Soneto do regozijo ante a ausência do miserável
Vai! D’outono tanja folhas magistrais obstando o fogo do céu,
no decurso do porvir em flamas, mira a relva como n’aquarela;
sem palavras, nem queixas, pise cauteloso qual numa ilha de fel,
enquanto a cada dia a noite passa lenta trazendo sombras nela.
Não deixe que o fogo do seu hálito corrompa coisas tangíveis,
olhe em frente, não toque em nada, mas siga o rio até o mar.
Vá sem a ira e raiva plenas, ali não teça pedidos impossíveis,
ninguém irá impedi-lo... mas não se atreva aqui tentar voltar.
Se souber murmurar só breve oração que não sejam lamentos,
ora se clamar, será em vão, não se atreva... cesse os intentos,
terá água pura... pão e sal não lhe serão compartilhados jamais.
Corra clamando por perdão... não importam palavras afáveis,
debalde esforços espera-o o lugar reservado aos miseráveis;
ao regozijo que sem você, atrevem-se a sorrir nos abissais.
Soneto do sedento inato
Não tema esta vida por ser desmedida, sedento,
para o beneplácito de não haver tímido contato.
Aceitar lavorando, do poder da fé tirar o talento,
carregar nas cores para não atenuar o retrato.
Surgindo de chofre, rechaço a zombaria, altivo,
careça a razão – mormente prejudicial e mediato.
Senhorial palavra que antes do reles substantivo,
se vê subjugado diante dela, ingente o desbarato.
A dizer a palavra na boca rota repetir compassivo,
se fruição de vida, não surge sequer compreensivo
e o sentimento desperto novamente terá intuitivo
Mas a velha voz foi ouvida novamente como fato,
toda geração genefluxada em dorso de imediato,
será gloriosa a obra que transmite sedento inato.
Soneto do chorar pelo que não se vai
Queria poder ao menos chorar pelo que não se vai,
assim poder ser livre, tentar recomeçar outra vez.
Queria poder chorar, diante do túmulo de um pai,
emudecer, vendo um milagre impossível dessa jaez.
Furto-me criança d’ olhos tristes, mas brilhantes,
esperançosos, sempre de um dia poderem a porta
ver abrindo-se e pelo desvão, contra luzes-hiantes,
vislumbrarem a imagem qu’ao passado transporta.
Queria poder chorar... celebrando um amanhecer,
onde a esperança não se veste do linho do luto,
chorar sobre algo... que escondo no peito resoluto.
Dolorosa é a via do náufrago perdido do escaler,
como no sonho onde a primavera começa em maio.
Preciso poder chorar! Ou nas trevas me desmaio!
[....o peito urge em senões
quando sinto que quero chorar sobre algo muito, muito mais....
irresistivelmente...
irremediavelmente...
apaixonadamente
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
..
.
.
.
.
.
.
.
.
.
e renascer.....................................................................................................
Embaralhadas linhas do zodíaco
Quando o zodíaco dança baralhando linhas,
criador cego está perdido num novelo bizarro.
Pessoas não podem ser esculpidas à madrinha,
como outra vez tomasse um Deus do barro.
Há de haver na matéria a alma aprisionada,
conhecer adrede a recepção da convivência;
de repente passar voando pela noite calada,
provar das fragrâncias em leda aquiescência.
Nem graves erros não fazem do sábio o tolo,
mesmo atravessado por milhões de quilovates,
esqueci-me sobre dizer a ser mais um consolo.
Pairando sobre cabeças arrancam a inocência,
dificilmente irão aquecer a cama tais quilates,
até do barro poderá advir a luminescência.
Soneto dos desejos invejosos “fugerit invida votis “
Beirando às raias da pura insanidade
sentir a dor de não estar presente,
quando aqui vislumbro grandiosidade,
toda extensão do símbolo premente.
Diante de insignificantes apelos tais,
emanantes dos cadinhos aos vapores,
findo coro solerte a ignóbeis animais,
ruge solene tal diapasão de horrores.
“Como muito antes, nos idos da Gaia,
o fluxo do mar não abarca a cesta”
- dirão sempre com repúdio à tocaia.
E da alma, sem medo dardejam dores,
mas suplantando amuide a fera-Besta,
e tais invejosos de anelo aos valores.
Soneto dos topes da candura
Do que tudo isso implica o cotejo rude,
desfraldo lá nos idos topes de candura,
onde a maldade livremente escala talude
dos pórticos onde vai garimpar ventura.
No lodo podre farejo caireis da inocência,
qual dos pântanos de que vive cheio porém.
Do que tudo isso implica a par imprudência
desfraldada lá nos idos topes que provém.
A alma sabe ao granito nesse desassossego,
na direção que caminha... tanto circunspeto
de todas preocupações, do conflito achego.
De tal proceder oculta no âmago a postura,
em tudo isso que implica o cotejo ao dueto,
nos pórticos onde vai expurgar a vil tortura.
Soneto da luz e trevas na luz e nas trevas
Há escuridão e luz, existe a luz mesmo após os crepúsculos,
palavras tais não se lêem assim amiúde em qualquer brochura,
são verbetes para eles distintos, um grafa-se com maiúsculos,
como brumas fossem impuras ante a esplendorosa brancura.
Nos andares por minhas sendas de fel procurando respostas,
creio eu jamais soube por que os invernos não fazem distinção
não poupam os puros, aos ímpios banindo na neve das encostas,
morre o justo, sem que o pecador expie, e essa é a questão!
Dizia minha mãe, dúvidas faziam minha alma pequena. Ai!...
- " Como pode querer viver imerso entre a escuridão brutal,
desejando que entre escolhidos pelo frio estivesse o seu pai?".
Então, passei a perambular pelo mundo para encontrar a luz,
louvando os invernos, vendo só trevas no claro lume matinal,
no entanto, ter n’olhos brumas num dia claro é o que seduz.
Soneto do tributo ao bajulador
Não é um orgulhoso pensamento, soa assaz séptico,
por viés das paixões vincando as atuações do peito,
interfere torto na onda neural o embaraço eclético,
impede a alma prostrada de descansar do rude eito.
Pense que estava ao longo da consagração revolta,
ao revés do escuro e solitário onde o olhar vagueia,
poupe-se no balbuciar incoerente da palavra solta,
gerando ideia vaga jorrando as ondas à mão cheia.
Confesse nos pensamentos em lances intermitentes,
o que penar da jubilação da esperança na jactância,
não medrará sequer o desejo tímido das vertentes.
Verá fugirem as murmurações secretas que expira,
como se inteligível murmúrio fosse a final instância
sem render o tributo que o bajulador sempre mira.
Soneto da boca do idólatra
Qual átrio de templo subterrâneo é a boca idólatra,
abluída na pia sepulcral, asseada em prato de rubis;
acólito de canhestro Anubis acode o mal o ofiólatra,
chafurda às trufas bolotas nos colmilhos dos javalis.
Terrível se queda imerso, recluso do mal que late,
encarcerada a gira soa a repreensão dos imortais;
cerra no mármore gélido a palavra que não abate,
adentrado nas votivas noites aos arrastos brutais.
Quiçá exista a palavra que voe através das brisas,
mais outra vez envolta, é o absenteista que arrasta,
a ser tutelado em asseada sombra pelas pitonisas.
Se ao alvitre da razão não fosse uma vida suficiente
culpado de tudo e nada, todo mal do pico não afasta,
sobre tal cupidez nasce o sol ofendido permanente.
Soneto das bestas vorazes - “et mala bestia “
Ora a ter ternamente no orbe cada vez mais escuro,
quando vorazes as bestas corriam na minha intenção
amolecidas mãos estendidas mendicante que aturo;
negam-me tal sorrir à vista d’estrelas na imensidão.
Sulcos quais jamais navegarei vez outra sinto agora,
ao néscio cada vez mais fundo num mundo estreito;
tolo não se queixaria acatando compaixão d’outrora,
mas, insisto para não altercar, não seria escorreito.
Súbito, que se permitam presto que aquelas raízes,
esteio que prostra cingindo vil elo sejam arrancadas,
quais obrigam ao genefluxo pisar frente às nutrizes.
Não acachaparão submetendo-me às campas rasas,
depois que ao anelo tão caro foram fainas devotadas
não honrarei lidas qual aos cravos nas raias das asas.