Contos : 

Teia

 
Teia
 
Vivia em Trancoso, Porto Seguro, Bahia, um local lindo, bucólico, onde o tempo nem passava, e precisava? Para que! Nos anos de 80 tudo era diferente no Brasil, as pessoas eram calmas e na Bahia, tudo o que se solicitava, demorava um século para ser executado… Então morava com meu marido Argentino, numa casinha bem simples muito bem elaborada por um engenheiro de São Paulo e alugávamos o local. Estava grávida e administrava aulas em Trancoso, dentro de uma casinha de dois pequenos cômodos, uma era a sala de aula, e o outro a dispensa das comidas, no corredor tinha o fogão que uma aluna mais velha e eu, ou uma das mães, revezávamos e fazíamos a comida, a merenda, que para muitas crianças, era sua principal refeição do dia.
O banheiro era de madeira e feito pelos pais dos alunos, ficava do lado de fora da escola, era uma fossa feita por um caixote aberto de madeira, e os bancos da escola, foram cedidos pela Igreja de Trancoso, essa casa era alugada pela Associação de Moradores do local. Tudo foi realizado após uma reunião em pleno carnaval com várias moradoras do local, preocupadas com o descaso político e abandono da Cidade, considerada nem grata pelas autoridades. O cadastro das crianças, eu fiz sozinha, subia e descia morros, e cadastrei 120 crianças, que nunca tinham ido à escola, ou já tinham, mas abandonaram as aulas por morarem longe e sem conduções, por fim, nenhuma delas tinham sido alfabetizadas. Esse projeto pioneiro, hoje dá vida a uma escola rural no local que óbvio, ninguém mais lembra de mim, já que vim morar de volta a Cidade do Rio de Janeiro. Conto depois.
Eram para ser seis meses de aulas com as crianças maiores e não alfabetizadas, e outra pessoa se candidatou a ficar com as crianças pequenas. Era uma pessoa leiga e criticada desistiu de fazer parte do projeto, que seriam de 6 meses de duração. Conclusão, para não perder tudo, assumi dar as aulas a todos os alunos que se apertavam no banco da Igreja e a princípio iam todos os dias a "escola". A forma política de solicitar da Prefeitura, um olhar para a Cidade de Trancoso, que não tinha escola, não tinha posto policial, só tinha bares, pousadas e mar, e muito mar…com vários turistas estressados… Eu estava grávida e levantei para ir ao banheiro, e como em Trancoso na zona rural não tinha luz, tudo era lampião ou luz de velas, eu acendi a vela, mais simples e desci do mezanino onde dormíamos. A casa era de dois espaços internos pequenos, mezanino, sala e uma cozinha externa com forno e fogão a lenha, que muitas vezes a Caita Adnet vinha solicitar emprestado, porque com certeza era o único forno do local, ela fazia comidas maravilhosas para vender, uma amiga que sempre admirei, carioca como eu e psicóloga, mas no local, nem eu nem ela, teríamos condições de sobreviver fazendo isso. O banheiro era com uma fossa asséptica, uma coisa bem inteligente, sustentável e maravilhosa para a época, aprendi muito sobre tudo isso no local. Bem, tudo bem simples, mas gostoso e diferente. Fui ao banheiro meia sonambula, já que trabalhava o dia inteiro com todas as 70 crianças da escola e grávida, aconteceu que calmamente sentei no vaso e mudei a vela de posição e não é que bem ali, em cima de minha cabeça, tinha uma gigantesca tarântula preta! Era gigante! Dei um berro, devo ter acordado a vizinhança! Um susto de quase perder a filha pela boca! Gente! Um festival de horrores, e na época a minha pouca experiência rural, não tínhamos celulares, nem telefones no local, nem essas pesquisas rápidas, gente foi um baita susto que considero, assustei até a aranha! E quando meu marido acordou para ver do que se tratava, a aranha já saiu correndo com suas patinhas peludas e é obvio, sem luz, nada dava para enxergar direito no dia. Por que Trancoso em céu aberto e com Lua cheia era uma lindeza, e caminhávamos até o mar sem nenhuma dificuldade, a lua brilhava todos os caminhos, mas e a aranha?
_ Foi-se!
Custei a dormir pensando que eu era a vítima daquela noite em sua grande teia.


Diana Balis

 
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DianaBalis
 
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