto
Que poderia ser
E não fui
Nada guardei
A não ser as penas...

Iludo-me!
Bem sei
Mas mil vezes esta insana
Àquela outra que desiste
E se entrega ébria
Ao malogrado desespero
Do desmazelo da inércia
E se deita
Com ele na cama
Da infinita espera
Sem chegar a conhecer
O fim do caminho!
 
O passeio do engano

Divagações sob uma folha branca...

 
Divagações sob uma folha branca...
 
Soubera eu
Ser poeta
Ou poetisa
Como também se diz

E não me desolaria tanto
Com o branco
Desta folha nua...

Talvez escrevesse sonhos
Desejos
Magias
Segredos
Ou degredos
Que por vezes
Me povoam
Os pensamentos
E me adornam os dias
Até os mais cinzentos

Porém...
Não sou capaz!

A poesia
É dos que a transpiram
Que a fazem sua
Nas madrugadas claras
E caladas
Sejam Verões quentes
Ou Invernos chuvosos e frios
Não importa muito...
O que importa sim
É o acto em si
Em que o poeta e sua amante
Se embrenham um no outro
E se entranham
Consumando aquilo que alguns apontam
Como um acto ilícito
Mas que importa isso?!
Se eles o fazem
Ali mesmo
Sem pejo
Nem preconceitos
Sem testemunhas
Que os incriminem!...

Não...!
Desenganem-se aqueles
Que a pensam sua
Só porque a roubaram dos outros
Os desacautelados
Que a deixaram ao abandono
Num qualquer algures
Mas que a reconhecem de imediato
Mesmo que vestida de outra cor
Que não aquela com que a deixaram
E que a sabem sua
Para todo o sempre
Esteja ela onde estiver!

Mas também não é daqueles
Que a desprezam
Com crueza
Com frieza
E arrogância
Logo após a serventia
Qual prostituta barata
Da antiga rua direita
Da cidade de Coimbra...

E com tudo isto
Só agora reparei
Que me enrolei
No fio da meada
Que me trouxe até aqui

Foi já tanto
O quanto divaguei
Que me esqueci
E já não sei
Ao que realmente vim!

Ah! Já sei!
Dizia eu...
Que talvez escrevesse sonhos
Desejos
Magias
Segredos
Ou degredos
Mas porque será que não consigo
Derramar nesta simples folha
Tudo isso?!
Fogem-me as letras
Das palavras doces
E fico sem saber
Como as escrever...
Por isso
Fico-me com a raiva
Presa ao que não escrevo
E ao azedo
Do arroto que me saiu sem querer

E fito a folha
Que me sorri com desdém
E que continua aqui
Bem diante de mim
Assim... despida...
Sem vergonha
Nem culpa
Visto que essa
Essa...
É só minha!
 
Divagações sob uma folha branca...

Ignorâncias

 
Ignorâncias
 
Trazia uma vida inteira a pingar-lhe dos olhos. Na memória, agruras e pobrezas (tantas) que as pedras não dizem. Embrulhada na capucha negra, enxotava o frio que lhe abocanhava os ossos. Mirava ao longe a terra de onde nunca saiu, cheia de estórias de misérias de tempos idos que ninguém ouviu... Agora, que importância terá isso, se a beleza é tudo o que mais importa! Imagens a correr o mundo, a trazer autocarros cheios de gente com máquinas fotográficas e que se debulha em deslumbramentos, como se não houvesse existido passado algum e aquilo tudo já tivesse nascido assim.
 
Ignorâncias

A despedida, é o instante derradeiro...

 
 
Há um momento
Suspenso
No vazio do tempo...

Um momento
Em que a vida nos mostra
O quão frágeis somos
E o nada em que nos tornamos

Um instante
Perturbante
E errante
Ante o pressentimento
Do inevitável

O confronto
Entre a vida
E a morte!

Escapou-me algo...
Um grito mudo
Macilento
Possante
Lancinante
E sufocante!

Agiganta-se o sentimento
Perante a imponência
E a impotência
Da perda

E do tanto que era
Ficou tão pouco...

Restaram as lembranças
Que a alma guardou
É o que tenho
Um resto de nada...

Mas é o tudo
Que acho no vazio
Em que te procuro

Ainda assim
É tanto
Que tudo é pouco
Para dizer o quanto!

Não me esqueço de ti
Pai
A saudade sabe...
 
 A despedida, é o instante derradeiro...

Cravaram-me uma estaca na alma

 
Cravaram-me uma estaca na alma
 
Cravaram-me uma estaca
Na alma!...

Apoderaram-se do meu tesouro
E deixaram-me prostrada
Num chão
Nojento e pegajoso
Pejado de mentiras esventradas
E de odor pestilento

E são às dezenas os sorrisos...
Cínicos!
Que na pressa da retirada
Lhes caíram do rosto
E se espalharam no meio da podridão

Pobres criaturas sem palavra
Que de tão miseráveis que são
Atraiçoam quem lhes deu o pão
Nos dias mais negros
Da fome apertada

E salvaram quem nada lhes deu
A não ser a ilusão
Daquilo que não passa
De um redondo nada...

Mataram
E fugiram todos
Montados na mula da cobardia

Salvou-se um estranho silêncio
Que paira num ar irrespirável

Morri sozinha
Sem glória alguma
Com a dor da desilusão

Não mais voltarei
A pisar o chão que me viu morrer!...

Hoje resolvi responder individualmente a todos os comentários que me deixaram.
Não o costumo fazer, nem aqui nem em lado nenhum.
E não o considerem como arrogância ou falta de educação, porque não se trata disso. Mais cedo ou mais tarde, acabo por retribuir quem me lê, lendo-o também.
Quem por aqui anda há mais tempo, sabe-o e respeita-o.
Não é por nenhum motivo em particular, apenas porque me rouba imenso tempo que eu acho precioso para poder ler os outros poetas e colegas de casa que também merecem ser lidos. Tão simples quanto isso.
Mas hoje... deu-me para isto.
Não o voltarei a repetir nestes termos, pois dei-me conta de que fiquei sem tempo para o que atrás disse!
 
Cravaram-me uma estaca na alma

Começou por ser um poema de humor...

 
Começou por ser um poema de humor...
 
 
E ela esperou!
Há quem diga até
Que ainda espera...

Pobre alma enganada
Atordoada pelo perfume
De uma quimera
Que lhe nasceu
Numa dobra do vestido
Agora enterreado
E desintegrado
Pela erosão do tempo
Que lhe foi passando ao lado
Enquanto esperava...

Um vestido fino
Que outrora
Fora de seda pura
E que vestira
No seu corpo alvo
E virgem
De mulher menina
Num belo dia de Primavera

Mas o tempo
Cansou-se de tanta espera
E chamou a morte
Que lhe levou a alma
Deixando-lhe os ossos
Vestidos de trapos
Sentados no mesmo banco
Daquele jardim esquecido
Onde já ninguém passeava
Só ela esperava...

Ninguém lhe disse ainda
Que a vida não espera
E a perfeição só existe
Na ilusão
De quem a sonhou um dia
E assim
Iludida...
Morreu por ela!
 
Começou por ser um poema de humor...

A soleira da porta

 
A soleira da porta
 
Do outro lado do tempo, há rostos que não se apagam a viverem em sítios nossos, que, para nós, permanecem intocáveis.
Se fecharmos os olhos, conseguimos vê-los a sorrirem-nos enquanto por eles passamos ao sabor das imagens que nos vão surgindo da cassete onde os guardámos. Porque presos a memórais a inundarem-nos os lugares onde sempre estavam, de momentos imortais a segurarem-se ao tempo que conseguimos manter em suspenso, como este que agora me aflora ao pensamento. E de repente, ali está ela, sentada naquela soleira, a ajeitar o lenço que lhe descaíra da cabeça, enquanto descansa do molho de mato que ali a trouxera...
Apalpa a travessa que lhe segura o carrapito e penteia os cabelos da frente que se esgueiraram antes de voltar a pôr o lenço como deve ser.
São instantes imorríveis, a vaguearem ao sabor do pensamento e revividos vezes e vezes sem conta. Mas que, por precaução e para que continuem vivos enquanto nós também vivermos, o melhor é deitá-los ao papel em palavras antes que o tempo resolva apagá-los.

Cleo

Foto - Duas irmãs(algures ali entre a segunda metade dos anos 40 e a primeira dos anos 50), uma delas com o seu bebé ao colo (chamava-se Vítor - já falecido também), num tempo muito anterior ao das minhas lembranças, mas cuja soleira da porta a servir de palco a ambos os instantes, tanto o da foto como o que descrevi no texto. 🙃😍
 
A soleira da porta

Antes que se acabe o ano...

 
Antes que se acabe o ano...
 
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Desejo um Feliz Ano Novo a todos os poetas desta casa!
 
Antes que se acabe o ano...

Um olhar sobre a escrita, os escritores e os leitores

 
Nem sei muito bem como me meti nisto das escritas. Penso que foi a minha curiosidade que me trouxe até este mundo e depois fui ficando mais pela teimosia. Mas curiosamente também acho que este mundo não é de quem quer. É de quem sente inspiração embora essa nem sempre esteja presente quando mais se deseja. Mas é também e essencialmente, de quem tem gosto pelas palavras e se esforça por tentar fazer passar a sua mensagem, as suas ideias, as suas estórias; o que quer contar ou dizer aos outros, aos que o lêem. E já agora, sem fazer má figura. Especialmente se já teve algum sucesso no passado e quer preservar essas memórias sem se desiludir a si próprio nem aos outros, ainda que esse mesmo sucesso não tenha passado de algumas manifestações de apreço por parte dos amigos, que, na ânsia de agradarem (e isso ocorre com bastante frequência na internet e no mundo virtual que lhe está associado), o tenham feito de uma forma por vezes exagerada até, levando-me a pensar, no meu caso, que sim senhora, até tinha jeito para escrever umas coisitas... Só que, tudo é relativo.
Se não vejamos: quem se movimenta por estes meandros apercebe-se mais cedo ou mais tarde, que para ser lido e comentado tem de pagar na mesma moeda, caso o não faça o mais certo será ninguém dar pela sua passagem nem que escreva as coisas mais belas que se possam imaginar. Ou ainda, se já o fez garantindo dessa forma o seu popularismo ou o que lhe queiram chamar e entretanto se deixou dessas coisas (a maior parte acontece naturalmente pelo cansaço e já aconteceu a tantos aqui), em breve notará que os seus leitores se foram afastando para outras paragens onde a leitura lhes seja mais proveitosa...
É que quem lê, geralmente em sites que se dedicam a dar oportunidades de divulgação de escritas de pequenos escritores desconhecidos, também escreve e publica nesses mesmos sites e, como é natural, espera igualmente que o leiam e se não for alguém já conhecido na sua praça, terá de conquistar a pulso cada um dos seus leitores.
Quem for minimamente atento, em pouco tempo se aperceberá das regras que fazem o bom escritor, sê-lo. E reparem que não falo dos grandes, falo dos amadores que são a quase totalidade das pessoas que por aqui se passeiam neste e noutros sites idênticos. Portanto, sem leitores não há escritores dignos desse reconhecimento. Mas isto sou eu que o digo e o que eu digo não se escreve... portanto, escrevam! Quanto mais não seja, pelo prazer que vos der, como me continua a dar a mim, fazê-lo.
 
Um olhar sobre a escrita, os escritores e os leitores

Ser demente

 
O passado já não conta
O presente não existe
Ser demente
Será isso?

Julgávamo-nos donos das memórias
Mas...
Ou se desvanecem
Ou estão erradas

Morremos em qualquer momento
Ou esquecemo-nos da nossa vida
Que não é mais
Se não morrer...

Não há passado
Não há futuro
O presente deixou de ser
Não é viver!

Confunde-se o filho
Com o irmão falecido
Ainda a vida no princípio

E perde-se o tino ao tempo...
E a consciência!
E a identidade!
E tudo o que o lobo frontal
Do cérebro
Ocupa

Mergulha-se agora no vazio
Talvez da transcendência...

Cleo
 
Ser demente

Inventei-te na volta errada de um ponteiro

 
Inventei-te na volta errada de um ponteiro
 
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Inventei-te na volta errada de um ponteiro

Podia ser só mais uma noite fria como as outras...

 
Podia ser só mais uma noite fria como as outras...
 
A noite estava fria, tão fria que ninguém fazia ideia.As ruas desertas eram agora mais tristes ainda. De dia nem se notava, tudo parece mais agradável, camuflado pelos ruídos de fundo e o reboliço normal da vida. Pessoas e carros correm desenfreados para um qualquer compromisso inadiável, como se tudo dependesse da pressa que levam na ponta dos minutos que lhes restam para a hora certa... como se as suas vidas dependessem apenas disso. Chegar a qualquer lado a tempo e não ser repreendido nem penalizado por isso. Ou mais grave ainda, perder algo de que se arrependesse para todo o sempre...
Mas o dia já terminara há um bom par de horas e aos poucos as ruas foram-se esvaziando. Ficaram só os que não se conseguem separar delas, os que há muito passaram a fazer parte delas, como se fossem bibelots ou guardiões notívagos da cidade.
A temperatura baixou repentinamente e apanhou-os desprevenidos, nem as caixas de cartão novas que trouxeram das traseiras das boutiques vizinhas e os cobertores coçados que já tinham, lhes chegavam para se resguardar do frio cortante da noite. Alguns desistiram de resistir, levantaram-se e fizeram fogueiras em latas de tinta velhas que arranjaram na obra ali ao lado, paredes meias com o passeio das arcadas onde se costumavam deitar, por ser coberto e o mais recolhido das redondezas. As chamas aqueciam-lhes as mãos geladas e o vinho da garrafa que partilhavam gole a gole, tratava de lhes aquecer a alma empedernida pela cicatriz da solidão de cada um, naquela que era a noite mais triste de todas as que o ano tinha.
Talvez se não houvesse Natal, as noites fossem só noites. Umas mais frias do que outras, mas só mais uma noite sem qualquer outro significado que a tornasse mais triste ou menos triste do que as outras.

Everlast" rel="nofollow">http://www.dailymotion.com/video/x1z8 ... e_music">Everlast What It's Like

A foto é daqui
 
Podia ser só mais uma noite fria como as outras...

Porque também se pode enlouquecer de solidão...

 
Porque também se pode enlouquecer de solidão...
 
 
Amanheceste no meu pensamento
E por um breve momento
Olhaste-me e sorriste-me
Como se me quisesses dizer algo bonito
Apenas com o olhar...

Vesti-me de ti
Com as lembranças que ficaram
Guardadas nas tuas gavetas
Que não esvaziei nunca

Conversei contigo
Em monólogo
Sobre coisas pequenas
Coisas nossas
Que só eu e tu entendemos

Depois
Peguei-te ao de leve na mão
E levei-te até lá fora
Ao nosso jardim
Para que as visses...
Como estavam lindas as rosas
Aquelas que tu plantaste
Um mês antes de partires...

Sentei-me no nosso banco de verga
Debaixo do nosso alpendre
Deitaste a tua cabeça no meu colo
E ali
No nosso refúgio de sonhos
Que construí para ti
Finalmente dei-me conta
Da tua presença ausente
Que me enlouqueceu a mente
E me faz procurar-te até no pó
E encontrar-te apenas
Nas saudades que tenho de ti...!
 
Porque também se pode enlouquecer de solidão...

*... vivo na renovação dos sentidos, junto da antiguidade das lembranças, em frente das emoções...»

Impulsos

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